Com a chegada do plantio da safra de verão, os agricultores se organizam para enfrentar um problema. É que neste ano, o custo dos insumos assusta e até se fala em falta de itens no mercado. Em Vila Teresinha, Paulo e Rodrigo Hermann, 53 e 28 anos, respectivamente, já começaram a fazer as contas dos custos de produção por hectare.
Pai e filho apostam nos grãos há 15 anos. Na safra de inverno, plantaram 170 hectares de trigo. Nas culturas de verão, são 120 hectares de milho já semeados e, em outubro, inicia o plantio da soja. Neste ano, eles pretendem plantar 600 hectares entre safra e safrinha.
Segundo Rodrigo, ao finalizar uma safra, inicia a negociação da próxima. “A gente já negociou e comprou algumas coisas antes, mas ainda não recebemos tudo. As sementes, por exemplo, chegam dias antes de irem para a lavoura, mas ainda não fizemos ideia do valor que vamos pagar. Falam que será mais caro”, comenta.
Como eles já plantaram todo o milho ainda em agosto, itens de adubação e fertilizantes estão estocados no galpão. “A adubação subiu bastante. A lavoura de milho hoje é uma das mais caras, pois usa-se muita adubação e ureia, os itens com valores mais elevados”, diz o jovem produtor.
Nesta safra, os Hermann estimam que o custo de produção por hectare na lavoura de milho tenha aumentado mais de 40%. Na soja, eles estimam um aumento de 30% por hectare. “Hoje a gente tem um controle preventivo na lavoura, então ficamos acompanhando para evitar possíveis novas doenças que possam surgir. Assim, aumentam os custos da lavoura e, além disso, precisamos considerar o aumento do óleo diesel. Somando tudo, a conta é grande”, frisa Paulo.
O plantio da soja deve iniciar em outubro e pai e filho já se preocupam com a alta nos químicos. “O glifosato agora já dobrou o preço. O mais difícil é que se tu for comprar, não encontra. E isso está acontecendo com mais itens que utilizamos na lavoura”, complementa o agricultor.
“Tem itens que não adianta colocar menos na lavoura, como por exemplo a proporção de adubo e ureia. A terra não vai te responder da mesma forma, não tem como poupar. Fizemos investimentos altos para arriscar e a terra não responder da mesma forma com o rendimento da cultura. Mas os custos de produção aumentaram de uma forma assustadora nesta safra.”
PAULO HERMANN
Produtor rural
“Grãos são os mais impactados”, afirma engenheiro agrônomo
A alta dos insumos afeta todo o setor agrícola, mas conforme o chefe do escritório local da Emater/RS-Ascar, Vicente Fin, algumas culturas estão sendo mais impactadas. “O aumento não é proporcional entre as culturas, mas o milho tem alta demanda de fertilizantes e defensivos, por isso, é a que lidera o ranking”, diz.
Segundo Fin, depois da cultura do milho, a soja fica em segundo lugar, o arroz em terceiro e o tabaco em quarto. “As sementes subiram, mas não foi um ‘boom’ como outros itens. Os fertilizantes e defensivos são os que mais pesam no bolso do produtor”, ressalta.
Uma série de motivos leva a entender esse aumento considerável nos itens agrícolas. “A demanda mundial por fertilizantes aumentou, e nós dependemos da importação. Muitos países aumentaram sua produção, e essa grande demanda tencionou os preços internacionais e o dólar mais alto ajuda a contribuir para o aumento, ainda mais”, esclarece.
Além disso, outro item precisa ser considerado, segundo o engenheiro agrônomo da Emater. “O transporte subiu, estamos com custos elevados nos combustíveis e o diesel também impacta diretamente no custo de produção do agricultor.”
De acordo com a professora Mirian Fabiane Dickel Strate, do curso Técnico em Agronegócio da Univates, a agricultura brasileira baseada em monoculturas se tornou totalmente dependente das corporações que produzem insumos como os fertilizantes e sementes. “O Brasil importa 80% do NPK [Nitrogênio (N), Fósforo (P) e Potássio (K)] que consome, e o mesmo ocorre com as sementes, que viraram propriedade de grandes indústrias”, explica.
Aumento nos alimentos
A professora detalha que com a alta da taxa de câmbio, os preços sobem, além do fenômeno do ‘boom’ das comodities, soja e milho, que influencia no valor. “Insumos, como fertilizantes, sementes e produtos agrícolas viraram alvo de especulação financeira. Todas estas variáveis impactam fortemente a agricultura familiar e também os consumidores, pois o preço dos insumos, será repassado ao preço dos alimentos, no final da cadeia de produção”, afirma.
Com esse aumento de preços, Mirian explica que os custos de produção sobem, fazendo com que reduza ainda mais a margem da lucratividade da agricultura familiar, que aposta na produção de grãos, como também aqueles que estão integrados às cadeias de produção, como bovinocultura de leite, aves e suínos, já que o preço dos insumos é repassado ao preço das rações.
“Considerando todos estes fatores, é importante, mais do que nunca, estimular a produção de frutas, legumes e verduras, que está em queda acentuada no Rio Grande do Sul, nos últimos anos, comprometendo a segurança alimentar, das famílias urbanas com menor poder aquisitivo.”
De acordo com a professora, a diversificação das propriedades aumenta a autonomia das famílias e possibilita novas oportunidades de geração de renda. “Neste sentido, políticas públicas de incentivo à diversificação da produção, de construção de canais curtos de comercialização, aproximando agricultores e consumidores, apoio aos guardiões de sementes que detém bancos genéticos ancestrais, de variedades muito mais resilientes, no cenário de mudanças climáticas que se aproxima seria uma alternativa”, pontua Mirian.