Natural de São Luiz Gonzaga, município da região das Missões do Rio Grande do Sul, Jader Ribeiro Duarte, 61 anos, responde há 40 dias pela Delegacia de Polícia Regional do Interior (16ª DRPI) de Santa Cruz do Sul, que abrange Venâncio Aires. Na terça-feira, 13, ele esteve na Capital Nacional do Chimarrão para participar do programa jornalístico Terra em Uma Hora, da rádio Terra 105.1 FM, oportunidade na qual abordou uma série de assuntos e reafirmou que é operacional, gosta de andar na rua e combater o crime cara a cara, dando respostas imediatas à comunidade. Confira, a seguir, a entrevista do novo comandante da Delegacia Regional de Polícia.
Entrevista
Delegado, como foi recebido em Santa Cruz do Sul e região?
“Fomos muito bem recebidos, eu e minha família, e espero retornar isso com muito trabalho. Aqui em Venâncio Aires, especialmente, já pude participar da inauguração da Sala das Margaridas. Ainda estou me ambientando, mas a intenção é trabalhar muito para diminuir os índices de criminalidade, a partir da interação com a Brigada Militar, Ministério Público e Poder Judiciário. Quero que a comunidade perceba que esta gestão está trazendo algo de diferente, que produza uma maior sensação de segurança”.
Em outras entrevistas, o senhor disse que ser policial era um sonho de criança. Em que momento se deu conta disso?
“Esta não é uma história inventada. Lembro de desfilar, na Semana da Pátria, na Avenida Duque de Caxias, no bairro Fragata, em Pelotas, enquanto tocava a música Animais Irracionais, da dupla Dom & Ravel, que fala das injustiças do mundo. Era período militar e aquilo me marcou bastante, era uma letra forte. Havia dois PMs cuidando a população e eu vinculei uma coisa à outra. Sem super-herói, mas pessoas que cuidavam das outras. Assim surgiu a intenção da carreira. Mais tarde, me formei no Colégio Militar de Porto Alegre e, depois, cursei Direito, o que oportunizou concretizar o sonho de ser policial”.
O senhor já trabalhou em cerca de 30 municípios durante a carreira. Como têm sido estes primeiros dias na nova DP?
“Em cerca de 40 dias na região, já realizamos 80 prisões. Encaminhei estes dados aos subchefes e eles ficaram impressionados, porque nos quase oito meses anteriores, somando todos os municípios, foram 192 prisões. É este tipo de resposta que eu gosto de dar”.
No contexto destas prisões, qual crime se destaca?
“O tráfico de drogas é o pano de fundo da maioria dos crimes atualmente. Tráfico, violência doméstica e furtos se destacam no geral. Hoje, o crime é organizado, o criminoso é sindicalizado, vamos dizer assim, diferente de antigamente, quando se dispunha e criava as condições próprias para viver daquilo. Há um ‘Sindicato do Crime’ chamado facção, que cooptou todo o pessoal e obriga a trabalhar para eles. Não tem mais ninguém independente. Fizeram uma limpa nos traficantes que eram independentes. Mataram, literalmente, e hoje toda a aquisição de drogas e circulação tem que ser por intermédios das facções”.
Como se movimentam estas facções criminosas e de que forma se dá o combate?
“Dominaram e se alastram pelo sistema prisional, de modo que hoje nós não combatemos mais só um criminoso. Combatemos uma grande organização criminosa. Há quase uma unanimidade entre os policiais de que temos uma legislação defasada, um Código Penal de 1941, que via o indivíduo como transgressor da lei. Hoje é muito mais, é todo um sistema paralelo que combate a legalidade e, por consequência, atinge a sociedade.
O que temos atualmente no Brasil é algo parecido com o tempo dos grandes chefões do narcotráfico, como Pablo Escobar e El Chapo, por exemplo?
“Pablo Escobar e El Chapo centralizavam as ações, então a Polícia sabia quem eram as cabeças e, monitorando estes caras, conseguiam chegar. Escobar foi morto e El Chapo está preso. Com a morte do Pablo Escobar, ocorreu uma metástase e surgiram várias outras lideranças. É o que acontece no Brasil. Não tem uma liderança fixa, mas várias que compartilham as decisões. É mais difícil combater. Não é da nossa prática glamourizar o crime, mas aqui no Brasil eles se organizaram muito bem. É como Coca-Cola: se desaparecer o vendedor da esquina, não tem problema nenhum, se tombar um caminhão, não muda nada, porque é um produto que se move e se sustenta por si só”.
