Esta semana foi marcada por uma data bem especial para mim e minha família. No dia 11 de julho de 1994 eu embarcava numa viagem que transformaria minha vida. Com o coração partido, há 30 anos eu alçava vôo alto, literalmente, com destino a Londres. Era a primeira vez que saia do Brasil, sozinha, de mala e cuia, com a finalidade de estudar inglês. A terra da (então) Rainha me acolheu de braços abertos. Estudei, estudei muito. Aprendi inglês britânico. Viajei por toda Europa. E nunca mais voltei para morar na minha terrinha natal, em Venâncio Aires.
Há trinta anos eu assisti, em solo britânico, a seleção de futebol do Brasil conquistar o tetra na Copa do Mundo nos Estados Unidos. Uma final dramática contra a Itália, que só fez aumentar a saudade de casa. Comemorei a vitória a moda bem brasileira, em meio a outros conterrâneos, com foguetório, desfilando e buzinando pelas ruas londrinas. Ainda não sabia que os ingleses raramente fazem buzinaços para festejar conquistas. E menos ainda soltar foguetes! Essa lição veio mais tarde, depois de alguns meses convivendo com o jeito reservado dos ingleses.
Minha adaptação ao novo país foi rápida e fulminante. As semanas iniciais eram recheadas de experiências fascinantes, curtindo o verão pelos parques verdejantes de Londres. Durante os primeiros anos estudava e trabalhava de babá com a família Forster, no interior da Inglaterra. Sou eternamente grata por este período durante o qual alcancei proficiência na língua inglesa. Eu absorvia naturalmente o jeito de viver dos britânicos, por vezes excêntrico e bem mais formal que o estilo brasileiro.
Durante estas três décadas na Europa minha bagagem cultural extrapolou. Viajei. Viajei muito. Roteiros de trem maravilhosos, com a mochila nas costas e o mapa na mão desbravei quase todo continente. Conheci o leste europeu recém saído do regime comunista. Sem celular. Sem rede social. Hoje em dia parece difícil imaginar uma viagem sem estar conectado mas lá na década de 90 carregávamos guias de viagens, pesados, mas imprescindíveis para visitar diferentes países. Relatava cada aventura à família através de cartas, longos manuscritos que às vezes levavam semanas até chegar no Brasil. Lembro com carinho da ansiedade em mandar revelar os filmes de fotos. É claro que prefiro a era digital de hoje, no entanto aquela emoção de colocar o filme na máquina, sair sem rumo e depois esperar ansiosa pelas fotos, nunca mais se repetirá.
Após alguns anos morando e estudando na Inglaterra o destino quis que eu encontrasse aqui a minha alma gêmea, o amor da minha vida. Já estava maravilhada com o país e agora me apaixonava por um gentleman britânico. E assim casei com um inglês da gema e juntos construímos nossa família, abençoada por três filhos, Victoria, Patrick e Sophia. Meu esposo Simon é diplomata e por isso continuo até hoje viajando mundo afora. Embora nosso “canto” seja na Inglaterra, através do trabalho no Ministério das Relações Exteriores do Reino Unido já vivemos em vários países. E assim o aprendizado se torna contínuo, enriquecendo a alma a cada recomeço. Nas últimas três décadas tive o privilégio de morar em Roma, Paris, Tripoli, Minsk, Vilnius e atualmente estamos em Riga, capital da Letônia.
Morar longe da terrinha significa viver com saudade. Saudade dos meus pais, meus irmãos e amigos que aí deixei. Saudade do cheiro de casa, da comida, dos costumes locais. Em 1994 tomei a decisão mais importante da minha vida ainda que se naquele momento não me dava conta disso. O tempo nos ensina a aceitar e superar este vácuo pungente e nos ensina a viver com intensidade os momentos de reencontro com a família e amigos. Seja aqui na Europa ou em Venâncio Aires.