Precisamos repensar a ocupação das áreas de risco. É um debate inadiável. Os técnicos, os especialistas, os prefeitos estão alertando sobre isso. Após o Rio Grande do Sul registrar a maior tragédia climática da história, até mesmo os moradores de áreas ribeirinhas estão mais convencidos de que morar em um local mais seguro é a decisão mais sábia. Longe de ser a mais fácil.
Na quinta-feira, 16, quando estive no abrigo de Vila Estância Nova, encontrei moradores de diferentes localidades que são, historicamente, atingidas por cheias do Rio Taquari. E todos que entrevistei afirmaram que, se tiverem a opção de residir em um local mais seguro, irão se mudar. Claro que há uma preocupação com os vínculos com a comunidade e no fato de que aquele pedaço de terra representar, na maioria dos casos, o único imóvel da família. A maioria das pessoas está cansada, esgotada. São três enchentes históricas em um espaço de oito meses. “Pagamos duas prestações da geladeira nova e já perdemos tudo novamente”, me disse um dos moradores de Vila Mariante.
A recomendação de não construir em áreas de risco também é do Ministério Público do RS. O promotor de Justiça Sérgio Diefenbach, responsável pela Promotoria Regional do Meio Ambiente da Bacia Hidrográfica dos Rios Taquari e Antas, citou três grandes desafios aos prefeitos no enfrentamento de eventos climáticos extremos: identificação de áreas seguras para essas famílias residirem, encontrar dinheiro para investimentos e lutar contra o tempo. “Historicamente, os municípios, sem exceção, nunca tiveram um olhar para o déficit habitacional. Agora, a natureza impôs essa urgência”, disse o promotor, que defendeu que cada município tenha um gabinete de crise climática.
Conheci Seu Décio
Na quinta-feira, 16, estive com os colegas Leonardo Pereira e Renan Zarth no ginásio da Comunidade Nossa Senhora de Lourdes, em Vila Estância Nova. O local é um dos três abrigos de Venâncio Aires que acolhe vítimas da enchente.
Na noite desta sexta-feira, 17, 219 pessoas seguiam nos abrigos. Muitos delas, tiveram suas casas completamente destruídas pela força da água.
Foi no ginásio de Estância Nova que conheci, pessoalmente, Décio Faleiro, 56 anos. Só não esperava que seria assim o nosso encontro.
Seu Décio é ouvinte do programa Folha 105 – 1ª edição, que eu apresento das 11h às 12h, de segunda a sexta-feira, na Rádio Terra FM. Em setembro de 2023, ele foi um dos moradores resgatados da enchente, em Vila Mariante, e durante uma entrevista ao vivo para o programa Folha 105, ele contou ao jornalista Leonardo Pereira que era ouvinte do programa.
Oito meses depois, Seu Décio enfrenta mais uma enchente do Rio Taquari. Desta vez, a casa dele se foi com a força da água e ele ainda não sabe quando terá um lar para chamar de seu. Entre tantos pertences perdidos, está o radinho que ouvia a 105.1 FM. Aliás, os radinhos de pilha foram essenciais durante a enchente para que as pessoas conseguissem se informar. Sem energia elétrica, sinal de celular ou acesso à internet, era a fonte de informação de muita gente. E seguirá sendo assim.
Apesar de ter ouvido tantos relatos comoventes no abrigo, encontrei lá muito amor, carinho e voluntariado. Todos que conversei relaratam que estão sendo muito bem acolhidos e cuidados. Sabemos que há um caminho longo pela frente e apesar de toda rede solidária, o que mais essas pessoas desejam é voltar para casa, é ter o próprio canto. Espera-se que, o quanto antes, as promessas de novas casas para os moradores, como prometeu o Governo Federal, sejam cumpridas.
Eu e Seu Décio já nos comprometemos em contar o próximo capítulo dessa história, na sua nova casa. E, claro, com radinho novo para continuarmos conectados nas ondas do rádio.