De acordo com a Pesquisa Nacional de Saúde de 2020, mais da metade dos adultos tem excesso de peso (60,3%), o que representa 96 milhões de brasileiros. Definida pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como uma doença crônica, a obesidade tem aumentado em todas as faixas etárias nas últimas quatro décadas e representa um grande problema de saúde pública no mundo.
Em Venâncio Aires, os números também chamam atenção, seja na procura por acompanhamento nutricional da rede básica ou de quem já aguarda pela cirurgia bariátrica – são 78 pessoas na fila. A nutricionista Gabriela Barchet, que atua desde 2015 na rede pública de saúde do município, destaca que, nos últimos sete anos, 13 pacientes foram operados via Sistema Único de Saúde (SUS).
“De 2017 para cá, são 61 pessoas que já passaram pela primeira consulta e poderiam ser operadas, mas ainda não foram chamadas. Além disso, há três esperando pela primeira consulta e outras 14 estão na fila, mas não temos informação atualizada sobre elas”, comentou Gabriela.
A profissional diz que, em 2022, as primeiras consultas (todas feitas no Hospital Universitário de Canoas, onde também ocorrem as cirurgias), têm andado mais rápido, mas o chamamento por retornos ou diretamente a cirurgia, segue demorando. O assunto, aliás, já foi levado à 13ª Coordenadoria Regional de Saúde. “Além do que está ao nosso alcance, que é o acompanhamento na rede básica, o relato dos municípios da região é o mesmo: quando chegam lá [Canoas], não são chamados. O contrato com o hospital lá não é com os municípios e sim com o Estado. Então, o Estado tem que cobrar para ter uma proporcionalidade para todos”, salientou o secretário de Saúde, Tiago Quintana.
Critérios e acompanhamento
Gabriela Barchet explica que a bariátrica é o último recurso para quem não consegue emagrecer com reeducação alimentar, exercícios e outro tratamento e que, para ser validado para a cirurgia, critérios são considerados. “São levados em conta o IMC [índice de massa corporal] e outros critérios determinados em portarias do Ministério da Saúde. Muitas vezes, o paciente já vem com esse encaminhamento, mas, de qualquer forma, tudo passa por aqui”, destacou a nutricionista, se referindo à Unidade Básica de Saúde do bairro Cruzeiro, próxima à Unidade de Pronto Atendimento (UPA), que é a referência no atendimento nutricional, assim como o Centro de Especialidades Médicas.
“A primeira consulta sempre será com um médico, como cardiologista ou clínico geral, por exemplo. Aí ele encaminha para acompanhamento nutricional. Mesmo que vá para a cirurgia bariátrica e todas as consultas aconteçam em Canoas, em Venâncio o paciente, se quiser, segue tendo todo acompanhamento, inclusive de psicólogo”, destacou Gabriela.
Mesmo com essa possibilidade, a nutricionista diz que muitos pacientes não aderem ao tratamento. “Dos que estão na fila, cerca de 15 têm vindo nas consultas municipais. Então, a adesão ao tratamento é baixa e há muitas faltas, mesmo que a gente tente encaixar horários e ter nutricionista e psicólogo juntos no dia da consulta.”
Caminho para a cirurgia
Depois do encaminhando na UBS Cruzeiro ou no Centro de Especialidades Médicos, validando a bariátrica, o paciente leva os documentos na Secretaria de Saúde, que encaminha para a 13ª Coordenadoria Regional de Saúde. “A coordenadoria avisa da primeira consulta. Depois, todos os retornos para novas consultas, exames e a bariátrica, são diretamente com o hospital, em Canoas”, informou Gabriela.
Ela detalha ainda que, durante dois anos após a operação, o hospital faz o acompanhamento direto e, depois disso, o paciente volta a ser referenciado na rede básica do Município. A cirurgia é custeada pelo Estado e, à Prefeitura, cabe o transporte até a Região Metropolitana.
Falta de informações
• Gabriela Barchet diz que, recentemente, tentou contato com 14 pessoas que aparecem na fila para bariátrica desde 2015, mas não conseguiu falar com elas. Ou seja, não há informações se desistiram ou se fizeram a cirurgia de forma particular, mas oficialmente todas seguem na fila.
• Devido a essa falta de informações, a nutricionista pede para todos os pacientes manterem os números de telefone atualizados ou procurem se informar diretamente.
• “Como depois da primeira consulta tudo fica concentrado em Canoas, dificilmente o hospital de lá vai fazer essa busca ativa como fazemos em Venâncio. Então as pessoas precisam ficar atentas.”
“Obesidade vem aumentando e doenças associadas também”
Na rede básica de saúde de Venâncio Aires, um número chama atenção em 2022: entre todos os adultos entre 18 e 60 anos que procuraram alguma unidade de saúde, seja para qualquer tipo de atendimento, 69% têm problemas com a balança – 32% com sobrepeso e 37% são obesas.
“Esse número é muito alto e mostra como a obesidade tem aumentado nos últimos anos”, considerou a nutricionista Gabriela Barchet. Os dados são computados no Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (Sisvan) do Ministério da Saúde.
Para a profissional, a doença gera sim uma preocupação na saúde pública, porque acaba desencadeando outros problemas que precisam ser tratados. “Aumentam junto as doenças associadas, como diabetes, hipertensão, dislipidemia [colesterol e triglicerídios altos] e problemas articulares. Com isso aumenta muito a demanda por medicamentos contínuos e cresce a necessidade de exames. A obesidade é uma doença crônica séria.”
Gabriela relata que, atualmente, a faixa etária entre 30 e 40 anos é uma das mais impactadas pela obesidade e que as mulheres são as que mais procuram por tratamento. “As mulheres tradicionalmente se cuidam mais e tem o fator da estética. Mas muitas também se preocupam com a questão da fertilidade”, explicou a nutricionista.
Serviços
Além de Gabriela, outras duas nutricionistas atendem na rede básica, sendo que uma delas é específica para grávidas e crianças, junto ao posto de saúde Central. Apesar de ter o serviço nutricional e psicológico, a Secretaria de Saúde lamenta que não há uma grande adesão. “Já provoquei os residentes do ESF Coronel Brito e vamos fazer um encontro nas próximas semanas para discutir ações do Saúde na Escola quanto à obesidade. Há programas disponíveis, mas a adesão é complicada e poucos usam”, avalia o secretário, Tiago Quintana.