O ano de 2018 vai ficar marcado para Douglas José Peiter, 26 anos, como o início de um novo ciclo. Depois de atuar como funcionário de uma propriedade com cultivo de hortaliças, em Linha 17 de Junho, ele uniu a experiência que teve no local aos conhecimentos do curso técnico em Agropecuária e a vontade de trabalhar na área rural para começar o próprio negócio.

Depois de adquirir estufas e materiais, no ano passado, ele iniciou em janeiro deste ano o cultivo hidropônico e sem agrotóxicos de três tipos de alface, agrião e rúcula. Semanalmente, em torno de 600 pacotes de hortaliças produzidas na propriedade rural de Vila Arlindo abastecem dez supermercados e fruteiras do município. Ao todo, são seis mil pés adultos nas quatro estufas, além das hortaliças em germinação e no ‘berçário’.
“Todos os nutrientes são fornecidos pela água”, explica o agricultor. “A produção hidropônica é um mercado novo aqui no município, que ainda pode ser bastante explorado. Tem bastante procura”, considera Peiter, que utiliza técnicas aprendidas no curso técnico em Agropecuária e conta com o suporte de profissionais da Emater/RS-Ascar.
Apesar do sucesso e da satisfação do empreendimento de Peiter, histórias como a dele ainda são minoria. “Em Arroio Grande, onde eu morava antes e minha família cultivava tabaco, quase todos os jovens saíram das propriedades. Praticamente ninguém mais fica no interior. Mas, com o tempo, as pessoas terão que voltar. É importante para o interior e tem mercado para isso”, observa.

Questão estratégica
Para o professor João Carlos Reis Costa, coordenador da Escola Família Agrícola de Santa Cruz do Sul (Efasc), a sucessão familiar no interior é um desafio que depende de muitos fatores: desde infraestrutura rural e incentivos por meio de programas governamentais, até a valorização do agricultor como um profissional, longe dos estereótipos do colono como alguém ‘atrasado’ e sem conhecimento.
“Falar de sucessão na agricultura familiar é muito complexo. Ainda temos muito a avançar. Na questão de infraestrutura, por exemplo, a maioria da área rural ainda não tem acesso asfáltico, as estradas são esburacadas. O acesso a internet também é muito precário e não se tem rede elétrica trifásica que dê conta da demanda no campo”, cita.
Por conta desses aspectos, para Costa, garantir a permanência dos jovens não é tarefa simples e exige uma mobilização “urgente e estratégica”. No entendimento do coordenador da Escola Família Agrícola, políticas públicas municipais, do Estado e do País, que assegurem as condições necessárias para o trabalho no campo são fundamentais.
Ao mesmo tempo, ele ressalta a importância do empenho de toda a sociedade na busca de alternativas para a situação. “Cerca de 70% do que o brasileiro consome vem da agricultura familiar. Só isso basta para constatar o quanto esse é um assunto que diz respeito a todas as pessoas”, analisa.
Só vamos, efetivamente, falar em sucessão familiar se houver políticas públicas que entendam como central e estratégica a permanência dos jovens no campo. Não vejo futuro no Vale do Rio Pardo, uma região produtora de alimento, se não houver uma próxima geração de agricultores”, João Paulo Reis Costa, coordenador da Efasc.
Para o professor, também é fundamental promover o vínculo dos jovens com a agricultura. “Grande parte das famílias agricultoras não vê seus filhos como sucessores. Estamos passando por um processo de discussão e vinculação desses jovens no campo para que, se isso for atrativo, eles pensem em ficar, que essa seja uma opção. Não é só uma questão de renda, mas de autonomia, de qualidade de vida e de vínculo com a agricultura.”
Para além da situação individual de cada família, possibilitar que os jovens sigam trabalhando na agricultura família é estratégico e vital para os municípios. “A região precisa entender que os jovens precisam ficar no campo por qualidade, por alternativa, não por não ter dado certo na cidade”, pondera Costa, que também é mestre e doutorando em Desenvolvimento Regional.
“Não consigo imaginar como seria região sem uma próxima geração de agricultores familiares. Estaríamos muito perto do caos”, comenta, ao lembrar que, além de possibilitar a oferta de alimentos produzidos na própria região, a agricultura familiar representa emprego, renda e geração de riqueza aos municípios.
Para o professor, garantir uma próxima geração de agricultores familiares em Venâncio Aires e em todo o Vale do Rio Pardo é necessário porque são eles que garantem a produção primária, que é o carro-chefe da economia regional. “Essa é uma questão estratégica e fundamental, mas infelizmente vemos poucos movimentos nessa linha”, enfatiza.