Jóice Maria da Silva Ribeiro tem 19 anos (faz aniversário no dia 29 de fevereiro). é filha de Albertina da Silva e Orlando Pedro Ribeiro e irmã de Róger e éverton, além

Foto: Vanessa Behling / Folha do Matejóice trabalha como professora estagiária numa escola e acredita que pode fazer a diferença na vida dos alunos
jóice trabalha como professora estagiária numa escola e acredita que pode fazer a diferença na vida dos alunos

de dois irmãos do segundo casamento de seus pais.

Atualmente mora com uma tia no loteamento Tirelli. Ela está no quarto semestre de Licenciatura em História, na Universidade de Santa Cruz do Sul. Sua meta é terminar a faculdade e se especializar, talvez na área de antropologia, para estudar mais a sociedade. “Meu intuito é transmitir isso que tenho dentro de mim, ajudar quem precisa, crianças em vulnerabilidade social, quero me dedicar a elas. é preciso dar atenção à história de cada pessoa.” 

Jóice trabalha como professora estagiária em uma escola de Venâncio, onde é monitora de informática e atua com alunos do pré ao 5º ano. A jovem ama o que faz e acredita que pode fazer a diferença na vida de alunos, assim como seus professores fizeram na sua. “A escola e os professores sempre foram muito presentes em minha vida, então, tento marcar os meus alunos dessa forma. Eu acredito muito na educação e que ela pode mudar a sociedade. A escola tem o papel de formar cidadãos críticos. Então, busco deixar os alunos pensarem e opinarem sobre determinado assunto, sem deixar que carreguem opiniões ditadas e pré-formadas.”

UMA GUERREIRA

Apesar de nova, Jóice acumula uma história cheia de sofrimento, dificuldades e muita superação. Ao longo da vida escolar sofreu com o preconceito racial. “Eu não entendia do porque sou negra.” Se não bastassem os apontamentos na escola, ela chegava em casa e se deparava com brigas entre os pais, que culminaram na separação do casal. Isso fez com que Jóice passasse por grandes dificuldades, as quais driblou e foram combustível para torná-la forte e independente. “Minha mãe teve que trabalhar para sustentar os dois filhos. Meu irmão mais velho estava no quartel em Santa Maria. Então, eu não tinha um tênis, uma roupa nova para usar, na Páscoa e Natal não tinha brinquedo novo, muitas vezes passamos fome, vi minha mãe chorando por não termos o que comer. Por volta dos 12 anos, além de estudar, passei a cuidar de criança. Então, quando queria algo eu não pedia, eu corria atrás. E tudo isso me fez ser durona, independente, aprendi a me virar sozinha, a me desafiar.”

Em meio às brigas dos pais, era na escola onde preferia ficar durante o dia todo. E foi lá, na Alfredo Scherer que despertou um dom que tem e encanta. “Entrei e me tornei solista do coral da escola, o ‘Alfredinhos em Canto’. E por não cuidar, não usar as técnicas como aquecimento, forcei as cordas vocais e tive que parar de cantar no coral, e hoje me faz muita falta. A música me transformava, pois eu era muito tímida e em público eu me soltava. Além disso, a música é muito poderosa, porque ela acolhe quando se está triste, deprimido.”

Quando tinha sete anos, o pai, que ainda morava em Venâncio, integrou a diretoria da Sociedade Négo Foot Ball Club. A partir de então, ela passou a conviver e conhecer mais sua cultura e integrar também a escola de samba pela qual desfilou até 2012. “Foi ali que descobri que eu era negra devido a melanina. Que o cabelo era crespo por ser mais resistente, que o nariz é mais achatado, os dentes mais brancos, que a partir da lei de Darwinismo, existem negros, brancos.”

Foi por volta dos 14 anos que conquistou o título de Mulata Café, organizado pelo Négo. E, logo depois, foi eleita a Mais Bela Negra do RS. Em 2012, foi eleita princesa do Carnaval de Venâncio. Em 2014, concorreu no Garota Verão em Sobradinho, onde atualmente mora o pai, mas ela não passou para a Etapa Regional por estar acima do peso. Assim, ao longo do ano cuidou do corpo e, em 2015, tentou novamente. “Fui com biquíni emprestado, não fui no salão, e quando falaram meu nome, não acreditei. Os jurados que haviam dito que eu era gorda vieram me dar os parabéns. Depois passei na Etapa Regional e cheguei à Final em Capão.”

Foi a partir do concurso que a agência de modelos Mega Model firmou um contrato não exclusivo com a jovem, mas devido ao grande esforço exigido pelo mundo da moda, como sacrifícios alimentares, e também para não atrapalhar os estudos – que são prioridade em sua vida – ela preferiu não seguir no ramo e não participar mais de castings da agência. Jóice também já concorreu no Musa do Sol, de Candelária e no Broto Cristal das águas.

A Fenachim

A exemplo da princesa Viviane da 1ª Fenachim, da rainha Daniela Azeredo da 9ª Fenachim e da princesa Fernanda Landim, da 11ª Fenachim, Jóice quer quebrar o tabu e representar a cultura negra do município na Festa. “A Fenachim já teve outras negras nas suas cortes e fizeram seus papéis, foram bem aceitas e porque agora também não pode. A sociedade evoluiu muito, as pessoas já enxergam de outra maneira e todo mundo tem um pouco de afro em sua família, casa e vida. O tabu as vezes está dentro da nossa cabeça. E Venâncio é exemplo perante outras cidades que nunca elegeram negras em suas cortes.”

Para ela, a Fenachim não é apenas uma festa, mas sim uma parte importante da história do município. “A Fenachim envolve muita cultura, é a história do município, são 30 anos de festa, na qual teve importantes mudanças. Então, mesmo se não entrar no trio, terei essa experiência para a vida toda, que poderei passar adiante.”