Os legisladores estão sempre sendo “cobrados” por suas ações e por resultados. Eles estão menos protegidos que o político do poder executivo. Este último tem sua sala, sua secretária, sua agenda, seus horários. A ele não se tem acesso direto. é preciso marcar audiência.
O legislador, ao contrário, está em permanente contato com seus colegas, com a imprensa que tem franco acesso às dependências da Casa, com os funcionários do órgão e com o eleitor que também circula livremente pelos corredores e gabinetes.
Mais ainda, o político no executivo goza da presunção de que seu tempo é precioso, que está sempre ocupado, e, portanto, não ser recebido por ele é percebido pelas pessoas como mais compreensível e justificável.
Mas esta tolerância não se aplica ao legislador. Para ele, a presunção é contrária. Ele é percebido como tendo tempo de sobra para receber pessoas, falar com a imprensa e conversar com os colegas. Se não agir com esta abertura, será tomado como “mascarado”, “arrogante”, “vaidoso”.
Essa discrepância nas percepções e presunções, explica-se, em grande medida, pela imagem do legislador, construída em cima das reuniões de Plenário.
Ao contrario do imaginário popular, o Plenário não é uma sala de aula, com os legisladores sentados nos seus lugares, votando leis.
A imagem do Plenário, como é mostrada pelos veículos de TV, sobretudo é, ora de uma total desorganização – pessoas em pé, pequenas reuniões, vários falando ao mesmo tempo, a mesa na sua tentativa de por ordem no recinto – ora, a de um Plenário deserto, com alguns poucos membros sentados, lendo jornais ou conversando enquanto a mesa preside sobre procedimentos que ninguém entende.
Ocorre que nenhuma destas duas imagens corresponde à realidade do trabalho legislativo.
Além do Plenário, o legislador, trabalha muito em Comissões, no seu gabinete pessoal recebendo eleitores, em reuniões de bancada, do partido, da mesa, do bloco do governo/oposição, e em conversas, muitas conversas com os colegas, para aparar arestas, chegar a acordos, promover/opor-se a projetos etc.
Frente a este desafio, à incompreensão generalizada da importância insubstituível do seu trabalho para a democracia, e do desafio da próxima eleição, alguns legisladores recorrem a uma saída que, embora legítima e útil para os trabalhos legislativos, pode se tornar, para ele, uma armadilha política: a especialização.
Esta é uma saída que é encorajada pelo sistema de trabalho em Comissões, pela assessoria técnica da Casa e pela necessidade de manter-se no nível de informação do executivo. Mais que um especialista em legislação, economia, saúde e outras áreas seus eleitores hão de querer, entretanto, um advogado de suas causas, prioridades locais e de seus interesses privados junto à administração pública; alguém com importância para resolver os problemas urgentes de pessoas sem importância; ou um “líder” político em ascensão, uma promessa de que chegará a cargos mais elevados e poderosos.
Para manter esses eleitores o legislador precisará gastar a maior parte possível do seu tempo com eles, recebendo-os, escrevendo e respondendo cartas, fazendo telefonemas, visitando-os, resolvendo ou pelo menos encaminhando seus problemas junto aos órgãos da administração, sem deixar de ter uma presença marcante no legislativo a que pertence, em questões seletivas.
Muito dificilmente alguém consegue ser igualmente eficiente na especialização legislativa que adota e nessas funções mais políticas de contato com seus eleitores. Para quem escolheu o perfil legislativo, a especialização em uma área é um caminho válido e eficiente. Para quem tem objetivos políticos mais ambiciosos, sobretudo a pretensão de conquistar o poder executivo a especialização pode tornar-se uma armadilha.
O caminho da especialização, portanto, pode ser uma saída para aquele acúmulo de tarefas que, desordenadamente, recaem sobre o legislador, mas pode também tornar-se uma armadilha, cujas consequências somente serão visíveis com clareza, na próxima eleição.
