Dialeto alemão: O ‘idioma oficial’ das famílias do interior

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Por Taiane Kussler

Em Venâncio Aires, é comum encontrar pessoas conversando em alemão, seja no supermercado, na farmácia ou nas praças da cidade. O idioma é bem marcante entre os venâncio-airenses, que mantêm viva a tradição germânica.
Mas, é no interior do município que o dialeto alemão é predominante e se torna o ‘idioma oficial’, para algumas famílias. Nos encontros na beira da estrada, nas festas da comunidade e para receber um visitante, a recepção é sempre a mesma: “Alles gut?” – “tudo bom?”, em português.

Na casa da família Henn, de Centro Linha Brasil, o costume não é diferente. Os agricultores Vera Lúcia Schneiders Henn, 43 anos, e Milton Henn, 42 anos, conversam, diariamente, em alemão, em casa, para estimular a filha, Andressa Luíza Schneiders Henn, 10 anos, a aprender o idioma e manter a tradição.

Família Henn, de Centro Linha Brasil, mantém o hábito de falar alemão no dia a dia, para seguir a tradição. (Foto: Rosana Wessling/Folha do Mate)
Família Henn, de Centro Linha Brasil, mantém o hábito de falar alemão no dia a dia, para seguir a tradição. (Foto: Rosana Wessling/Folha do Mate)

“Saber o alemão é muito importante para o futuro das crianças, principalmente, quando forem procurar um emprego. Esta é a primeira coisa que perguntam”, comenta a mãe de Andressa, lembrando que os bisavós maternos da menina sempre falaram em alemão e os bisavós paternos não sabem falar o português.

Além de conversar com os pais, Andressa também pratica o idioma com os avós Ervino e Clari Henn, de 68 e 63 anos, respectivamente. Eles moram ao lado da residência da neta e estão sempre juntos. “Aprendi a falar alemão com o meu avô, mas os números eu ainda não sei todos”, explica Andressa. Para a avó Clari, é um orgulho ver a motivação da neta querendo aprender cada dia mais sobre o dialeto. “É uma felicidade para nós”, define.

A menina entende o idioma e responde em alemão quando está em casa com a família, exceto quando se reúne com os primos, que não sabem o dialeto. “Praticamente todos nós [família] falamos, menos alguns dos primos dela que moram na cidade. Logo que eles vão para a creche, geralmente, desaprendem a língua”, comenta Vera.

Andressa estuda na Escola Estadual de Ensino Fundamental (EEEF) Cristiano Bencke e se diverte com as amigas quando conversa em alemão. “Eu tenho muita sorte, quase ninguém na minha sala entende em alemão e eles não sabem o que eu digo quando converso com minhas colegas”, afirma a garota, sorrindo. Ela percebe que, na escola, dificilmente as professoras falam o dialeto.
Mesmo sem dominar completamente o idioma, a estudante do 4º ano do Ensino Fundamental gosta muito de falar alemão. “Desta forma, consigo falar outra língua. Quando eu não sei algumas palavras, eu pergunto para os meus avós ou minha mãe, porque eu não tenho vergonha”, destaca.

Andressa também faz aulas de inglês na escola e observa que algumas palavras são bem parecidas. Além disso, participa de aulas de música, sendo que, ainda não aprendeu nenhuma canção em alemão. Mesmo que os avós de Andressa escutem as músicas em alemão no dia a dia, quando questionada sobre o gosto musical, ela destaca as suas preferências. “Gosto mesmo é de pop”, afirma a menina, que quando não está na escola, costuma cuidar dos animais de estimação no quintal, principalmente das galinhas.

“Quando as pessoas deixam de falar uma língua, sucumbe todo um mundo cultural”

O dialeto germânico é uma das heranças culturais dos colonizadores mais marcantes em Venâncio Aires. Apesar de tentativas governamentais que buscaram o seu extermínio, como na época da Nacionalização do Ensino e da Língua, a partir de 1937, quando houve proibição de falar alemão no Brasil, a tradição se mantém viva, ao longo das gerações, especialmente nas comunidades rurais.
A professora universitária aposentada Lissi Bender explica que, como leitura, formação humana e educação estavam entre os principais valores para os imigrantes germânicos, a escola era de fundamental importância. “Nas escolas por eles criadas, era ensinado o dialeto padrão, ou seja, o Hochdeutsch. Isso contribuiu em muito para que a língua alemã permanecesse viva e propiciasse acesso à leitura”, observa ela, que é pós-graduada em Língua, Literatura e Cultura Alemã.

Na opinião da pesquisadora, que é mestre em Desenvolvimento Regional e doutora em Ciências Sociais, a perseverança das famílias e comunidades precisa receber apoio para o reconhecimento público da língua alemã, como patrimônio imaterial de Venâncio Aires.
Ela observa que a língua é suporte de identidade e cultura. Assim, quando uma comunidade segue falando alemão, garante que suas tradições sejam cultivadas sem artificialismos. “Variadas são as tradições, os hábitos, os costumes trazidos pelos imigrantes e que continuam presentes nas comunidades e merecem ser cultivadas e legadas às gerações vindouras. Se uma língua morre, os bens culturais tenderão a serem reproduzidos de forma artificial. Quando as pessoas deixam de falar uma língua, sucumbe com elas todo um mundo cultural que é permeado e suportado pela língua”, salienta.

“A riqueza de um povo como um todo reside na diversidade de seus conhecimentos e culturas, no diferente que agrega valor, que soma para o todo. Neste sentido, a imensa diversidade linguística existente no Brasil compõe uma das maiores riquezas do Brasil, tanto para a manutenção da diversidade cultural, quanto para sua inserção no mundo global.”
LISSI BENDER
Professora aposentada e estudiosa da Língua e Cultura Alemã

Algumas expressões em alemão

Bom dia! – Guten Morgen!
Boa tarde!Guten Tag!
Boa noite!Guten Abend! (cumprimento, quando a gente encontra alguém de noitinha/noite) ou Gute Nacht! (quando a gente se despede de alguém, para lhe desejar uma boa noite)
Obrigado!Danke! ou Dankeschön!
Muito obrigado!Vielen Dank!
De nada!Nichts zu danken!
Como vai?Wie geht´s?
Tudo bom? Alles gut?

Com contribuição de Juliana Bencke*

    

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