Esperança e reintegração na Casa de Abrigo

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Com capacidade para 12 pessoas, a Casa de Abrigo de Venâncio Aires – antigamente conhecida como Albergue Municipal – está em seu quinto ano de atuação e exerce papel essencial na sociedade. O principal foco do local é acolher indivíduos em situação de rua e de extrema pobreza, entre 18 e 59 anos, oferecendo duas refeições (jantar e café da manhã), água, luz e banho, todos os dias, entre as 19h e 7h.

De acordo com a secretária municipal de Habitação e Desenvolvimento Social, Claidir Kerkhoff Trindade, o objetivo não é apenas oferecer banho e comida aos usuários do serviço. “Trabalhamos com uma equipe técnica para tirar eles da rua. Encaminhamos para empregos e redes de atendimento de saúde”, diz.

O acompanhamento é feito, inicialmente, com técnicos de Serviço Social e Psicologia do Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas). Como os perfis são variados, a primeira ação é identificar a população em situação de rua, estabelecendo quem será acolhido ou não. Eles passam por uma entrevista, em qualquer dia e hora, na qual também são orientados sobre o funcionamento do albergue e, na secretaria, é realizado um controle e são repassadas as regras de funcionamento da casa.

Intuito é acolher da melhor forma possível e tirar os indivíduos da situação de rua. (Foto: Leonardo Pereira)

Regras

São três regras principais: não pode entrar bêbado ou drogado; não pode fazer uso de drogas ou álcool dentro do local; e, obrigatoriamente, é preciso tomar banho. A secretária Claidir destaca que os principais problemas se referem a chegar no local embriagado e a negativa quanto ao banho. “Nossos monitores estão preparados para cuidar deles, alimentar, dar banho e, posteriormente, deixar dormir. Mas os demais problemas não é com eles, e quando um ser humano não quer, temos que entender”, frisa.

O local conta com uma média de seis pessoas por noite. Por ano, são pelo menos 64 pessoas atendidas. Conforme a titular da Secretaria de Habitação e Desenvolvimento Social, são em torno de 30 pessoas cadastradas em Venâncio Aires em situação de extrema pobreza ou de rua. “Infelizmente, não aceitamos mulheres. Porém, em alguns casos, onde vai marido e mulher, temos um quarto específico para receber. E, na sexta-feira, tem um trabalho em grupo, com psicólogos, no qual cada um relata a sua semana”, detalha Claidir.

No Creas

O psicólogo do Creas, Luiz Carlos Teixeira Bohrer, explica que, após a pessoa ser acolhida, existe um protocolo que pede para que os mesmos participarem de um grupo, que se reúne todas as sextas-feiras, das 7h30min às 8h30min, disponível para qualquer pessoa em situação de rua. “Discutimos condições pertinentes da situação de rua, dependência química, problemas de saúde, familiares e outros assuntos. Após esse momento, fazemos entrevistas individuais e eles têm esse compromisso para renovar a permanência na casa”, enfatiza Bohrer.

Esse compromisso de renovação é uma estratégia para que seja possível acompanhar os movimentos dos usuários da Casa de Abrigo, se estão conseguindo dar conta do que foi planejado ou se é necessário reformular o planejamento. De acordo com Bohrer, aproximadamente 90% dos que buscam o atendimento têm o intuito de superar a situação de rua. Os demais são andarilhos, que passam uma ou duas noites em Venâncio e seguem para outras cidades. “Nosso trabalho é de acompanhamento para ajudá-los a superar essa situação. Quem tem maior dificuldade, realizamos um trabalho para limitar possíveis riscos e dar uma condição melhor em comparação à que chegaram”, esclarece.

“O objetivo é que eles se sintam acolhidos pelo serviço público, para se sentirem menos inseguros. Porém, sempre buscamos o potencial para reverter a situação, mas muitos não acreditam e se acham incapazes de sair desta situação.”

LUIZ CARLOS TEIXEIRA BOHRER

Psicólogo do Creas

O Creas trabalha em um tripé: família, saúde e emprego. Estes temas são explorados desde as primeiras entrevistas. Por exemplo, ao questionar se existe a possibilidade de contar com uma mãe ou familiar para acolhê-los, no qual é sugerido uma mediação. “Porém, às vezes as pessoas não querem buscar essa ligação, aí respeitamos”, destaca o psicólogo.

As demandas de saúde são encaminhadas ao Centro de Atendimento Psicossocial (Caps). Quando o assunto é emprego, existe uma relação estreita com o Sistema Nacional do Emprego (Sine) de Venâncio Aires, na tentativa de recolocá-los no mercado de trabalho. Bohrer ainda comenta que a maioria tem alguma atividade: desde serventes de pedreiro até catadores de material reciclável. “Buscamos ver se eles têm o Cadastro Único para receber o Auxílio Brasil. Boa parte deles tem direito e é importante para a sobrevivência”, frisa.

“Com muita dedicação, é feito um trabalho para reinseri-los no mercado de trabalho e junto à família. Isso tudo para que, daqui a pouco, eles consigam uma pensão ou um apartamento para que se tornem independentes novamente.”

CLAIDIR KERKHOFF TRINDADE

Secretária de Habitação e Desenvolvimento Social

São realizadas algumas abordagens sociais, por parte do Creas e da Secretaria de Habitação e Desenvolvimento Social, em praças, rodoviárias e locais que são pontos comuns frequentados por moradores de rua. Sempre no primeiro horário da manhã, a abordagem tem o intuito de acolher e explicar a função da casa.

A rotina dos monitores

Dois monitores dividem as funções na Casa de Abrigo. Ademir Maciel é um deles e explica que o maior problema é quando eles chegam alcoolizados e começam a brigar. “Queremos que todos interajam, mas a maior dificuldade é não receber eles nesse estado.”

Ele diz que, por vezes, os indivíduos não cumprem os horários ou a regra de não chegarem alcoolizados. “Das 19h às 20h, o portão está aberto. Sugerimos para eles não beberem antes de vir, pois abre a possibilidade de discussão, na qual sempre tentamos tranquilizá-los. Mas eles não querem mudar, então acabamos acolhendo, dependendo do caso”, cita Maciel.

Mesmo com chuva e frio, alguns optam por não ir para a casa por conta da regra do banho. “É pelo grau de depressão que estão, já se acostumaram com a rotina. Para eles, é normal, não sentem o cheiro que estão ou nem percebem a forma como se vestem”, frisa.

“Acredito que não tem como deixar o sujeito na rua em uma noite fria. Mesmo que esteja alcoolizado, preciso deixar ele entrar. O nosso trabalho é ajudar, não podemos ver essa situação e ficar parados.”

ADEMIR MACIEL

Monitor da Casa de Abrigo

Saiba mais

1 A Casa de Abrigo (Albergue Municipal) foi inaugurada em 2017 e está localizada na rua Júlio de Castilhos, número 1.409, no Centro de Venâncio Aires. Tem capacidade para abrigar 12 pessoas.

2 Somente homens podem permanecer no local. Mulheres e crianças desemparadas recebem um quarto separado e, assim que possível, são encaminhadas para outros locais, como casas alugadas. O local funciona das 19h às 7h, limitando a entrada de pessoas até as 20h.



Leonardo Pereira

Leonardo Pereira

Natural de Vila Mariante, no interior de Venâncio Aires, jornalista formado na Universidade de Santa Cruz do Sul e repórter do jornal Folha do Mate desde 2022.

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