Nos últimos anos nos acostumamos com notícias que confirmam a tendência de diminuição de área plantada de tabaco no Brasil, onde o espaço antes preenchido pelas lavouras vem sendo substituído por outras culturas e atividades.
Essa diminuição não é novidade e acontece, na maioria dos municípios, de forma gradual. Mas tem outro movimento que parece não tão gradual assim: daquele produtor que, em vez de ir diminuindo aos poucos, resolveu parar em definitivo.
No caso de Venâncio Aires, que na safra 2018/19 tinha aproximadamente 3,4 mil produtores, chega a 2,6 mil na atual temporada – queda de 23% em três anos. Os números são da Emater local, com base no que foi comercializado no fim de cada safra (veja abaixo).
“Os pais estão envelhecendo e muitos filhos não estão interessados em tocar a produção, por isso há um grande problema na sucessão familiar. Depois disso, é a mão de obra, cada vez mais difícil de encontrar”, afirma o chefe da Emater de Venâncio, Vicente Fin.
Entre os que decidiram terminar totalmente com o plantio, está a família Jessof, de Linha Herval. A última safra foi cultivada em 2019/20, com 85 mil pés plantados. Com a dificuldade de encontrar diaristas (mesmo buscando em casa e oferecendo refeições) e sempre à mercê do clima, a decisão de Adriane e dos pais Ênio e Sônia foi unânime: era hora de partir para outra. “Quem trabalhava com a gente se aposentou e aqui no entorno muita gente está trabalhando em outras coisas. Sem falar que o fumo é um investimento grande para confiar no clima”, comenta Adriane Cristina Jessof, 26 anos.
Ainda enquanto colhia o tabaco da última safra, a família já tinha em mente qual poderia ser a atividade substituta. Sem depender de sol ou chuva e considerando que os Jessof têm uma área pequena para apostar em grãos, a escolha foi pela avicultura. No próximo julho, fará um ano do primeiro alojamento (os pintos chegam com um dia de vida e saem com cerca de 30).
Para a construção dos aviários (erguidos onde antes havia lavouras de tabaco), foram financiados R$ 2,3 milhões para dois galpões de 2,4 mil metros quadrados cada um, além de parte da terraplenagem. “É um investimento grande, mas com o passar dos anos vai ficar bom no retorno. Para quem está envelhecendo, também é uma atividade que não judia tanto como a lavoura. Então para nós foi um acerto”, considera Ênio Rogério Jessof, 59 anos.

Questão de idade
Na propriedade dos Kipper, em Linha Hansel, o tabaco foi plantado pela última vez na safra 2020/21. Da mesma forma que os Jessof em Linha Herval, Roque Afonso Kipper cita a falta de mão de obra como uma das maiores dificuldades. “Está muito difícil de achar. E como tem pouca gente interessada, se torna uma mão de obra cara. Em cima disso, coloca os insumos, que aumentaram 100% de um ano para o outro”, destaca o agricultor, de 62 anos.
Mas como o avanço da idade também é algo que preocupa (já que a esposa Luordes também tem 62 anos e as filhas não ficaram no interior), Kipper entendeu que seguir com o tabaco seria arriscado. “A idade vai chegando e os problemas de saúde também. O fumo é judiado o ano todo, então o melhor foi decidir por outras atividades.”
A ideia do agricultor é retomar a criação de peixes nos três açudes, arrendar terras para plantar milho e criar terneiros, comprados recentemente. “Vai ficar mais tranquilo para nós”, conclui.
Produtores em Venâncio *
2018/19: 3.398
2019/20: 3.321
2020/21: 3.311
2021/22: 2.608
*Esse número informado pela Emater considera a comercialização final de quem vende tabaco acima de R$ 4 mil (o que daria cerca de apenas dois mil pés cultivados). Segundo Vicente Fin, abaixo desse valor (em torno de 1,1 mil pessoas) não são considerados essencialmente ‘plantadores de tabaco’, porque muitos apenas arrendam terra para outros cultivarem.
O que dizem Afubra e STR
O presidente da Associação dos Fumicultores do Brasil (Afubra), Benício Werner, comenta que no Vale do Rio Pardo há outro fator que tem influenciado na diminuição de produtores de tabaco. “Na região, muitas cidades são industrializadas, então tem muita gente que já trocou e vem trocando o trabalho na agricultura pela indústria. Ficam apenas morando no interior e trabalham na cidade.”
Werner também entende que a migração para outras atividades, principalmente para produção de grãos, tem contribuído nos números, o que se percebe na diminuição da área plantada de tabaco. “No que tem de estudo, não vejo que a produção irá parar totalmente, porque continuará pelos consumidores de cigarros tradicionais. Mas deve seguir diminuindo, por isso essa produção precisa se adequar ao consumo.”
O presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR), Cláudio Fengler, também cita a mão de obra e a sucessão familiar como as maiores dificuldades. “Quem estava plantando envelheceu, se aposentou e reduziu ou parou tudo, porque o esforço físico é muito. A remuneração até melhorou recentemente, então alguns começaram a plantar um pouco mais, mas ter novos produtores é algo mais difícil.”
Fengler também comenta sobre a opção de alguns que tinham uma área maior de terra e, por isso, decidiram plantar grãos. “A troca da atividade acontece por isso, porque não tem mão de obra para ajudar no tabaco e o jovem que está ficando prefere apostar em outras culturas, como a própria produção do leite, por exemplo.”
Produtividade e retorno financeiro em alta
Se a área plantada e o número de produtores têm diminuído, a produtividade não acompanha essa mesma curva para baixo. Em 2016/17, por exemplo, quando Venâncio plantava 9 mil hectares de tabaco, a produção chegou a 2,3 mil toneladas. Já em 2021/22, as mesmas 2,3 mil toneladas foram produzidas em 8,2 mil hectares.

“Em uma área menor, a tendência é se cuidar mais da lavoura. E temos tido casos de dar 12 arrobas a cada mil pés plantados. Numa média tradicional, fazer 10 arrobas já é considerado muito bom”, destaca o chefe do escritório local da Emater, Vicente Fin.
Quem também ressalta o fator ‘produtividade’ é o presidente da Afubra. “Em número de produtores e área plantada tem tido uma queda maior nos últimos anos na comparação com a produtividade. Ela também diminui, mas proporcionalmente esse movimento é muito menor.”
O que segue crescendo é a contribuição do tabaco dentro do Valor Bruto de Produção Agrícola (VBPA) – passou de R$ 116,1 milhões em 2016 para R$ 178 milhões em 2021.
