Prestes a completar 90 anos, Brunilda Schwertner, moradora do bairro Morsch, recorda com carinho a infinidade de papéis que desempenhou ao longo da vida. Quando tinha 16 anos, saiu de Vila Deodoro junto com a irmã para morar na cidade com uma tia, a fim de trabalhar. No início, as duas trabalharam numa fábrica de vidro, depois foram para o ramo do alumínio, onde Brunilda ficou até casar. “Quando fecharam a fábrica de vidro, fiquei desesperada por não ter emprego. Mas minha tia me levou em outra fábrica e comecei a trabalhar no dia seguinte”, recorda.
Foi na casa onde vivia com a tia, Ana, que Brunilda conheceu quem iria se tornar seu marido. Albino José Schwertner – hoje já falecido – fazia serviços gerais na residência e o casal se encontrou quando a tia pediu para que ela o ajudasse no corte de lenha. “Entre um corte e outro, nos olhamos”, brinca.
Brunilda casou quando tinha 22 anos e foi trabalhar junto com o marido no estabelecimento comercial do sogro, Raymundo, a Casa Schwertner, localizada na rua Osvaldo Aranha. O local, que hoje trabalha com itens para pesca, caça e camping e é comandado pelos filhos de Brunilda, Paulo e Neusa, começou como uma mecânica e tornearia.
Raymundo trabalhava na fabricação de peças em torno, algo inovador no município na época. Ela conta que peças usadas na subestação de energia elétrica, por exemplo, eram compradas na Alemanha e o sogro começou a produzir.
CHAVES
Inquieta e querendo aprender mais, Brunilda começou a fazer chaves na Casa Schwertner. “Naquela época, as casas ficavam todas abertas, não tinha serviço de chaveiro”, afirma. A primeira chave feita por ela foi para um trator. Ela recorda de um dia em que estava se arrumando para ir assistir a apresentação de uma orquestra espanhola na Sociedade de Leituras, quando alguém bateu à porta da residência no casal, na rua 7 de Setembro.
Dois rapazes, vindos de Lajeado para a festa, tinham perdido a chave do Corcel amarelo em que estavam. “Eu estava ajudando meu marido a colocar a gravata borboleta quando bateram à porta. Tirei minha roupa de festa, coloquei outro vestido e fui ao trabalho”, conta. Ela diz que retirou o miolo da fechadura e conseguiu fazer duas novas chaves para os novos clientes. “Eles ficaram tão agradecidos que pagaram o dobro do valor pelo adiantado da hora”, lembra.
Uma pausa para cuidar dos filhos e um novo aprendizado
Quando a primeira filha do casal – Neusa, hoje com 65 anos – nasceu, o sogro de Brunilda, Raymundo, a chamou para conversar. Ele disse que até os sete anos de idade a mãe precisava ficar com os filhos em casa para poder educar de forma correta. “Meu sogro era rígido, mas muito inteligente”, lembra.
Foi então que a inquietação e vontade de aprender e estar ativa de Brunilda atentou para outra atividade. Ela fez um curso de costura e começou a trabalhar na confecção de roupas. Costurava em casa e cuidava dos filhos, já que depois disso teve mais um, Paulo, hoje com 61 anos. “Fazia de tudo, fiz até vestido de noiva”, recorda. Hoje, Brunilda ainda reserva parte dos seus dias para a costura. Ela produz peças de artesanato e aventais para serem usados de brinde na tradicional Festa do Bastião.
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LAZER
Com as crianças já maiores, a mãe voltou ao trabalho na Casa Schwertner, onde atuou por cerca de 60 anos. “A gente sempre trabalhou muito e é muito bom”, avalia. Brunilda diz que sempre foi avessa ao que, normalmente, as mulheres da sua idade faziam. Aos sábados à tarde, quando as amigas se reuniam para tomar chá, ela levava as crianças para o matiné – como era chamado o cinema antigamente. “A gente trabalhava a semana toda, tinha que ter um tempo pra dar atenção para os filhos”, destaca.
Brunilda também, por muitos anos, fazia outras duas atividades de lazer: viagens e pescaria. Ela já visitou a Alemanha e Austrália, além de pontos turísticos no Brasil. As viagens para pescar também fizeram parte da rotina. Ela ia junto com amigos e o filho para o Rio Ibicuí e Uruguai, além das pescarias mais perto, no Rio Jacuí. “Sempre gostei de pegar surubim, era um peixe de pelo menos 20 quilos”, diz.