As notícias recentes sobre a Covid em Venâncio Aires são as mais positivas dos últimos meses. Pouquíssimos casos diários (zero na última sexta), UTI sem nenhum paciente local internado e a desinfecção da unidade no Hospital São Sebastião Mártir (HSSM) para voltar a receber pessoas com outras doenças.
A esse cenário mais tranquilo os méritos são creditados à vacina. Na Capital do Chimarrão, 59% da população geral já recebeu a primeira dose, 34% a segunda ou dose única e o ritmo por faixa etária já chegou aos 18 anos. Embora haja uma rápida mobilização do poder público para aplicar as vacinas, essa eficiência não consegue alcançar todos. Isso porque há venâncio-airenses que ainda ignoram a campanha, ou esqueceram dos prazos ou até mesmo têm vergonha de voltar à fila justamente porque estão atrasados.
Essa negligência parcial, independente do motivo, tem preocupado diversos setores e entidades, além dos órgãos de saúde. “É o que mais me preocupa neste momento. Nós temos vacinas disponíveis vindo rapidamente, estamos bem adiantados por idade, mas ainda enfrentamos resistência de algumas pessoas”, relatou a médica infectologista, Sandra Knudsen.
Os motivos que a médica já ouviu, por exemplo, alegam medo de reações ou efeitos colaterais, ou sobre a ineficácia da vacina. “Infelizmente circulam histórias nas redes sociais que são aumentadas, assumem um papel grande, e as pessoas vão atrás dessas conversas. Mas está comprovado, pela mudança no perfil, com diminuição de casos e internações, que isso se deve à vacinação.”
Sandra Knudsen reitera que a discussão sobre a eficiência da vacina é a mesma das demais. “ Obviamente não é 100%, como qualquer outra, porque o resultado sempre vai depender da resposta do organismo a essa vacina e assim é com qualquer medicação. Mas a proteção é muito boa, tanto que quem não se vacina, tem um risco 10 vezes maior de morrer pela doença”, alertou.
Mobilização
A preocupação também é da Prefeitura e por isso a mobilização foi intensificada nas últimas semanas. “A busca ativa está acontecendo, voltamos em locais em que disponibilizamos a primeira dose por várias vezes, como na comunidade Rainha, na Coronel Brito, e na Santa Ana do bairro Santa Tecla. E disponibilizamos mais o turno da noite das 17h às 21h no Gressler”, destacou a vice-prefeita, Izaura Landim.
Além disso, Centro de Operações de Emergência (COE) junto com a Secretaria de Saúde, orientou os clubes, como a Assoeva, por exemplo, para verificar a carteira de vacinação na entrada de jogos. “Que tenha uma dose no prazo e, quem estiver na data de fazer a segunda fora do prazo, não entra. Empresas também foram orientadas em solicitar pelo menos uma dose da vacina”, disse Izaura. Segundo ela, nas tabacaleiras, por exemplo, a sugestão é de que as indústrias, para enviar as tradicionais ‘cartas de retorno’ para a safra seguinte, estabeleçam como primeiro critério a comprovação da vacinação.
“Esses bolsões de pessoas não vacinadas podem continuar mantendo o coronavírus circulando entre nós. Isso é o que a gente mais teme, que esse vírus sofra mutações, surjam as variantes e daí sim talvez escapem de forma mais efetiva da vacina e volte a ter aumento de casos e mortalidade.”
SANDRA KNUDSEN – Médica infectologista
Incentivo
A preocupação com essa indiferença de algumas pessoas motivou uma reunião há alguns dias entre Prefeitura e Câmara de Comércio, Indústria e Serviços de Venâncio Aires (Caciva). O Município não tem uma estimativa exata de quem seriam os ‘faltosos’ na fila Covid, mas na cidade os relatos é de que muitos estão dentro de empresas.
“A palavra é conscientização. A sociedade precisa estar consciente da necessidade da vacinação. Se temos doses disponíveis, temos que fazer. Só nos sentiremos mais tranquilos quando todos estiverem vacinados”, destacou o presidente da Caciva, Vilmar de Oliveira.
