A última quinta-feira, 8 de setembro, ficará marcada para sempre na história mundial. Pois neste dia sombrio e chuvoso no interior da Escócia, a monarca mais longeva da história britânica, rainha Elizabeth II, faleceu aos 96 anos no castelo de Balmoral, sua residência de verão. Durante a tarde de quinta-feira os britânicos foram surpreendidos com o anúncio oficial da assesoria de imprensa da família real alertando sobre a fragilidade do estado de saúde da Rainha. Num clicar de mouse, a mensagem foi espalhada mundo afora.
O Parlamento Britânico foi interrompido bruscamente para alertar os membros da casa, enquanto discutia a proposta da recém-empossada primeira-ministra, Liz Truss, sobre o auxílio financeiro a famílias carentes para ajudar com a conta de luz e gás no próximo inverno. Rapidamente os apresentadores da rede de televisão britânica BBC apareceram vestindo terno e gravata preta, iniciando a cobertura ao vivo do palácio de Buckingham, no centro de Londres, castelo de Windsor, residência oficial da realeza, e de Balmoral.
Defronte o palácio da rainha uma pequena placa avisava os turistas que a tradicional cerimônia da troca da guarda, e que acontece em dias alternados, havia sido cancelada. Cada pedacinho de informação e imagem nos levava a acreditar no inacreditável: a eterna Rainha tinha nos deixado. E quando o anúncio oficial da sua morte veio, no início da noite, a nação inteira já chorava a grande perda.
O reinado de Elizabeth define a história moderna da nação britânica. Durante sete décadas ela foi uma figura onipresente na vida da maioria dos britânicos. A monarca se encontra em cada canto do país, em cada cidadão residente no Reino Unido. Nos últimos vinte e oito anos, morando na Inglaterra, eu também convivi com a presença constante da rainha Elizabeth. Sua figura é contemplada diariamente, em todas cédulas da moeda britânica. Ao mandar uma carta pelos Correios, novamente nos deparamos com a rainha, seja no selo ou nas caixas postais vermelhas. Ela estampa também o passaporte britânico e por onde viajamos sua figura nos acompanha. Todos ministérios, instituições oficiais, forças armadas, marinha e forças aéreas carregam seu símbolo. Estamos rodeados pela sua presença figurativa. E agora temos que nos acostumar com a ausência física da Lilibet, seu apelido de criança.
A rainha Elizabeth dedicou sua vida aos serviços da monarquia britânica e neste ano de 2022 comemorou com toda a nação seu Jubileu de Platina. Em junho passado a nação inteira celebrou seus 70 anos de reinado com um feriadão especial, de quinta a domingo. A monarca, no entanto, já demonstrava na época algumas limitações de mobilidade vinculadas à senilidade. Ela presenciou poucos eventos deixando para a ala jovem da família real os discursos e longas sessões de apresentações. Nestas sete décadas de reinado histórico o mundo todo testemunhou uma era de avanços incríveis. Mas talvez o maior de todos, para a eterna rainha, foi o avanço da dignidade humana. A rainha Elizabeth ascendeu ao trono quando o muro de Berlin sequer tinha sido construído e Stalin era ainda o ditador soviético. Ela sempre manteve a unidade de sua nação, com respeito e humildade.
Não foi fácil para mim escrever essa coluna de hoje com meu coração entristecido. Embora atualmente seja britânica naturalizada, eu desde que cheguei em Londres lá nos anos 90, sempre cultivei grande admiração pela história britânica e pela família real. Assistia, anualmente, ao tradicional discurso de Natal da Rainha na BBC junto com os outros milhões de ingleses. Adoro os rituais inerentes às cerimônias da coroa britânica. E sempre gostei de visitar os castelos e palácios da realeza. Muitos destes passeios eu retratei aqui na coluna. De certa forma, meu coração brasileiro é também inglês, e por isso me permito a compartilhar o luto da nação britânica. God Save the Queen – Deus, salve a Rainha.