Há mais de 20 anos, um comercial de TV fez enorme sucesso pela frase ‘Não é assim, uma Brastemp’. O slogan teve tanto efeito que até hoje é usado para referenciar algo com qualidade e que seja eficiente. Mas não apenas à marca de eletrodomésticos, essas características também ‘pegaram’ para algumas pessoas. Nesse caso, para destacar a eficiência em ‘fazer de tudo um pouco’. “Tem gente que diz que sou tipo isso, uma Brastemp. Eu sempre fiz de tudo, um curinga por aqui.”
A autodescrição é de Arciso Reinald Weiss. Aos 84 anos, ele é o funcionário mais velho e mais antigo do Supermercado Lenz de Venâncio Aires. Mas o interessante dessa história é que ela remete ao tempo em que a família Lenz nem sonhava com mercado. A história do seu Arciso nas ‘bandas baixas’ da rua Osvaldo Aranha começou em janeiro de 1960.
Foi há 59 anos, quando Alfredo Scherer comandava o município e o centro se resumia à rua ‘principal’ e à Tiradentes, que Arciso Weiss começou a trabalhar com a família Lenz. Naquela época, o pai dele, Edwin, ingressou como sócio da fábrica de sabão de Willibaldo Lenz. A família também tocava uma fábrica de bala e schmier, além de contar com equipamentos para torrefação e moagem de café. “Durante 25 anos fui motorista e vendedor. Fazia todo o Rio Grande do Sul, com um caminhão três anos mais novo que eu.” Isso quer dizer que o veículo foi fabricado em 1937.
Das vezes que não pegava a estrada e no fins de semana, Weiss se dedicava à manutenção das fábricas. Criou peças (veja box) e fazia a manutenção hidráulica e elétrica. “Não fiz curso de nada, tinha só experiência e a confiança da família Lenz.”
Já nos anos 1980, quando começaram com o ‘comércio’, Weiss fez o primeiro balcão com tulha, onde eram armazenados açúcar, sal, farinha e grãos. Tudo vendido a granel. “Fiz também as primeiras prateleiras e alguns carrinhos para puxar mercadorias”. Dois desses ainda são usados no depósito.
PRESENTE
Atualmente, seu Arciso segue trabalhando na matriz do Lenz, onde tudo começou. Não com as horas cheias, mas manhã e tarde ele está por lá. Seu uniforme é calça e camisa social, hábito que vem dos tempos de motorista e vendedor, quando tinha que estar ‘bem apresentável’ aos clientes.
Seu ‘escritório’ é a sala de manutenção, onde milhares de peças, ferramentas e parafusos estão guardados ou soltos sobre mesas que têm quase a mesma idade do dono. “Quem guarda, tem. Um dia pode precisar.”
Arciso Weiss não fala em aposentadoria e vai trabalhar enquanto puder. “Velho não pode parar, porque enferruja.” Ele continua ajudando com a manutenção de alguns equipamentos e com a parte elétrica, mas uma queda há alguns anos de uma escada lhe restringiu um pouco o serviço. “Agora só me deixam mexer na instalação baixa”, revela, entre risos.
INVENÇÕES
Na década de 1960, Arciso Weiss fazia a manutenção do maquinário. Sem medo de mexer e criar, ele pensou em equipamentos para melhorar alguns processos nas fábricas de sabão e de balas.
Entre eles, uma máquina para plastificar o sabão. Depois de fervido e resfriado, o produto saía em placas de 80×60 centímetros. Weiss montou grades de arame para um corte uniforme e uma prensa para envelopar as barras com plástico.
Também fez um ‘lavador’ de batata doce, para fazer schmier. As batatas passavam em três tanques de lavagem e depois de fervidas iam para um moedor. Esse moedor foi feito a partir da adaptação de um picador de pasto usado no interior.
A ‘invenção’ mais recente de Weiss está no depósito do supermercado. A água que sai das caixas passa por um cano de 41 metros dentro um freezer antigo, que está suspenso na parede. Ao abrir a torneira, tem sempre água gelada para beber. “Pra mim é muito gelada, então deixei mais uma torneira, essa direto da caixa.”
Um pouco mais de história
Arciso Reinald Weiss nasceu em 21 de agosto de 1934, em Linha Monte Belo, interior de Venâncio Aires. Se orgulha de dizer que trabalha desde criança, nas lidas da lavoura e dos bichos. Veio para a cidade com 20 anos, por causa de uma “gripe severa” e precisou se tratar em Santa Cruz do Sul.
No fim dos anos 1950 morou com a madrinha Ana Diettrich, pertinho da Sociedade de Leituras. A prima dele, Clédia, era casada com Harry Wildner, um dos precursores do rádio no município. “Durante cinco anos trabalhei na oficina dele, consertando rádios e fazendo a manutenção elétrica por aí”, lembra. Foi nesse período que aprendeu tudo sobre eletrônica.
Em 1958 casou com Nelly Frey, natural de Linha Cecília, e tiveram uma filha, Alice. Há três anos, seu Arciso mora sozinho, desde que a esposa faleceu. “As coisas passam, mas a gente vai ficando. Então vamos vivendo, né?”