Na conversa do dia a dia, em especial no meio rural, muitas pessoas já levantam a possibilidade de a região passar por um novo período de estiagem. Entre o fim do ano passado e o início deste, os agricultores já sofreram com uma seca severa, que causou prejuízos em diversas áreas, como na lavoura, produção de alimentos para animais e disponibilidade de água para oferecer ao rebanho.
Dificuldades como essa foram vividas pelo casal Juraci Padilha, 33 anos, e Renato Guindani, 56 anos, que residem em Vila Arroio Bonito, no interior de Mato Leitão e são produtores de leite há nove anos. Antes da última estiagem, eles não tinham nenhum açude na propriedade e precisaram solicitar à Prefeitura água para oferecer ao plantel formado por 26 vacas de leite, seis terneiras e três vacas ‘secas’.
Além da dificuldade de ter água para os animais, os produtores sofreram prejuízos com o milho que havia sido plantado para fazer silagem e com a pastagem que seria usada para alimentar os animais. Por causa desses problemas ocasionados pela seca, o casal precisou reduzir o número de animais e por isso vendeu 12 vacas.
Como lição das dificuldades enfrentadas com a falta de chuva, os moradores do interior da Cidade das Orquídeas decidiram procurar uma forma de se preparar caso uma nova estiagem aconteça. “Abrimos o açude para ter um reservatório neste ano caso tenha uma nova estiagem. Com isso, já nos sentimos mais preparados. A expectativa agora é pela chuva”, relata Juraci. O reservatório na propriedade do casal foi aberto pela Prefeitura há cerca de três semanas.
Pedidos
De acordo com o secretário municipal de Agricultura e Meio Ambiente, João Carlos Machry, tem se percebido alguns pedidos para limpeza de açudes e para ampliação e abertura de reservatórios. Para ele, isso tem acontecido porque os produtores estão buscando se preparar caso uma nova estiagem aconteça. “Percebemos a preocupação do produtor”, observa.
Machry explica que os serviços de açudagem fazem parte de um programa de governo. O agricultor que tem essa demanda pode procurar a Secretaria de Agricultura para realizar o protocolo. Para ter o serviço executado, ele precisa pagar o valor da hora-máquina e recebe 50% de subsídio. Até outubro deste ano, conforme dados da Secretaria de Obras já foram executados 81 serviços de açudagem. O mês com maior procura até agora foi março, com 31 pedidos.
Pedidos nos últimos quatro anos
- 2017 – 20
- 2018 – 44
- 2019 – 42
- 2020 (até outubro) – 81
Demanda do ano
- Janeiro – 2
- Fevereiro – 8
- Março – 31
- Abril – 9
- Maio – 11
- Junho – 5
- Julho – 3
- Agosto – 5
- Setembro – 3
- Outubro – 4
- Os dados de novembro ainda estão sendo finalizados
“Problema não é a falta de chuva, mas sim a distribuição”, afirma professor da Unisc
Segundo o coordenador do curso de Agronomia da Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc), Marcelino Hoppe, até o momento, cinco meses deste ano tiveram um desempenho ruim em relação à chuva: fevereiro, março, abril, outubro e novembro. Ele ainda observa que, normalmente, nos meses de dezembro e janeiro não há muitas precipitações. “Chove praticamente igual ao que evapora ou abaixo do que evapora”, explica.
Por essa razão, ele acredita que para recuperar fontes e a água do solo a situação não é muito boa até praticamente o fim do verão. Levando em consideração dados referentes à Santa Cruz do Sul, no mês de outubro, normalmente chove entre 145 e 200 milímetros, e foram registrados 53. Em novembro, são cerca de 120 e choveu 72 milímetros. “Em outubro e novembro choveu quase 200 milímetros a menos do que era esperado”, avalia.
Entretanto, Hoppe destaca que no somatório do ano foram registrados até agora 1,4 mil milímetros de chuva. “Mesmo com a seca no início ainda e essa agora, ainda é uma região que chove. O problema não é a quantidade, mas a distribuição de chuva”, esclarece. Por esse motivo, ele salienta que a atitude dos agricultores de se prepararem com a abertura de açudes, por exemplo, é interessante. “Às vezes passam duas semanas sem chover e em outras vem uma bomba de água”, acrescenta.
Conforme o professor, ainda é possível perceber que a quantidade de chuva na região nos últimos anos cresceu. “Também aumentou muito a frequência de chuvas densas”, acrescenta. Para dezembro, ele menciona que a precipitação normal fica entre 120 e 130 milímetros e a evaporação é de 132. Em janeiro, a expectativa é entre 136 e 150 milímetros e a evaporação é de 140 e em fevereiro entre 105 e 120, com evaporação de 113 milímetros. “A evaporação é muito próxima da chuva, o que não acontece em outras épocas do ano. Então, qualquer problema que acontece no verão, a planta sente a falta de água no solo”, relata.
Previsão
Conforme informações do Núcleo de Informações Hidrometeorológicas (NIH) da Universidade do Vale do Taquari (Univates), a tendência é que a precipitação para os próximos meses fique abaixo da normal climática em dezembro e em torno da normal em janeiro. Além disso, o órgão informa que embora os valores de desvios negativos sejam menores do que os observados em outubro e novembro, dezembro ainda deve apresentar os volumes de chuva abaixo do padrão climático.
Segundo o NIH, neste mês a tendência é que aconteça uma maior regularidade na distribuição de eventos de chuva, mas, mesmo assim, haverá precipitação abaixo da média. Para o trimestre de verão haverá influência do fenômeno La-Niña e as projeções climáticas mostram que será registrada precipitação abaixo da normal climática e as temperaturas médias acima do padrão climático.