Artigo: Caminhoneiros autônomos não mamam no governo!

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Por Lotário Wessling – caminhoneiro autônomo

De forma responsável, com a colaboração e aval de um grupo de colegas caminhoneiros, “raiz”, de diferentes regiões do país, eu, Lotario Wessling, caminhoneiro autônomo desde 1981, escrevo esta carta aberta a todas as pessoas de boa fé.
Devido a recentes declarações de autoridades tentando confundir a opinião pública com relação a realidade vivida por nós, caminhoneiros autônomos, faz-se necessário expor alguns pontos para que a população.

Queremos deixar claro que nossa carta não visa trocar farpas ou criar confrontos. Estamos convictos de que a maioria das pessoas sensatas, mesmo as sem vínculo direto com o transporte rodoviário, sabe da nossa importância no conjunto que forma a espinha dorsal econômica e social do país. Portanto, não temos porque nos apequenar. Nosso objetivo é contribuir para o debate sobre a necessidade da implantação e direcionamento de medidas básicas e eficazes, por parte do governo, que organizem e equilibrem a atividade de transporte rodoviário.

A sociedade precisa saber que, na prática, nós caminhoneiros autônomos não usufruímos de benefícios específicos do governo que justifiquem dizer que precisamos ser desmamados. Fora a diminuição da alíquota no imposto de renda, (2012, governo Dilma), e o Pró-caminhoneiro, (2006, governo Lula), que foi capturado por empresas que através de “laranjas” usufruíram das vantagens deixando, (com algumas exceções), os verdadeiros autônomos frustrados, não tivemos benefícios significativos.

Justo destacar que a Lei do Motorista, (13.103/2015, governo Dilma), que foi criada para disciplinar a jornada de trabalho, mesmo toda desfigurada, se cumprida fosse, contribuiria em muito para resolver outros problemas cruciais e correlacionados da nossa classe.
Ultimamente, nada de relevante que foi anunciado está sendo fiscalizado e funcionando de fato. Praticamente tudo que poderia nos beneficiar de alguma forma, está sendo aniquilado por lobbies de setores contrariados. Salientando que, de alguns benefícios, como eventuais vantagens no preço do diesel, na maioria das vezes também não usufruímos, pois é em grande parte abocanhado pelos cartéis neste setor, em que, espertos de plantão praticam outras fraudes já conhecidas.

A maior parte dos valores que recebemos pelo serviço prestado, (frete), já vamos gastando ao longo das viagens, com diesel pneus e toda gama de insumos que compõe nosso negócio. Isso, além do impacto direto e positivo no aspecto social e econômico, gera bilhões de reais em arrecadação de impostos para o governo. “Quem mama em quem nesta história?” Lembrando que, os poucos recursos que nos sobram não enviamos para paraísos fiscais…, são pulverizados na economia local, onde moramos.
Para melhor compreensão do público leigo no assunto, de como se formou a estrutura de exploração, por décadas, e do quanto os caminhoneiros autônomos foram e estão sendo prejudicados e as consequências disso, é preciso expor as faces negativas do pagamento do serviço prestado com a tal carta-frete. Sistema esse que era para ser extinto, já há alguns anos, mas ainda continua sendo usado por algumas empresas. A substituição pelo sistema eletrônico, (cartões), mais usado, na prática é uma versão “repaginada” da velha exploração. Poucas são as empresas que aceitam depositar o valor do frete prestado direto na nossa conta bancaria, como deveria ser, sem intermediários para nos explorar.
Com esse sistema, (carta-frete), a maior parte dos valores referentes ao pagamento do serviço prestado (frete), não foi, e em parte continua, não sendo movimentado na nossa conta bancária. Isso historicamente nos prejudicou para comprar equipamentos e caminhões novos através de financiamentos, como pelo FINAME, por exemplo. Especialmente em picos de crescimento econômico em que muitos aventureiros que não eram do ramo, mas tinham CNPJ e movimentação bancária maior que a da maioria dos caminhoneiros autônomos, compraram caminhões novos com facilidade por meio desses financiamentos. Isso gerou uma concorrência desleal e suicida, contribuindo para a desorganização do transporte rodoviário gerando inclusive busca e apreensão dos bens de muitos desses aventureiros com todas as consequências.
Outra irregularidade, gravíssima, praticada por considerável parte das empresas, entre essas, grandes, é o não recolhimento dos valores de INSS aos cofres públicos que é descontado dos autônomos nas operações de transporte. Isso podemos provar, e se preciso for relatar casos e as empresas envolvidas nesse escândalo que afeta toda sociedade. Muitos colegas se deparam com essa fraude ao encaminhar a documentação para aposentadoria. Além disso, ainda na questão burocrática e tributária, muitas vezes nos descontam taxas e seguros indevidamente. Nas últimas décadas, nenhum governo traçou planos ou medidas realmente eficazes para mudar essa realidade.

