A data 12 de junho reflete sobre uma das principais metas do Ministério Público do Trabalho que é o combate à mão de obra de crianças e adolescentes, pois hoje é celebrado o Dia Mundial contra o Trabalho Infantil.
Uma das iniciativas que mostram a preocupação com o assunto são as campanhas realizadas pelo órgão. Uma delas chama-se ‘Quem emprega a criança, mata a infância’. Conforme a procuradora do trabalho do Ministério Público do Trabalho do Rio Grande do Sul Patrícia de Mello Sanfelice, ao longo dos anos outras campanhas ocorreram e outras ainda serão planejadas, o que mostra que esta é uma realidade que ainda persiste e deve ser combatida.
Um dos principais pontos de discussão sobre o assunto é o que é caracterizado como trabalho infantil. Segundo a procuradora, qualquer situação em que, crianças e adolescentes, sejam retirados de suas atribuições como brincar, estudar, participar de atividades lúdicas e de formação para exercerem alguma atividade ou assumirem responsabilidades na área, é considerado trabalho infantil. “Pode ser desde o trabalho doméstico e artístico até um pequeno empreendimento da família ou lavoura.”
Quando pode ajudar a mãe e o pai?
No entanto, de acordo com a procuradora, também é necessário levar em conta o bom senso, pois pode acontecer dos pais solicitarem auxílio em algum momento para os filhos nas atividades domésticas. “Claro que se eles ajudarem a mãe em casa a secar um louça ou colocar à mesa sem ser por obrigação não teria problema, até porque não temos controle sobre isso. O que não pode é eles serem obrigados a fazerem essas atividades e serem explorados pelo genitor ou outra pessoa.”
De acordo com Patrícia, muitas vezes, crianças e adolescentes são submetidos ao trabalho doméstico e até para cuidarem dos irmãos mas velhos não por maldade dos pais, mas pela situação da família. “Isso é quando o pai e a mãe saem para trabalhar e o mais velho cuida da casa e dos pequenos. O que precisamos é mudar essa situação e pensar em políticas públicas para que mude o cenário.”
Maiores denúncias são na região Sul do Brasil
Patrícia observa que as maiores denúncias ocorrem na região Sul do Brasil. Ela acredita que o fator pode ser cultural pelo fato de que os pais trabalharam antes na infância ou adolescência. “Precisamos ter consciência de que criança tem que ser crianças. Muitos que trabalham podem abandonar a escola e acabam não desenvolvendo as suas potencialidades.” Entre os casos mais comuns de denúncia, estão os trabalhos na agricultura familiar, pequenos empreendimentos e nas residências. No entanto, antes de qualquer decisão, o Ministério averígua a situação.
Sobre a realidade em Venâncio Aires, a conselheira tutelar Maria Roseli Henz destaca que o Conselho recebe poucas denúncias sobre trabalho infantil. “ás vezes, algumas pessoas ligam dizendo que o filho do vizinho trabalha nas atividades da casa ou no fumo. A gente entra em contato, conversamos com a família e vemos que eles, somente, ajudam e não é caso de exploração.” Em caso confirmado, pode ocorrer a destituição do poder familiar.
Sobre o trabalho na agricultura familiar – grupo que envolve maior número de denúncias – , a advogada e socióloga Ana Paula Motta Costa diz que no setor trabalho é visto como valor e dignidade. “Na agricultura familiar, onde o trabalho é visto como um ‘valor’, ainda persistem os argumentos de que crianças devem aprender o ofício desde cedo e que os adolescentes devem trabalhar para ficar longe das drogas ou do crime. Tais argumentos, além de serem nocivos para o desenvolvimento dos jovens, fazem perpetuar a pobreza no meio rural, prejudicando o desenvolvimento da sociedade”, afirma.
Setor de tabaco é o pioneiro no combate ao trabalho infantil no meio rural
Há mais de 15 anos, a entidade desenvolve ações para conscientizar o produtor a cumprir a legislação, uma vez que menores de 18 anos não podem trabalhar na lavoura. Além disso, o SindiTabaco promove Ciclos de Conscientização sobre a saúde e segurança do produtor e proteção da criança e do adolescente.
