Por Taiane Kussler
Os tradicionais bailes nas comunidades são atrações em Venâncio Aires. Todos os fins de semana, as famílias se preparam para prestigiar as festas e aproveitar o momento para encontrar os amigos e se divertir. Além de ser uma opção de lazer, os eventos ao som das ‘bandinhas’ resgatam as características germânicas, marcadas pela dança, música alemã e integração.
O músico Adriano José Kroth, 16 anos, de Travessão Linha Marechal Floriano Baixo, conhece as preferências das pessoas que frequentam as festas do interior. Desde 2018, quando passou a fazer parte da banda Os Dattain, ele viaja pelo estado e anima bailes no interior de Venâncio Aires e região, disseminando a cultura germânica por vários pontos do Rio Grande do Sul.
Segundo o músico, que toca teclado, gaita, pandeiro e saxofone, cada localidade tem uma preferência musical, por isso, a banda já vai com um repertório definido. “Em Linha Sapé e Tangerinas, por exemplo, a mais solicitada é a valsa sertaneja. Já na região de Mariante, como estão muito ligados à cultura gaúcha, as músicas tradicionalistas são as mais tocadas”, observa.
As canções em alemão também são uma forte característica nas festas das comunidades. Adriano percebe que, quando as músicas alemãs são tocadas, as pessoas se identificam com o repertório e ficam mais à vontade para dançar no salão, principalmente, os grupos da terceira idade. “Esta característica é das bandas do interior, porque aquelas do centro de Venâncio Aires nem sempre tocam”, comenta.
Conforme o músico, além de seguir a tradição da família, disseminar a música alemã às outras pessoas é muito gratificante. Além de tocar na banda, Adriano também participa, todos os anos, do Terno de Reis, ao lado dos pais Reuni João Kroth e Neuse Maria Assmann Kroth, ambos com 53 anos.
“Este é o momento que mais espero durante o ano, é tudo para a gente. Levar a música até as pessoas que moram em lugares de difícil acesso me deixa muito feliz”, enfatiza o jovem, com brilho nos olhos, quando lembra da recepção calorosa que recebe dos outros, principalmente dos mais idosos, que, por motivo de saúde, não frequentam mais os bailes e ficam emocionados com a visita. “Tocamos das 7 horas da manhã até o nascer do sol”, conta.
Tradição que se perpetua por quatro gerações
Adriano Kroth vem de uma família de músicos – já são quatro gerações envolvidas. O jovem nascido em Monte Alverne começou a tocar profissionalmente aos 14 anos, quando entrou na banda Os Dattain. Mas, antes de fazer parte do grupo, ele já tocava na igreja, participava de festivais estudantis de música, do Terno de Reis e integrava os corais de atos fúnebres e o Venâncio em Canto – todas as atividades mantidas até hoje.
A estante da casa onde mora com os pais, em Travessão Linha Marechal Floriano Baixo, quase não tem mais lugar para acomodar os troféus. São oito prêmios que já conquistou desde que começou a participar dos eventos. O primeiro foi em 2014, quando recebeu o troféu no evento Ciranda Cultural, e o último, do Festival Canto de Viola, evento de música sertaneja de raiz, em outubro de 2019.
Inspirado nos pais, avós e bisavós, Adriano toca teclado, gaita (quando começou a participar dos festivais estudantis), pandeiro e saxofone – instrumento que o avô paterno tocava. Há dois anos, ele foi convidado a integrar a banda Os Dattain, o mais novo do grupo. “No início, eu não aguentava tocar toda a festa, cansava o braço de segurar a gaita por cerca de cinco horas e também a voz”, explica.
O jovem, que nas horas vagas gosta de jogar futebol e ir às festas, para prestigiar outros músicos, sonha em conhecer o mundo por meio da música e, um dia, tocar em uma banda de quartel.
Gaita é um dos instrumentos tocados por Adriano Kroth
Bailes ao longo da história
Conforme o historiador Olgário Vogt, no livro Abrindo o baú de memórias, nos primeiros tempos da colonização em Venâncio Aires, quando havia algum festejo, os colonos dançavam de pés descalços no pátio em frente às casas ou em ranchos de chão batido. Depois, surgiram os salões de baile nas picadas – geralmente, anexos a casas comerciais.
De acordo com Vogt, antigamente, os bailes eram realizados aos domingos. “As pessoas percorriam, muitas vezes, longas distâncias a pé, de carroça, no lombo do burro ou do cavalo para chegar ao local da festa. Como os caminhos eram precários e como procuravam diminuir a distância atalhando por roças e matos, muitos levavam os calçados na mão.” Por isso, portavam também panos para limpar os pés, além de carregarem um lampião para não se perder ou cair na escuridão da noite. Ao aproximar-se do salão, escondiam os panos e as lanternas em algum mato para pegar na volta.
Curiosidades
Ao abordar os bailes de décadas passadas. no livro Abrindo o baú de memórias, Olgário Vogt destaca alguns aspectos curiosos:
- Os bailes tinham início por volta das 20h e terminavam pelas quatro da madrugada. Nos primeiros tempos da colônia, os padres eram contra fazer bailes aos sábados, porque, se isso ocorria, muitas pessoas deixavam de participar das missas no outro dia. Por isso, os bailes eram realizados nos domingos e a segunda-feira era dia normal de trabalho.
- A cerveja, assim como a gasosa, era tomada levemente resfriada nos porões existentes nos salões.
- Os músicos tocavam os instrumentos sem o auxílio de caixas de som ou outros equipamentos acústicos.
- Cuca com linguiça era o cardápio da maioria dos eventos. Também se consumia bastante chocolate e balas nos bailes – os rapazes enchiam os bolsos de bala para oferecer às moças.
- Por volta da meia-noite, ocorria a Damen Stunden – uma troca. Durante uma hora, as mulheres tiravam os homens para dançar. Era proibido ‘dar carão’ e negar a dança.
- O salão de baile tinha dois quartos especiais. O Zimmer era uma peça onde as moças retocavam a maquiagem e conversavam sobre possíveis namoros. Já o Kinderzimmer era o quarto onde os pais deixavam as crianças dormindo enquanto aproveitavam a festa.
Com contribuição Juliana Bencke