Valmor Thesing
Empossado presidente do SindiTabaco há um ano, Valmor Thesing tem 40 anos de experiência no setor e estará na Suíça para a COP 11 (Foto: Felipe Krause/ Divulgação SindiTabaco)

Rio Grande do Sul - Às vésperas da 11ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco (COP 11), que ocorre de 17 a 22 de novembro de 2025, em Genebra, na Suíça, o debate sobre o presente e o futuro da cadeia produtiva de tabaco ganha força.

Os dois eventos internacionais, focados no combate ao tabagismo e ao comércio ilegal, historicamente não permitem a participação de representantes da indústria, nem mesmo de outras entidades que representam produtores ou lideranças políticas como deputados e prefeitos de cidades produtoras de tabaco. Mesmo a portas fechadas, a COP, especialmente, mobiliza as entidades representativas e lideranças que defendem esse setor, que tem peso na economia brasileira: movimenta mais de R$ 18 bilhões em tributos, sustenta 600 mil brasileiros, entre produtores e trabalhadores da indústria, e mantém o país na liderança mundial das exportações de tabaco há mais de três décadas. O presidente do Sindicato Interestadual da Indústria do Tabaco (SindiTabaco), Valmor Thesing, é uma das lideranças que embarcará à Suíça. Empossado presidente da entidade há exatamente um ano, em 8 de novembro de 2024, esta será a primeira COP que ele acompanhará como presidente do sindicato que foi fundado há 78 anos.

Natural de Santa Cruz do Sul, formado em Economia pela Unisc e Técnico em Contabilidade, Thesing iniciou sua carreira no setor de tabaco na empresa Tabacos Brasileiros, atual Universal Leaf Tabacos Ltda. Em entrevista à Folha do Mate, o executivo, que tem quatro décadas de experiência no setor, destacou o protagonismo da região, maior polo de produção e beneficiamento de tabaco do mundo. “O Vale do Rio Pardo é o coração da cadeia produtiva do tabaco no Brasil”, frisou.

Ele também falou das expectativas para a Conferência das Partes, elenca a preocupação com a discussão de de medidas como proibição de cigarros com filtro, que segundo ele podem ter efeito devastador sobre o setor e apelou por transparência e equilíbrio da delegação brasileira que representará o país.

“O país deve evitar medidas que possam desestruturar uma cadeia que gera mais de R$ 18 bilhões em tributos, R$ 14,6 bilhões de renda aos produtores integrados e, em 2024, US$ 2,97 bilhões em exportações.” VALMOR THESING – Presidente do SindiTabaco

Folha do Mate – O Brasil é o maior exportador de tabaco do mundo e, ao mesmo tempo, um dos países protagonistas na implementação das medidas da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco. Como o SindiTabaco avalia esse aparente paradoxo?
Valmor Thesing – De fato, há um paradoxo. O Brasil está entre os principais produtores e é líder mundial na exportação de tabaco — há mais de 30 anos —, e ao mesmo tempo tem adotado uma postura extremamente rigorosa na implementação das medidas da Convenção-Quadro. O SindiTabaco entende que o país deveria exercer seu protagonismo com equilíbrio e coerência, buscando compatibilizar os compromissos de saúde pública com a proteção social e econômica de mais de 600 mil brasileiros que fazem parte dessa cadeia produtiva, no campo e na cidade. Ao adotar políticas excessivamente restritivas, o Brasil acaba prejudicando sua própria competitividade, enquanto países concorrentes, como Índia, Zimbábue e Malawi, ampliam participação no mercado mundial.

Em manifestação recente sobre a COP 11, o senhor disse que “o governo brasileiro precisa se preocupar com a ameaça de perder espaço no mercado global”. Como está o cenário internacional e qual apelo o SindiTabaco faz ao Governo Federal que será representado por uma delegação oficial na conferência?
O mercado global tem apresentado forte demanda ao longo dos anos, no entanto, o Brasil não tem se beneficiado dessa nova fatia do mercado. Mantemos a liderança em qualidade, sustentabilidade e regularidade nas entregas, mas enfrentamos concorrência crescente de países africanos e asiáticos que têm custos menores e legislações menos restritivas. Nosso apelo ao Governo Federal é por equilíbrio e responsabilidade nas decisões da COP 11, defendendo o compromisso da Declaração Interpretativa de 2005, que assegura proteção aos produtores e respeito ao livre comércio. O país deve evitar medidas que possam desestruturar uma cadeia que gera mais de R$ 18 bilhões em tributos, R$ 14,6 bilhões de renda aos produtores integrados e em 2024 US$ 2,97 bilhões em exportações.

