Ao longo desta semana, o embaixador do Brasil no Panamá, Carlos Henrique Moojen de Abreu e Silva, irá liderar reuniões, em um hotel no centro da Cidade do Panamá, onde recepcionará uma comitiva de lideranças brasileiras e a imprensa gaúcha, que tiveram pedido de credenciamento negado para participar da 10ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco. O objetivo destes encontros é atualizar deputados, secretário de Estado e representantes da cadeia produtiva do tabaco sobre os temas e posições do Brasil no evento internacional. A COP 10 iniciou na segunda-feira, 5, e segue até sábado, no capital panamenha.
Desde terça-feira, 6, declarações do discurso oficial do Brasil na COP 10 são alvo de questionamentos da comitiva de lideranças do setor e parlamentares. O grupo cobra a falta de transparência e clareza nas manifestações. O discurso, de cerca de três minutos e lido em inglês, resumiu a posição do Brasil como um das partes signatárias do primeiro tratado mundial de saúde pública da história da OMS. O embaixador disse que o texto, encaminhado pelo Itamaraty, foi elaborado a partir das reuniões da Comissão Nacional para a Implementação da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco (Conicq).
ÁREA PLANTADA
Um dos pontos mais questionados se refere à área plantada de tabaco. Diante das dúvidas das lideranças, Abreu e Silva afirmou que ocorreu uma má interpretação do trecho que cita que “o Brasil leva em consideração a diminuição em áreas cultivadas no número de famílias envolvidas na produção de tabaco” e garantiu que a redução não é uma política de governo.” Essa redução, conforme o texto, é resultado da diminuição na demanda mundial de tabaco. A manifestação ainda destaca que, diante desse contexto, o Brasil busca alternativas econômicas viáveis e sustentáveis para os produtores de tabaco.
O encontro contou com a participação da secretária-executiva da Conicq, Vera Costa e Silva, que afirmou que a redução de área plantada não faz parte do tratado. “O Brasil não teria assinado o tratado se tivesse essa condição”, salientou. A médica ainda observou que embora as políticas de diversificação sejam debatidas no evento, o Brasil ingressou no tratado com uma “linguagem mais branda” e “não há nenhuma posição do Brasil sobre produção”, garantiu.
“Ainda não encontramos nada que substituísse a renda do tabaco na totalidade. Nos preocupa muito esse colapso social que pode ser causado com qualquer medida que venha a ser aprovada.”
RONALDO SANTINI – Secretário de Desenvolvimento Rural do RS
Durante o discurso na COP, o embaixador também afirmou que a Reforma Tributária aprovada pelo Congresso Nacional cria uma “oportunidade única para o controle do tabaco”, o que foi criticado pelos representantes do setor, que temem o aumento de impostos sobre os cigarros e o crescimento dos produtos contrabandeados.
ELETRÔNICOS
A consulta pública da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) sobre a regulamentação dos Dispositivos Eletrônicos para Fumar (DEFs), que está aberta até esta sexta-feira, 9, também foi mencionada no discurso. Essa decisão caberá ao colegiado da Anvisa, que deverá analisar as contribuições encaminhadas e votar. Uma resolução nacional, aprovada em 2009, proíbe atualmente a fabricação, comercialização, importação e propaganda destes equipamentos. O pronunciamento do diplomata ainda citou o artigo 18 da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco e a sugestão para que a indústria seja responsabilizada pelos danos ambientais causados pelo tabaco.
Em um documento entregue pelos deputados, ao final da primeira reunião com o embaixador brasileiro, a comitiva pede respostas claras para diferentes pontos destacados no discurso, como área plantada de tabaco, alternativas sustentáveis e se há eventual proposta para ampliar a carga tributária sobre os cigarros.
Insatisfação
Presidente do Sindicato Interestadual da Indústria do Tabaco (SindiTabaco), Iro Schünke disse que a declaração da delegação do Brasil sobre a redução de área plantada é um contrassenso aos números do setor. Ao avaliar o encontro, Schünke disse que apesar dos diversos questionamentos, não ficou satisfeito com as respostas. “Efetivamente, o discurso do embaixador foi extremamente negativo considerando a importância da cadeia produtiva do tabaco. Falar em redução de área, falar em aumento de tributos e sobre o meio ambiente, está totalmente na contramão daquilo que a cadeia produtiva do tabaco representa”, destacou. “Temos que considerar que, nos últimos oito anos, nós exportamos, em média, mais de 500 mil toneladas para o exterior. Isso quer dizer que há uma estabilidade na produção brasileira que gira em torno de 600 mil toneladas, pouco mais, pouco menos, depende do ano. Então, não está havendo uma redução”, afirmou.
O presidente da Câmara Setorial do Tabaco e vice-presidente da Associação dos Fumicultores do Brasil (Afubra), Romeu Schneider, definiu o discurso do Brasil na COP como uma decepção para o setor. “A frustração é bastante grande, porque a gente sabe perfeitamente que não consegue interferir e mudar nada daquilo que foi traçado para ser executado e está sendo executado”, lamentou.
Schneider também disse que a COP se “transformou numa verdadeira ditadura” e lamentou a falta de transparência. “Neste evento não está sendo colocado contraditório, e não se tem oportunidade de fazer isso enquanto cadeia produtiva do tabaco. Da produção até o final da comercialização e do consumo, teriam muitas opiniões e importantes sugestões que poderiam, com toda certeza, minimizar muitas dificuldades que estão sendo alegadas”, defendeu. Sobre a redução da área plantada, que foi um dos pontos mais questionados, após o discurso, o presidente da Câmara Setorial lembrou que embora tenha reduzido nos últimos anos o número de municípios produtores e de famílias envolvidas no plantio, a produtividade do tabaco cresceu. “Na última safra, inclusive, já temos uma área plantada maior em cerca de 10%”, observou.
O que foi dito sobre a negativa de acesso ao evento
Durante o encontro com representantes da delegação oficial do Brasil, intermediado pela embaixada, os deputados questionaram presencialmente os motivos para a falta de acesso ao evento internacional. Os parlamentares, que viajaram em missão oficial para representar a Assembleia Legislativa e Câmara dos Deputados, também questionaram a negativa de acesso da imprensa gaúcha.
Durante o encontro, a secretária-executiva da Conicq informou que a decisão é do secretariado da Convenção-Quadro, em âmbito internacional. Sobre os jornalistas, disse que o secretariado realizou um levantamento de informações sobre os veículos e profissionais que solicitaram inscrição e que, do Brasil, duas jornalistas tiveram credenciamento aprovado, dos veículos TV Record e Jota, um portal de notícias. “A COP tem regras e procedimentos. Sobre as credenciais, a gente fica sabendo depois.Não tenho essa interferência”, afirmou a secretária da Conicq, que já foi chefe do secretariado da Convenção-Quadro, em âmbito mundial. “Um jornalista de uma região produtora vai ser penalizado por escrever uma matéria do setor, por publicar um caderno especial sobre o agro gaúcho?”, rebateu o deputado Marcus Vinicius de Almeida (Progressistas).