Enquanto aí no Brasil, em fevereiro, o calor tropical perdura, aqui no Norte da Europa vivemos o auge da estação mais fria do ano. Este é o nosso terceiro inverno aqui em Vilnius, e se, no ano passado, tivemos pouca neve, em 2021 estamos nos sentindo praticamente atolados no gelo. A Lituânia é um país pequeno com população esparsa pelo território diminuto, quatro vezes menor que o estado do Rio Grande do Sul. No entanto – como já comentei aqui na coluna outras vezes – é infinitamente mais gelada que as terras gaúchas. O inverno do Sul do Brasil jamais se compara com a estação daqui. Na mesma proporção que o verão europeu raramente assemelha-se ao calor tupiniquim.
Embora nas últimas semanas tem nevando bastante em quase todos países europeus, a estação do frio no norte da Europa é bem mais longa e fria do que no resto do continente. Nos países do Mediterrâneo, por exemplo, o inverno chega a ser agradável de tão curto! A grande diferença está na duração, são pelo menos quatro meses ininterruptos aqui (de novembro a meados de março); e, é claro, na temperatura. Temperaturas negativas, dia e noite, são a norma enquanto a neve é presença absoluta, cobrindo as imperfeições da natureza e transformando o horizonte num manto branco resplandecente. Nesta semana, a sensação térmica foi de 22 graus abaixo de zero. Isso mesmo, sair na rua é mais gelado do que entrar num freezer! Aqui neva praticamente todas as noites. Lagos e rios congelam. E para sair na rua é preciso estar bem agasalhado. Quando os termômetros ‘sobem’ para zero grau no início de março, a sensação é de euforia!
Durante o período de 2012 a 2015 vivemos em Minsk, capital da Bielorrússia, e pela primeira vez enfrentei as agruras do clima glacial russo considerado um dos mais rigorosos do mundo. Então posso dizer que não somos marinheiros de primeira viagem. No entanto, a realidade aqui em Vilnius é mais extrema e requer muitos cuidados na hora e sair de casa. Aqui precisamos de botas impermeáveis e com solado antiderrapante. Esqueça calça jeans ou casacos que não sejam forrados. Para enfrentar o frio congelante precisamos usar camadas de roupas evitando ficar na rua por períodos prolongados pois a pele do rosto pode sofrer queimaduras devido ao vento gelado. A alimentação reforçada é um dos aliados dos lituanos no combate ao frio. Eles são grandes apreciadores de chás assim como café, e se deliciam com inúmeros pratos de sopas – da azedinha, beterraba, cogumelos, até os caldos aveludados de peixe e carne de porco misturados com feijão branco e batata.
E por falar nele, o tubérculo branco é um dos preferidos dos lituanos! Acompanha quase todos pratos, seja apenas cozida, frita ou cremosa, a batata vai com tudo. O melhor exemplo fica por conta do cepelinai, o prato lituano mais famoso e que denota a culinária artesanal espalhada por todo país. Todos os anos no primeiro domingo de fevereiro os lituanos comemoram o dia do cepelinai – considerado o prato nacional do país. Cepelinai são bolinhos cozidos de batata, recheados com carne de porco e servidos com um molho de bacon e creme de nata azeda e funcho, na receita tradicional. É claro que hoje em dia existe a versão vegetariana para aqueles como eu que não comem carne de porco, com cogumelos ou outros vegetais, mas o tempero verde não pode faltar. Aliás, funcho por aqui é o rei da cozinha! A maioria das receitas lituanas é acompanhada por funcho fresco.
Cepelinai pode ser traduzido como zepelins e por isso o bolinho tem o formato de um dirigível. A receita remonta a séculos passados, enaltecida pela cozinha pobre da época. Os cepelinai davam sustento aos trabalhadores famintos e considerados o prato principal da maioria das famílias. Hoje em dia vários restaurantes na capital lituana oferecem a versão original assim como cepelinai mais requintados com molho de lagostas ou queijos.