A situação financeira do Hospital São Sebastião Mártir (HSSM) está cada vez mais delicada. Com um déficit operacional mensal na casa dos R$ 850 mil, a principal instituição de saúde de Venâncio Aires e microrregião faz ‘ginástica’ diária para tentar superar as dificuldades, mas o cenário pouco ou nada muda em razão da histórica insuficiência de recursos para pagamento dos serviços que são prestados. Na terça-feira, 26, o administrador Luís Fernando Siqueira concedeu entrevista ao Terra em Uma Hora, programa jornalístico da Rádio Terra 105.1 FM e da Folha do Mate, para atualizar a conjuntura da crise.
Segundo ele, não se pode considerar que o hospital vive um caos, pois muitas casas de saúde estão em situações muito piores no Rio Grande do Sul. Siqueira salientou que o fator determinante para que o HSSM tenha chegado às condições atuais é a disponibilização de uma estrutura mínima – que é exigida – para atender uma população pequena. “Vamos pegar o setor materno infantil. Para fazer 50 partos por mês, talvez nem isso, preciso ter obstetra, pediatra, anestesista, enfermeiro obstetra e técnico em enfermagem, além de toda a higienização. Esta estrutura é capaz de atender 200 partos por mês”, exemplificou.
Siqueira salientou que este mesmo exemplo pode ser replicado para o Pronto Atendimento e outros setores da casa de saúde. “Não vejo muito como corrigir isso operacionalmente. A estrutura é cara e onera. A gente recebe muito pouco da União e do Estado, e o Município põe muito dinheiro. Só que todo este dinheiro não é suficiente para zerar o déficit.
Operacionalmente, não vejo saída”, reiterou, lembrando que a diretoria do HSSM e a Prefeitura têm trabalhado em conjunto, principalmente, em busca de recursos oriundos de emendas parlamentares. “Podemos receber até R$ 7 milhões por ano. Para 2024, a sinalização é de R$ 4 milhões. Temos que tornar isso recorrente e elevar a destinação de emendas”, comentou.
Começo do ano
A crise se acentuou neste começo de ano por conta de uma realidade diferente em comparação ao mesmo período de 2023. “No ano passado, tivemos R$ 1,2 milhão do Ministério da Saúde, recurso intermediado pelo senador Luis Carlos Heinze, parcela do terreno que vendemos e emendas. Neste ano, não temos nada disso”, disse Siqueira.
Assim, foi necessário um adiantamento da Prefeitura, no valor de R$ 900 mil – concretizado recentemente -, para quitação de valores junto a fornecedores e médicos, relativos ao mês de janeiro. A expectativa, agora é de entrada de mais R$ 1,5 milhão que o Município deve repassar, também a título de antecipação. “Como temos estimativa de R$ 4 milhões em emendas parlamentares, falamos com o prefeito e ele ficou de atender o pedido. Mas, depois, vai descontar”, informou.
Embora as emendas parlamentares tenham garantido algum fôlego ao hospital nos últimos anos, ele criticou a forma escolhida pelo Governo Federal para fazer os recursos chegarem aos municípios. “Em vez de atualizar a tabela do SUS, a União entrega o dinheiro aos parlamentares, que destinam de acordo com o seu entendimento”, disse, para em seguida acrescentar que, a cada R$ 100 que o HSSM gasta para cumprir um atendimento pelo Sistema Único de Saúde (SUS), recebe só R$ 70, em média. “A realidade sobre o risco de fechar o hospital existe, como existe para qualquer outro. Mas a grande preocupação é que as coisas vão se corroendo aos poucos. Fornecedores deixam de acreditar e médicos mais requisitados no mercado ficam procurando instituições que estão pagando em dia. Hoje, nós temos isso: qualidade reconhecida, mas atrasos que vão corroendo as relações”, complementou.
“Estas dificuldades tomam o nosso tempo de gestão. Vamos lidando com as situações, buscando alternativas de fornecedores e explicando para os médicos que isso acontece em todo lugar. São movimentos necessários na intenção de reduzir o impacto. É uma coisa muito artesanal, não existe metodologia, nem critério, até porque não tem unanimidade. A realidade é que este passivo nos destrói.”
LUÍS FERNANDO SIQUEIRA
Administrador do HSSM
- De acordo com o administrador do HSSM, Luís Fernando Siqueira, atendimentos por meio de convênios e particulares rendem à instituição, mensalmente, cerca de R$ 1 milhão. Deste total, sobram como margem aproximadamente R$ 150 mil.
Teto MAC é uma esperança
- Uma esperança que a diretoria do HSSM alimenta, neste momento, é conseguir um incremento de valores referentes ao Teto MAC. Atualmente, o hospital recebe R$ 12 milhões por ano, aproximadamente, e a intenção é que o montante seja revisado, para cima. Conforme o administrador Luís Fernando Siqueira, já há protocolos e tratativas.
- “Não fizemos este movimento antes porque não tínhamos, até o fim do ano passado, conhecimento de que isso era possível. Mas, quando soubemos que outros municípios tiveram sucesso neste sentido, passamos a trabalhar também com esta expectativa. Vamos tentar fazer com que Brasília reconheça o desequilíbrio da remuneração SUS e repasse um valor a mais. A mesma negociação pretendemos fazer com o Estado”, antecipa o gestor.
“A gestão é do Município”
Integrante do corpo clínico do Hospital São Sebastião Mártir (HSSM), o médico Júlio Artus entende que a Prefeitura tem a obrigação de encontrar uma solução para os históricos problemas financeiros da casa de saúde. De acordo com ele, “a gestão é do Município e, se o Estado ou a União não estão fazendo repasses suficientes, a responsabilidade da cobrança é da Administração”. Artus afirma que a instituição não pode ser prejudicada da forma como vem acontecendo há muitos anos. “O hospital é uma empresa, e a Prefeitura contrata serviços desta empresa. Então, tem que pagar pelo que está contratando”, sustenta.
Segundo o médico, a saída mais viável e prática é a Prefeitura aportar recursos extras mensalmente, para evitar a ocorrência de déficit e a tomada de financiamentos. “Se não houver uma decisão neste sentido, uma hora quebra mesmo. O Jarbas (da Rosa, prefeito de Venâncio Aires) sabe como a coisa funciona e tem que fazer o mesmo que fez em relação à UTI Pediátrica: o Estado acenou com um valor e ele garantiu que bancaria o resto. Por isso, é um dos setores do hospital que funciona bem, sem déficit”, comenta.
Artus observa que a diretoria do HSSM e a Prefeitura não costumam se indispor e resolvem alguns problemas, quando se agravam, de forma paliativa, mas têm consciência de que, em breve, estarão preocupados com a mesma realidade. “O próprio prefeito, no primeiro ano de governo, contratou uma empresa para fazer uma auditoria, e essa auditoria mostrou que a Prefeitura devia colocar mais dinheiro no hospital. Mesmo assim, nestes mais de três anos da atua Administração, não foi acatado o que a auditoria apontou. Então, não sou eu que acho que precisa mais recursos. É um diagnóstico mesmo”, justifica.
“Sei que a situação é delicada, mas precisamos evitar que ela se agrave ainda mais, a ponto de o hospital realmente quebrar. Se continuar desta forma, com déficit todo mês e fazendo financiamento, a dívida só vai aumentar.”
JÚLIO ARTUS
Médico integrante do corpo clínico do HSSM