Há uma saída em relação a esta situação, alguma medida eficaz que possa ser tomada?
“Precisamos de um repensar a respeito do combate à criminalidade no Brasil. Acho que algumas medidas, a nível de Congresso, são interessantes, mas a nível de Poder Judiciário, nas instâncias finais, fala-se outra linguagem, vamos dizer assim”.
Qual é a maior carência da Polícia Civil?
“A grande deficiência é o efetivo. Agora estão sendo aprovadas mais 1200 vagas para o Rio Grande do Sul, mas até que estes policiais estejam prontos, teremos um número expressivo de aposentadorias. Então, não serão 1200 novos policiais na ativa, talvez 700 ou 800. O que estamos fazendo é oportunizar que a Draco [Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas] interaja com as delegacias da região para dar apoio ao combate ao crime organizado. Essa é uma estratégia. A outra é trabalhar com números objetivos e dizendo ao comando que precisamos de efetivo para esta região, que é centralizada e tem um interesse específico para o crime organizado. Pode atingir daqui outras várias regiões do estado e serve como motivo de convencimento”.
Seu antecessor, delegado Luciano Menezes, havia enviado à chefia da Polícia Civil um relatório no qual constava o pedido de três policiais para Venâncio Aires. O senhor vai manter esta reivindicação ou refazer?
“Vou refazer o pedido à chefia de Polícia em relação ao déficit de efetivo. O delegado Luciano pediu mais três para Venâncio Aires, levando em consideração os números que ele tinha. Entendo que este número possa até ser aumentado, pela população que tem e pelos índices de criminalidade. Venâncio Aires pode comportar um número maior de policiais. Tentaremos, mas também temos problemas em Encruzilhada do Sul, Sobradinho e Candelária, que estão em situação terrível”.
Qual a importância do trabalho em sintonia com Brigada Militar, Ministério Público e Poder Judiciário?
“Sempre estendo meu reconhecimento à Brigada Militar e busco a confiança junto ao Ministério Público e ao Poder Judiciário, porque se você não tem a garantia de que terá suas demandas respondidas de maneira rápida, é muito difícil trabalhar. E nós trabalhamos com informação quase que imediata. Não temos a garantia absoluta de que aquilo que a Polícia Civil está dizendo acontece, que é do mundo real. Sempre há uma margem bem significativa de insegurança para um magistrado nas suas decisões. Às vezes, somos muito injustos com eles, porque vão decidir se a Polícia pode entrar numa residência ou efetuar uma prisão. São situações graves, que envolvem a intimidade do lar e a própria exposição do corpo de um ser humano. Se não houver esta relação boa, de confiança, entre as polícias e os poderes, nada funciona. Sempre que há êxito em uma ação da Polícia Civil, eu dedico um grau importante de participação à Brigada Militar, ao Ministério Público e ao Poder Judiciário.”
Está cada vez mais difícil manter delinquentes presos, em razão da necessidade de um conjunto probatório cada vez mais robusto?
“Perfeito, é isso aí. As decisões dos tribunais superiores contrastam muito com o que pensam magistrados de primeira instância e seus servidores. Atualmente, dos 11 ministros do STF [Supremo Tribunal Federal], só o ministro Luiz Fux é juiz de carreira. Todos os demais são advogados, geralmente vinculados a partidos políticos, que ao natural têm uma visão diferente em relação a um juiz, que passou a vida inteira julgando e protegendo a sociedade. Na verdade, são advogados, e eu os respeito, porque também sou advogado, mas eles trabalham apenas para uma parte, que são os seus clientes. Eles focam em uma parte, ao passo que o servidor público, o delegado e juiz, defendem o coletivo. Sem dúvida nenhuma, as decisões do Supremo Tribunal Federal, nos dias de hoje, revelam muito bem como ele é formado. E são eles que estão decidindo”.
“O primeiro a lutar pelo aumento de efetivo em Venâncio Aires serei eu, podem ter certeza. Mas, enquanto este efetivo não chega, vamos trabalhar com a vontade de servir e batalhar pelas coisas que são certas, para garantir qualidade de vida e sensação de segurança à comunidade.”
JADER RIBEIRO DUARTE
Titular da Delegacia de Polícia Regional do Interior (16ª DRPI) de Santa Cruz do Sul