O Brasil ratificou a Convenção-Quadro com uma declaração de que seguiria comprometido com a proteção aos produtores de tabaco e com a defesa do livre comércio do produto. Vinte anos depois, quais são os principais impactos diretos à cadeia produtiva do tabaco e como avalia a postura do país?
Ao longo desses 20 anos, o setor vem sofrendo com políticas públicas que muitas vezes ignoram o compromisso firmado na Declaração Interpretativa. O país passou a adotar uma postura mais ativista do que equilibrada, impondo restrições internas que não se observam em outros grandes produtores, como corte do Pronaf para tabaco, aumento significativo no imposto sobre produtos, exclusão do tabaco em acordos bilaterais, bem como tentativas de redução de áreas de produção e proibição da assistência técnica gratuita oferecida aos produtores de tabaco pelas empresas. Tudo isso resultou em aumento do contrabando, perda de arrecadação e incerteza regulatória para uma cadeia produtiva que é exemplo em sustentabilidade e responsabilidade social. O SindiTabaco defende que o Brasil retome o equilíbrio, reconhecendo o valor do tabaco para a economia e para milhares de famílias da agricultura familiar.

Qual proposta ou artigo que estará em debate na COP 11 mais preocupa o setor?
O ponto mais sensível é o Artigo 18 da Convenção-Quadro, que trata da proteção do meio ambiente e da saúde das pessoas em relação ao cultivo e à fabricação de produtos de tabaco. O relatório do Secretariado propõe medidas como proibição de cigarros com filtro, taxas de limpeza de bitucas e classificação das bitucas como resíduos perigosos. Tais medidas, se aprovadas sem embasamento técnico e análise de impacto, podem ter efeito devastador sobre o setor, além de estimular o contrabando e a informalidade.

Na COP 10, no Panamá, repercutiu a discussão sobre a proibição de filtros dos cigarros. O que se sabe sobre essa proposta — que deve voltar à pauta neste ano — e qual impacto essa medida representaria à indústria?
A proposta deve, de fato, retornar à pauta na COP 11, agora vinculada ao debate do Artigo 18. A eventual proibição de filtros eliminaria o formato mais consumido no mundo, representando enorme impacto econômico para a indústria e para toda a cadeia produtiva. Além disso, não há comprovação científica suficiente de que essa medida reduziria o consumo. O SindiTabaco defende que o debate ambiental avance com base em evidências e transição realista, e não em decisões radicais que comprometam empregos, renda e exportações.

Thesing: “O Vale do Rio Pardo é o coração da cadeia produtiva do tabaco no Brasil”

A indústria é proibida de participar das COPs do Tabaco. Como o setor se mobiliza para que a cadeia produtiva possa ser ouvida antes e durante a conferência e quais as agendas que se espera ter em Genebra, uma vez que o acesso negado ao evento já é esperado?
O SindiTabaco, juntamente com representantes de governos estaduais, parlamentares e entidades do setor, estará presente em Genebra para acompanhar de perto as movimentações da COP 11. Ainda que o acesso seja restrito — o que consideramos inaceitável, dada a natureza pública das decisões —, o setor buscará dialogar com autoridades, imprensa e organismos internacionais para dar visibilidade aos impactos socioeconômicos do tabaco no Brasil. A principal agenda é defender coerência e transparência da delegação brasileira.

A diversificação é um tema previsto nas discussões da COP, mas que efetivamente não avança. O próprio governo brasileiro não deslancha uma política eficaz de diversificação. O que se escuta dos produtores é que não há uma cultura tão rentável para os agricultores e capaz de competir com o tabaco. A que se atribui a preferência ou permanência de agricultores no cultivo do tabaco ao longo das décadas?
A permanência se explica pela rentabilidade, organização e previsibilidade que o sistema integrado de produção oferece. O tabaco é uma das culturas mais estáveis e seguras para o pequeno produtor, com assistência técnica, contrato garantido e pagamento justo. Outras culturas ainda não oferecem a mesma estrutura de comercialização e garantia de compra, o que torna a diversificação um desafio. Ainda assim, a indústria incentiva programas de diversificação desde 1985, pois entende que agregar outras rendas é importante para o produtor, em especial, da agricultura familiar.

Mercado ilegal também é pauta da COP, logo, pode-se dizer que é um assunto de interesse comum ao setor, que manifesta preocupação com o crescimento do contrabando e a concorrência desleal. Qual a expectativa de avanço desse tema na COP ou na MOP 4?
O mercado ilegal é, sem dúvida, um dos maiores desafios. Hoje, de cada três cigarros consumidos, um é oriundo do mercado ilegal, o que representa perdas bilionárias em impostos e o fortalecimento do crime organizado. O setor espera que o tema avance de forma efetiva, com cooperação internacional e políticas fiscais equilibradas. Não basta reprimir; é preciso reduzir o diferencial tributário que favorece o contrabando.

O senhor participará da primeira COP como presidente do SindiTabaco e tem quatro décadas de experiência no setor. O que espera da COP 11, já que é o futuro da cadeia produtiva do tabaco que estará em discussão?
A expectativa é de uma discussão responsável e equilibrada, que considere o impacto social e econômico das decisões sobre a vida de milhares de famílias rurais e trabalhadores nas indústrias do setor. O SindiTabaco estará em Genebra para defender a sustentabilidade da cadeia produtiva, reforçar o valor do tabaco brasileiro no cenário global e cobrar do governo coerência com os compromissos assumidos.