Você já ouviu falar em crise do cuidado e sabe dos impactos dela na sociedade? Esse é o tema que vai nortear as reflexões do sexto e último painel de 2024 do projeto Gente & Negócios, promovido pela Folha do Mate e Terra FM. O evento em formato de reunião-almoço ocorre nesta sexta-feira, 25, na sede da Associação Atlética Banco do Brasil (AABB). O debate terá transmissão ao vivo, das 11h às 13h, pelo dial 105.1 FM e em vídeo, no canal Terra Play, no YouTube.
O painel contará com as explanações do superintendente Regional do Sesi Rio Grande do Sul, Juliano Colombo; o deputado estadual e proponente do projeto de lei ‘Terceira Idade com Dignidade’, Airton Artus e; o prefeito de Venâncio Aires, Jarbas da Rosa.
A Folha do Mate convidou o superintendente do Sesi RS, Juliano Colombo, um dos painelistas do evento desta sexta-feira, para falar da importância da sociedade refletir e agir diante da crise do cuidado. Colombo tem formação nas áreas de Gestão, Marketing e Finanças, com mais de 20 anos de experiência em gestão de equipes multidisciplinares e implantação de projetos de alto impacto nas áreas de saúde e educação, liderando projetos de inovação e transformação social.
Folha do Mate – O que é crise do cuidado e por que esse é um assunto que deve ser refletido pelas famílias e pelos gestores públicos?
Juliano Colombo – A crise do cuidado é um termo utilizado para descrever a crescente dificuldade em prover os cuidados necessários para todos os membros da sociedade, especialmente para crianças, idosos e pessoas com deficiência. A insuficiência de trabalhadores de cuidado leva ao aumento da carga desse tipo de responsabilidade para toda a população que passa a exercer essas tarefas de forma não-remunerada. Assim, muitas pessoas em idade produtiva têm que se afastar dos seus empregos para suprir as demandas de cuidado no seu círculo social, causando perdas de produtividade na economia. Essa conjuntura já é apontada por estudo da consultoria BCG de 2022 que mostra que 290 bilhões de dólares serão perdidos nos EUA, a partir de 2030, devido à falta de profissionais de cuidado e à perda de trabalhadores produtivos para atividades de cuidado não remunerado.
A crise do cuidado se exacerba por diversos fatores, como o envelhecimento da população, a redução da taxa de fertilidade e o aumento do fardo de doenças. A transição demográfica, marcada pelo aumento da expectativa de vida e pela redução da taxa de fertilidade, está reconfigurando as dinâmicas familiares. As famílias, agora menores, enfrentam o desafio crescente de cuidar de seus membros mais idosos. A divisão tradicional dessa responsabilidade, geralmente atribuída aos filhos, torna-se cada vez mais complexa, considerando o menor número de filhos por família ou até mesmo a ausência deles. Esse cenário intensifica o fenômeno da ‘Geração Sanduíche’, na qual indivíduos se veem pressionados a cuidar simultaneamente de pais idosos e filhos dependentes economicamente, demandando um equilíbrio delicado entre as diversas responsabilidades.
Essa situação gera impacto na saúde pública: devido à sobrecarga das responsabilidades de cuidado, 36% dos norte-americanos que cuidam de pessoas maiores de 18 anos reporta alto estresse emocional, segundo relatório da Associação Americana de Pessoas Aposentadas (AARP). E também afeta o ambiente de trabalho: estudo realizado pela Escola de Negócios de Harvard, mostra que quatro a cada cinco dos trabalhadores com responsabilidades de cuidado informaram que isso impactou na sua produtividade.
A crise do cuidado precisa, portanto, ser debatida pelas entidades públicas e privadas e pela sociedade. O investimento em políticas de cuidado tem potencial para geração de empregos, atração e retenção de talentos. Porém, existe também um papel da sociedade quanto à redistribuição das tarefas de cuidado não-remunerado.
“A crise do cuidado se exacerba por diversos fatores, como o envelhecimento da população, a redução da taxa de fertilidade e o aumento do fardo de doenças.” JULIANO COLOMBO
Superintendente Regional do Sesi
• Em 2030, o número de pessoas que dependem de cuidado vai chegar a 2,3 bilhões, segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT). Qual o impacto disso no setor econômico?
A crise do cuidado apresenta um cenário complexo, com desafios e oportunidades interligados. Por um lado, a necessidade de cuidados intensivos para uma população cada vez mais idosa exige um grande investimento em políticas públicas e serviços especializados. Considerando a crise do cuidado exposta anteriormente, a insuficiência de trabalhadores de cuidado leva a realização das tarefas de cuidado de forma não remunerada. Por consequência, ocorre a perda de produtividade à medida que muitos indivíduos precisam se afastar do mercado de trabalho para assumir essas responsabilidades de cuidado não-remunerado.
Por outro lado, essa demanda crescente representa um vasto campo de oportunidades para o desenvolvimento de novos negócios e serviços, com destaque para a chamada ‘economia do envelhecimento’. Segundo a OIT, o investimento em políticas de cuidado (como serviços de creches e de cuidado de longo prazo, licença parental, entre outros) poderia gerar 280 milhões de empregos mundialmente até 2030.
Além disso, a valorização da saúde e do bem-estar da população, com foco na prevenção de doenças e na promoção de um envelhecimento ativo, contribui para aumentar a expectativa de vida saudável, ampliando o tempo de participação no mercado de trabalho.
• Prevenção e longevidade são temas centrais nesta discussão?
Segundo dados da OMS, a expectativa de vida saudável (anos que pode se esperar viver com “saúde plena”) era 10 anos inferior à expectativa de vida (anos que pode se esperar viver) no Brasil em 2021. Isso se deve sobretudo ao crescente fardo das doenças crônicas. Um estudo de 2011 do Fórum Econômico Mundial em parceria com Harvard estimava que 47 trilhões dedólares seriam perdidos entre 2011 e 2030 devido a cinco doenças crônicas (doenças cardiovasculares, diabetes, câncer, doenças respiratórias crônicas e transtornos de saúde mental). A prevenção de doenças e a promoção da saúde é, por isso, fator-chave para se alcançar a longevidade saudável e produtiva e reduzir a necessidade, seja na intensidade ou no tempo, de cuidados no final da vida.
Prevenção
Conforme o superintendente regional do Sesi RS, Juliano Colombo, a prevenção se conecta com a crise do cuidado das seguintes maneiras:
- Envelhecimento saudável: envelhecimento é um dos maiores fatores de risco para desenvolvimento de doenças crônicas. Assim, a carga das escolhas individuais ao longo de toda a vida se torna muito importante para determinar a saúde quando idoso. Estas escolhas individuais se concentram, mas não se limitam, em: manter boas relações sociais, ter uma alimentação equilibrada, fazer prática constante de exercícios físicos e ter uma boa higiene do sono.
- Redução da demanda por serviços de saúde: ao prevenir doenças, diminui-se a pressão sobre os sistemas de saúde e sobre as famílias, lembrando que a crise do cuidado cria cargas excessivas tanto dentro do mercado de serviços de cuidado, quanto fora.