Embora já houvesse uma boa adesão dos setores empresariais, a entidade orientou novamente os associados para campanhas internas. Muitas empresas já vêm realizando um trabalho de incentivo com os funcionários há mais tempo, como é o caso da Móveis Gottems.
“Desde o início a orientação foi de ir vacinar, no mesmo tom que pedíamos para se cuidarem. Estávamos aguardando a evolução das faixas etárias, já que um grande percentual de nossos colaboradores são abaixo de 30 anos. Nos próximos dias iremos fazer o levantamento e buscar orientar os que ainda não se vacinaram”, comentou o empresário Rogério Gottems.
Nessa mesma linha foi o trabalho dentro da Haas Madeiras, que emprega 200 pessoas. “Nós acompanhamos primeiro os grupos de risco, encaminhávamos as pessoas e verificávamos se tinham feito. Agora com as idades, não tivemos a alternativa de a Prefeitura vir para vacinar todos de uma vez, então orientamos internamente quando as doses estão disponíveis”, explicou o diretor, Júnior Haas. Segundo ele, cerca de 60% dos funcionários já estão imunizados.
A infectologista, Sandra Knudsen, também ressaltou a importância da influência. “É preciso contar com a ajuda de toda comunidade e campanhas e orientações são feitas. Se os empresários estimularem seus funcionários e quanto mais pessoas tivermos incentivando, trabalhando em prol que a vacina é a única medida capaz de controlar, mais sucesso vamos ter.”
Empregador pode exigir vacina dos funcionários
A vacina também levanta o debate sobre a obrigatoriedade. Na esfera trabalhista, a dúvida é se o empregador pode exigir a vacinação do trabalhador e quais as consequências em caso de recusa. O Supremo Tribunal Federal (STF) firmou, no fim de 2020, o posicionamento no sentido de que o Estado pode exigir da população a vacinação compulsória.
Na prática, significa que a pessoa está sujeita a uma punição, caso não se vacine, porque o direito coletivo prevalece sobre o direito individual. A medida pode ser comparada com a obrigatoriedade do voto no Brasil: todos têm que votar, mas o governo não vai buscar as pessoas em casa, ou seja, não pode e não vai forçar uma pessoa a tomar a vacina.
Segundo a advogada Cláudia Dutra, por essa determinação é possível que o empregador exija que o funcionário se vacine. “Com a gravidade da situação e por se tratar de caso de saúde coletiva, o direito individual do empregado seria afastado e seria privilegiado o direito coletivo. Sendo assim, foram autorizadas medidas como aplicação de multas e o Estado poderá impedir o acesso a determinados lugares, como matrículas em escolas, por exemplo”, explicou.
Conforme a advogada Andressa Palludo, a recusa à vacina, simplesmente por convicção, ideologia ou crença religiosa, não seria suficiente, e o empregador poderia até dispensar o funcionário por justa causa. “Temos um artigo que diz que é dever do empregado se submeter às regras de saúde e segurança do trabalho, prevenção de doenças e acidentes adotadas pela empresa, inclusive utilizando os equipamentos de proteção individual que são fornecidos. Caso o empregado não utilize os equipamentos, não cumpra as regras de segurança, ele pode sim ser demitido por justa causa por essa recusa, que é considerada uma falta grave.”
Justificativa
Andressa Palludo explica ainda que para se recusar a tomar a vacina, o funcionário precisa justificar. “Caso o empregado se recuse a tomar a vacina, deverá apresentar uma justificativa plausível, como por exemplo, se ele tem uma alergia ou está dentro de um grupo vulnerável a um dos componentes da vacina. Ou seja, que ele apresente um laudo médico que demonstre um risco de morte ao tomar a vacina.”
Ao mesmo tempo, o empregado também precisa ter sua segurança garantida. “O empregado pode até se recusar a trabalhar se o empregador não adotar todas as medidas de prevenção. Um exemplo seria um caixa do supermercado que não tenha aquela proteção de acrílico, então o trabalhador pode se recusar a trabalhar sim”, completou a advogada Cláudia Dutra.