Dez anos

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Era 25 de junho de 2009. Eu estava no terceiro semestre da faculdade. Era fim de semestre e, logo, época de provas. A morte de Michael Jackson havia sido anunciada à turma pela professora, tão desconectada da realidade quanto aquela gurizada de 19 ou 20 anos, logo antes da prova decisiva da disciplina. Ao final da avaliação, todos ao ônibus. Cujos passageiros, todos também universitários, mantinham um silêncio sepulcral – incomum principalmente num período em que tantos possuíam tanto a dizer – ante a pequena TV, sintonizada no Jornal Nacional, que detalhava o fato do dia. Há dez anos, como que de repente, as pessoas se davam conta de quem havia sido Michael Jackson.

Virada às avessas
Quando de sua morte, Jacko não era notícia por sua música havia tempos. Somente por polêmicas da mais diversas: da pedofilia à falência, de balançar o próprio filho, ainda bebê, na janela do hotel, até a cor da própria pele. Tudo era parte de um universo que parecia mais fantasioso do que o próprio rancho Neverland, mas carregava toda a doçura e dureza que só a vida real pode proporcionar. Jackson ensaiava para uma turnê que salvaria suas finanças e sua reputação. O homem que não conseguia sequer dormir em condições naturais, antes disso, encontrou a morte para a própria libertação. Ao menos, os feitos de Jackson em dança e música voltaram a serem lembrados mais do que as polêmicas das quais também foi vítima.

Com ressalvas
Dez anos se passaram e há motivos para crer que sua figura ainda é vista com ressalvas para ser relembrada ou homenageada. Sobretudo em virtude das acusações de pedofilia, que não parecem até hoje devidamente esclarecidas – vide o recente documentário Leaving Neverland, que salpica mais pimenta na eterna polêmica. Talvez se perca uma boa oportunidade de preservar sua figura por seu talento descomunal e ainda abrir um bom debate: o comportamento errático do Rei do Pop, numa eterna busca pela infância que nunca viveu, deve-se à criação brutal comandada por seu pai, o verdadeiro ser totalmente desprezível da história.

Tem que ver isso daí
Uma pena este péssimo hábito coletivo que insistimos em conservar: o de dar valor somente após a perda. Vejamos: o fato musical desta semana foi a aparição de Majur, artista que gravou a música AmarElo com Emicida e Pabllo Vittar. Majur, nascida Marilton Conceição Jr., virou notícia acima de tudo por se tratar de pessoa de gênero não binário – resumindo, grotescamente: alguém cuja identidade de gênero não é nem inteiramente masculina nem feminina. OK. Cada um deve ter suas preferências e estas devem ser respeitadas. Ainda assim, saudades de quando a música não era sobrepujada pelas coisas que naturalmente a rodeiam.

Três acordes
# Impossível, com os acontecimentos da semana, não lembrar da passagem de Michael Jackson pelo Brasil, em 1995, para gravar o clipe de They Don’t Care About Us.
# Sobretudo pois o vídeo é iniciado por um grito de voz feminina, em português mesmo, com tradução livre do título da música: eles não ligam pra gente.
# Está muito claro quem são eles. E tanto quanto que, seja no Pelourinho, morro Santa Marta ou num mero calçadão, eles ligam cada vez menos pra gente.

    

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