Num cantinho do norte da Europa, à beira do mar Báltico, encontram-se três repúblicas: Estônia, Letônia e Lituânia. Estas pequenas nações são consideradas jovens pela sua independência pois até 1990 faziam parte da União Soviética; no entanto são países com história que remonta a muitos séculos, bem antes de o Brasil ser descoberto. São repúblicas com passado riquíssimo caracterizadas por ocupações múltiplas e principalmente pelo domínio do Império Russo durante um século. A Letônia e Estônia fazem fronteira com o território russo e possuem um vínculo maior com a cultura dos vizinhos e onde pelo menos 20% da população fala russo. Estes três países compartilham várias tradições culturais assim como a culinária apresenta pratos semelhantes. O temor de uma possível invasão dos vizinhos russos é também compartilhado pela população de cada república.
As festividades em torno das estações do ano são similares e remetem ao tempos pagãos. Os povos bálticos aproveitam cada minuto do verão curto e ensolarado pois sabem que o inverno é longo e gelado. A beleza do outono por aqui é estonteante e para quem não acredita no poder na natureza em transformar nossas vidas, convido a visitar os países bálticos. O inverno é, sim, rigoroso e pardo no entanto as mudanças de estação são sempre certeiras, como o dia e a noite. Sabemos que depois de viver a espera prolongada pelos dias de verão poderemos curtir o sol na tez por algumas semanas na primavera, viver intensamente as noites claras até a meia-noite e em seguida nos deslumbrar com as cores do outono. Eu adoro as estações bem definidas daqui.
A chegada do outono por aqui é acolhida com mudanças no cotidiano dos letãos. O espetáculo de cores alaranjadas é uma espécie de luz que a alma absorve para ser usada mais adiante, nos meses de dezembro, janeiro e fevereiro, quando os dias escurecem antes das 3 horas da tarde. Se no resto da Europa o outono chega de mansinho, e se prolonga durante quase três meses, por aqui, nos países bálticos, a estação das folhas secas é efêmera, com mudança climática arrepiante. Num piscar de olhos, a pujança verdejante dos parques se veste de tons profundos e nos deparamos com temperaturas noturnas abaixo de zero! De maneira repentina os dias perdem aquele brilho celestial tão comum durante as longas jornadas de verão. O resplendor das paisagens tingidas pelas folhas e gramados alaranjados contagia a todos e pelas ruas vemos gente encasacada.
As pessoas curtem os últimos respingos de sol ao ar livre, caminhando pelas ruelas do centro histórico e à beira do canal em Riga. Na última semana, em poucos dias, os arvoredos verdejantes da estação do calor se transformaram num tapete dourado na capital da Letônia. No interior do país, os lagos cintilantes que há algumas semanas refrescavam a população, agora refletem com solitude o colorido desmedido do outono. O solzinho manso de outubro aparece de vez em quando, com aquela luz baixa que eu adoro e que acaricia o rosto. À noite, entretanto, o ventinho gelado assobia silenciosamente, trazendo os primeiros sinais do inverno que bate à porta. Caminhando pelos parques a sensação é de gratidão, reverenciando a natureza em profunda transformação. O outono é tempo de introspecção por aqui. É tempo de desapego e despedida da vida frenética do verão. Um brinde ao outono mágico dos países bálticos!