As conquistas resultantes da paralisação de 2018, (que são apenas parte da correção de injustiças históricas), até aqui não estão sendo cumpridas, exceto a isenção do pagamento de pedágio dos eixos suspensos em caminhões vazios. O piso mínimo do custo do frete, amplamente discutido com os mais diversos setores envolvidos e baseado em estudos realizados pela ESALQ, absurdamente, foi parar no STF e depende de julgamento da constitucionalidade, mesmo depois de a lei, 13.703/2018, ter sido aprovada em todas as etapas e sancionada pelo ex-presidente Temer.

O pagamento obrigatório do vale pedágio, instituído pela lei, (10.209/2001, governo FHC), na maior parte nos é negado, ou, diluído no valor do frete e “legalizado”, só no papel, através de malandragens contábeis e burocráticas das mais diversas. Em muitos casos, esses embarcadores que apostam em burlar as leis e ganham em torno de 100% sobre o frete nas nossas costas, nos perseguem se reclamamos nossos direitos.

Linhas de crédito para autônomos, (governo Bolsonaro, abril de 2019), os alardeados 30 mil que depois foi aumentado, para compra de pneus e/ou manutenção virou uma frustração para autônomos em grande dificuldade. Segundo admite o próprio governo, o plano foi lançado sem a questão do fundo garantidor para as instituições financeiras resolvido. Amadorismo e incompetência. Assim como o prometido CIOT para todos, (código identificador da operação de transporte), até aqui não funciona, só conversa.

Mesmo não representando toda classe, podemos afirmar que os verdadeiros caminhoneiros autônomos, não vão se acovardar. Independente da corrente política que governa o país, vamos nos opor permanentemente contra políticas que estimulam grandes grupos econômicos, que por meio de braços no setor, e benesses do governo tentam nos esmagar de forma orquestrada e continuamente.

Não temos como “competir”, com megaempresas das quais boa parte se aproveita da inexistência e/ou tímida ação de órgãos fiscalizadores, sonegando cifras milionárias em impostos, descumprindo leis de toda ordem. Mais do que isso, (atenção você que roda pelas estradas e que não é do ramo de transporte rodoviário), arrebentam as estradas com excessos de carga, (peso), em caminhões cujo ônus é simplesmente rateado com todos os usuários através de tarifas de pedágios elevadas e estradas se não ruins, apenas razoáveis. Multas irrisórias, perdão das mais pesadas para alguns setores e outras benesses injustificáveis formam o coquetel de adversidades e injustiças, agravado com a instabilidade na política de preços do diesel, precária infraestrutura e insegurança na rotina dos caminhoneiros autônomos.

Foi um erro e até uma irresponsabilidade o governo, por pressão de infratores contumazes, ter substituído controladores de velocidade eletrônicos por quebra-molas em cidades e outros lugares críticos nas rodovias federais. Tais obstáculos, além de significarem um atestado de ignorância na questão do trânsito, facilitam a ação de assaltantes que virou um pesadelo crescente, depois que o ex-presidente Temer reduziu quase pela metade os recursos para a Polícia Rodoviária Federal (PRF). Temos muitos trechos de rodovias de centenas de quilômetros em que boas estruturas da PRF em pontos estratégicos viraram taperas. Porque o governo não ordena forças tarefa para traçar estratégias com a estrutura policial que, “apareceu” na recente tentativa de paralisação dos caminhoneiros, para “caçar”, pelo menos parte da bandidagem que tanto prejudica a logística do país?

É preciso destacar que muitas dessas adversidades somadas a exigência de jornadas desumanas de trabalho dos motoristas, de boa parte das empresas, impactam negativamente em toda classe, tanto autônomos como empregados, enfim, na sociedade toda. Isso afugenta parte significativa de bons profissionais que faz com que os maus ocupem esse espaço, tornando as estradas uma “selva”, onde o turista tem medo de andar e o profissional responsável é taxado como “estorvo”. A falta de motoristas profissionais no mercado, em meio a um desemprego histórico, é uma prova concreta de que algo de muito errado está acontecendo.

Para o bem do país, a sociedade não pode continuar assistindo a transformação do setor de transporte rodoviário em um verdadeiro “paraíso” para a lavagem de dinheiro, sonegação de impostos e infratores contumazes das leis, por uma parcela das empresas e maus profissionais que aposta no ilegal para se sobrepor ao que é legal.

Por fim, é preciso deixar claro que, não temos, não precisamos e não queremos “teta”, para “mamar” no governo. Queremos que o governo assuma a responsabilidade de, através dos diversos órgãos fiscalizadores, acabar, ou pelo menos agir energicamente, contra a evolução da cultura de descumprimento das leis. Nosso perfil não é, e não nos interessa, constantemente denunciar ou mover ações contra quem nos prejudica. Até porque, na maioria das vezes, individualmente, e, com nossas lideranças dispersas, não temos poder de barganha para esses questionamentos/enfrentamentos. “Cuidar da infraestrutura e do cumprimento das leis, é obrigação do governo.”

“Vamos lutar até as últimas consequências por condições de trabalho minimamente dignas”.

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