O resultado deste trabalho pode ser conferido em sala de aula. No município, segundo a diretora da Escola Sebastião Jubal Junqueira, de Vila Deodoro, Adriana Schaefer quase 80% dos alunos estão ligados à famílias produtoras de tabaco. Esse cultivo e envolvimento não afeta e nem influencia o desenvolvimento do aluno na escola. “Vejo que eles não faltam mais por causa da colheira de fumo. Os problemas que temos com evasão estão ligados a outras situações, nenhuma com vínculo a fumicultura”, salienta.
Conforme a diretora, as famílias hoje seguem a legislação e não deixam os filhos trabalharem no cultivo do tabaco. Mas de acordo com ela, crianças que tem alguma função em casa tem melhor desempenho na escola e costumam ser ainda mais comprometidas. Como consequência, aponta, a cultura do tabaco não está sendo passada de geração para geração, e o incentivo desde cedo a continuar na área rural da cidade está se perdendo. “Quem vai sustentar todos na área urbana sem outra política agrícola?”, questiona.
Se no campo a iniciativa do Sinditabaco já mostra resultado de combate ao trabalho infantil, nas ruas da cidade ainda é possível ver crianças e adolescentes envolvidas nas atividades dos catadores de lixo. De acordo com Isolde Musa da Silva, coordenadora de finança e projetos do Planeta Vivo, os catadores que pertencem ao Projeto Minuano são orientados para que a criança não auxiliem no recolhimento de lixo. “Eles reconhecem que não podem levar a criança junto para o trabalho”, afirma. Isolde explica que as crianças não podem nem ser levadas atrás nos carrinhos. Em casos de denúncia, as situações são apuradas e os envolvidos alertados.
Comissão para erradicação do trabalho infantil é instalada
O secretário do Trabalho e do Desenvolvimento Social, Miki Breier, instalou na quarta-feira, 10, a Comissão Estadual do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Cepeti), na Assembleia Legislativa. Breier destacou que a comissão deseja atingir a meta de, até 2020, excluir qualquer forma de trabalho infantil. Ele ressaltou a Lei 14.025, de sua autoria, que institui o dia 12 de junho como o de combate ao trabalho infantil no estado.
O coordenador do programa de Erradicação do Trabalho Infantil do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), Francisco Brito, afirmou que a Conferência Global de 2013 demonstrou o reconhecimento das políticas públicas na área, destacando que o desafio do PETI é agregar o conjunto de ações intersetoriais. “A erradicação do trabalho infantil é um compromisso de todos e o MDS está à disposição dos municípios para atuar de forma conjunta nessas políticas públicas.” Também o superintendente do regional do Ministério do Trabalho e do Emprego, Adolar Queiroz, destacou que o ministério conta com equipes qualificadas para atuar na erradicação do trabalho infantil e está articulado com os municípios gaúchos.
O secretário da Educação, Vieira da Cunha, ressaltou a importância do enfrentamento deste tema. “Quando é negado à criança o direito de desenvolvimento e de aprendizagem, certamente no futuro ele não terá condições de salários dignos no mercado de trabalho, entre outras consequências na sua formação”, disse ele, ressaltando que esta é uma tarefa de toda a sociedade. “Temos a grande responsabilidade de oferecer às crianças, na idade certa, um ensino de qualidade. Por isso, a prioridade da Secretaria da Educação é a ampliação da oferta do ensino em tempo integral.” (AI AL)
Legislação
Conforme explica a procuradora Patrícia de Mello Sanfelice, o preceito fundamental sobre a questão do não trabalho infantil está na Constituição Federal de 1988, pois garante proteção integral na infância. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) também traz a garantia de vedação dessa mão de obra. De acordo com ela, é permitido que a partir dos 14 anos, os jovens podem atuar como aprendizes. Entre os 16 e 18 anos, não podem exercer atividades insalubres e perigosas que tragam prejuízos para a formação psicológica e moral. “Eles não podem ser colocados em risco.”