Ainda na sexta-feira, 22, o Supremo Tribunal Federal (STF), composto por ministros indicados pelos presidentes de República, tomou mais uma decisão polêmica que é contestada pelo Congresso Nacional, composto por deputados e senadores eleitos pelo voto popular. O STF formou maioria derrubado a tese do marco temporal para demarcação de terras indígenas, referendado pelo mesmo STF em 2009, determinando que os indígenas poderiam requerer terras que ocupavam até outubro de 1988, quando da aprovação da Constituição. Agora o STF voltou atrás. E assim, os indígenas poderiam requerer demarcação de terras não ocupadas até 1988, criando uma insegurança jurídica de propriedades privadas no país. No entendimento leigo, os índios poderiam requerer todas as terras que os brancos ocuparam a partir do descobrimento, em 1.500. Mas a Câmara dos Deputados já tinha aprovado a validade do marco temporal e agora na quarta, 27, o Senado também aprovou, contrariando orientação do governo e a decisão do STF.
O STF também indica formação de maioria pela liberação do aborto no Brasil, a começar pelo voto da presidente Rosa Weber, que se despede da corte. Hoje é permitido o aborto em casos de estupro, gravidez com risco de vida para a gestante e em casos de anencefalia (feto sem cérebro). A decisão do STF, se confirmado o indicativo, contraria a grande maioria dos brasileiros e invade competência do Congresso Nacional, eleito pelo voto popular para criar e aprovar leis.

Com maioria de ministros indicados por Lula e Dilma, o STF mexe em pautas de interesse do governo de esquerda, que teriam dificuldade de passar pelo Congresso. Além do marco temporal e a liberação do aborto, o STF já aprovou a volta da cobrança obrigatória do imposto sindical e se encaminha para aprovar a liberação de drogas no país, todos temas que contrariam a maioria da população, mas que são de interesse do governo Lula, atendendo a esquerda mais radical.
O entendimento leigo é que o STF, a mais alta corte da justiça brasileira, sempre foi a última instância para recursos judiciais, mas o que se presencia é uma corte inicial, que acusa, prende, julga e condena, atropelando os ritos judiciais e o Congresso, como no 8 de janeiro.
Recorri ao amigo Ricardo Hermany, doutor em direito, para definir as funções do STF e o seu entendimento do momento que vivemos.
“O STF tem como principal função a salvaguarda da interpretação constitucional. Assim, existem dois caminhos: o controle concentrado de constitucionalidade basicamente pelas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) enquanto se discute a adequação de uma lei a Constituição. Outro caminho é a via recursal nos casos concretos, quando a matéria chega a corte por meio do recurso extraordinário.
Mas a matéria constitucional não é a atribuição exclusiva. Existem matérias de competência originária do STF de natureza criminal. Isso se observou na conhecida ação penal 470 do Mensalão, onde assumiu destaque o então ministro Joaquim Barbosa. Agora o STF definiu sua competência nos atos de 8 de janeiro, de sorte que de suas decisões caberá recurso junto ao próprio tribunal o que acaba por limitar a estratégia defensiva. A principal crítica que tem sido realizada nos últimos dias refere-se a inclusão do julgamento dos réus de 8 de janeiro em plenário virtual com sustentação oral gravada. A Ordem dos Advogados tem se manifestado por meio de sua Comissão de Prerrogativas – presidida pelo gaúcho Ricardo Breier – contra esta limitação na atuação dos advogados. Pede que todos sejam julgados em plenário presencial ou ao menos telepresencial (ao vivo) sem gravação. Esse tema da OAB continua atual. E vai gerar bastante repercussão ainda. Não dá pra condenar 270 pessoas em plenário virtual com sustentação oral gravada”, avalia Hermany.