Banhada pelo mar Báltico, a Lituânia faz parte das Repúblicas Bálticas, no norte da Europa, dividindo fronteiras com a Letônia, Bielorrússia, Polônia e com o enclave de Kaliningrado, pertencente a Rússia. Com pouco menos de três milhões de habitantes é uma nação pequena, bem menor que a maioria dos estados brasileiros. A história lituana, no entanto, remonta ao tempo em que o Brasil sequer tinha sido descoberto. E conta com um passado bem mais sombrio que as terras tupiniquins. São muitos os eventos históricos a serem lembrados e comemorados. Entre eles, a independência do país, que é festejada em duas datas comemorativas.
Todos os anos o dia 16 de fevereiro é recheado de euforia. Pois em 1918, nesta data simbólica e feriado nacional, o país declarava sua independência do Império Russo. Já comentei aqui na coluna várias vezes sobre a história incrível deste país. Desde o início de sua história lá nos tempos pagãos, os lituanos sempre lutaram pela própria identidade e pela liberdade. Devido às ocupações múltiplas, a república báltica comemora duas datas para marcar a independência – 16 de fevereiro e 11 de março, ambas feriado nacional. A primeira, denominada “restauração da independência” (pois a Lituânia fora um país independente desde o século XIII) e a segunda, quando o país se libertou do regime comunista soviético no início dos anos 90.

Séculos de sofrimento no passado sombrio do país deixou cicatrizes profundas na população, mas criou também uma força veemente, determinante na preservação da cultura e raízes da nação. Se durante a Idade Média os lituanos tiveram coragem para acabar com a expansão germânica formando uma das alianças mais poderosas do leste europeu, de norte a sul, entre o mar Báltico e o mar Negro, os séculos seguintes de pura opressão não ofuscaram a determinação deste povo lutador. Eles jamais se renderam ao regime tirânico ainda que em meio a conflitos, guerras e invasões o país perdia parte do território para a Polônia e Bielorrússia. Durante um século inteiro, até 1918, este pequeno país fez parte do Império Russo e foi durante este período negro que a cultura lituana foi massacrada.
A jovem democracia de hoje veio com a independência da antiga URSS, há apenas três décadas e o preço da liberdade foi alto, ceifando vidas e deixando marcas que podem ser percebidas ainda hoje. Desde então, o país vem reconstruindo sua estrutura democrática, como uma nação próspera, espelhando-se nos países escandinavos e distanciando-se -finalmente- dos vizinhos russos. Os lituanos detestam qualquer ligação à cultura russa e não gostam de serem associados ao leste europeu. Eles se consideram norte-europeus com grande afinidade com a cultura ocidental. Nesta semana, durante o feriado de terça-feira, o país inteiro se vestiu de verde, amarelo e vermelho com centenas de bandeiras tremulando pelas fachadas das ruelas da capital para comemorar os 103 anos de independência do Império Russo.

Os principais monumentos, prédios e casarios em Vilnius receberam iluminação especial para comemorar o dia da independência. Devido à quarentena que o país vive desde novembro passado, com todos estabelecimentos comerciais fechados, as comemorações deste ano não contaram com nenhum evento público. O povo, no entanto, saiu às ruas cobertas de neve, respeitando a distância social e Vilnius ficou lotada de famílias caminhando pelos parques e ruelas com as crianças abanando bandeirinhas. Os lituanos são patriotas orgulhosos. Mas é interessante notar que aqui raramente o patriotismo se mistura com política. Não tem discursos, nem palanques. Os lituanos primam pela simplicidade e reflexão interior. No alto da torre de Gediminas, um dos monumentos mais simbólicos de Vilnius, a criançada brincava na neve durante o feriado, escutando os pais orgulhosos contarem lendas do passado. Morando aqui na capital lituana há mais de dois anos, continuo cada vez mais a me deslumbrar com este pequeno país.
