A coragem e o espírito solidário de salvar vidas rendeu ao sargento Josué de Oliveira Padilha e ao soldado Rodrigo Carnelosso a medalha Estrela do Reconhecimento Municipal. A honraria, proposta pela presidente da Câmara de Vereadores, Claidir Kerkhoff Trindade (Republicanos), foi concedida em solenidade realizada na noite de segunda-feira, 9, na Câmara de Vereadores. Os policiais militares se destacaram pelo salvamento de pessoas e animais durante a enchente de maio, a maior da história do Rio Grande do Sul.
Ao comentar a honraria, Claidir disse que os homenageados defenderam com risco da própria vida a segurança das pessoas e auxiliaram os socorristas e voluntários nos resgates à população de Venâncio Aires e cidades vizinhas, como Cruzeiro do Sul. “Em nosso município, estes bravos homens fizeram incursões a bordo de barcos nas localidades de Vila Mariante, Volta dos Freitas, Santa Mônica, Travessão Mariante, Cerrito, Picada Nova, Linha Castelhano, Linha Chafariz, Sanga Funda e Linha Taquari Mirim, auxiliando em inúmeros salvamentos e resgatando com bravura a população”, justificou.
Lotados na sede da 3ª Companhia de Venâncio Aires, o sargento Josué e o soldado Carnelosso, ao lado de um grande contingente do Corpo de Bombeiros Militar e voluntários que vieram de todas as partes do Brasil, trabalharam incansavelmente no resgate de pessoas e animais. Inúmeras foram as viagens de barco para resgatar vítimas, que em um primeiro momento preferiram ficar em suas casas, não acreditando que a enchente os atingiria, mas devido às cheias dos rios que inundaram praticamente todo o estado, começaram a correr risco de vida. “A força das águas e o fato de não sabermos muitas vezes por onde estávamos navegando, era sempre um risco a mais às nossas vidas e de quem estávamos salvando”, resumiu o soldado Carnelosso.
Risco de vida
Mas nenhum salvamento se comparou ao de uma mulher com deficiência, que residia com os pais, na localidade de Linha Lotes, em Cruzeiro do Sul. O soldado Carnelosso e o sargento Josué, com outros voluntários, já haviam retirado pessoas das suas casas naquela região, mas sabiam que havia um casal que não conseguiu sair e estava morto, dentro do imóvel. O que não sabiam é que havia mais uma pessoa naquela casa.
Isso foi no sábado, dia 4 de maio (seis dias depois do começo da enchente), por volta das 15h, quando o soldado Carnelosso e o sargento Josué, parados às margens da RSC-287, em Linha Picada Mariante, decidiram que os corpos daquele casal deveriam ser resgatados. Eles conversaram com Ubiratan Carini Castro, o Bira, que juntamente com os voluntários Leonardo Haas, Vanderlei Meireles e Daniel Schroeder, decidiram se arriscar e ir buscar os corpos. “Os bombeiros nos orientaram a não tentar cruzar o rio Taquari naquele momento, pois estava muito perigoso”, recorda Carnelosso.

Mas o instinto falou mais alto e eles decidiram ir. Em três embarcações, cada uma com duas pessoas, iniciaram o trajeto de 15 quilômetros. Carnelosso explica que eles tinham a localização, mas a navegação era muito difícil e eram obrigados a cruzar o rio Taquari.
Como barcos de 6 metros e motores de 15 hp, os policiais e voluntários iniciaram a viagem, que não foi nada fácil. “Fomos pelo rio, onde a força da correnteza era enorme, com imensos redemoinhos que surgiam do nada. Nunca tinha visto redemoinho daquele tamanho e não tinha como desviar, pois as vezes surgiam na frente do barco. Isso sem falar nas árvores e animais boiando. Teve uma hora que nos deparamos com um tanque de combustível, aqueles que os caminhões usam para transportar gasolina. Foi um momento muito tenso, mas desviamos e seguimos nossa missão. Foi coisa de arrepiar”, resumiu Carnelosso.
Hipotermia
O grupo estava distante cerca de 2 quilômetros da casa das vítimas quando se deparou com outra situação inusitada: a água estava baixando rapidamente, impossibilitando a navegação. Eles foram obrigados a abandonar os barcos e seguir a pé e em alguns pontos enfrentaram lama com até um metro de altura. Houve momentos em que foi necessário rastejar e um puxar o outro para seguir adiante.
Ao chegarem no povoado, a cena estava alterada devido à baixa da água e, então, foi necessário passar de casa em casa para tentar encontrar os corpos do casal. A noite se aproximava e o grupo estava quase desistindo das buscas, quando escutou uma voz, como se a pessoa estivesse conversando com alguém. “Nos aproximamos, mas a casa estava toda fechada. Então arrombamos a porta e nos deparamos com o casal morto, parcialmente encoberto pela água, e vimos que havia outra pessoa ao lado. Era a filha do casal, que conversava com os pais”, relembrou o soldado.
Ela estava em estado de hipotermia e imediatamente foi amparada. Os policiais lembraram que encontraram algumas peças de roupas e acolchoados secos, no sótão de uma casa próxima, e as buscaram para tentar aquecer a mulher.
Carnelosso lembra que naquele momento já estava escuro, começou a chover e o grupo não conseguiria sair de lá utilizando os meios que usaram para chegar. Foi então que o sargento Padilha entrou em contato com o pessoal que fazia resgates de helicóptero e, mesmo com a chuva forte, uma aeronave foi até o local e precisou fazer duas viagens para resgatar as vítimas e os socorristas. Todos foram deixados no Parque do Imigrante, em Lajeado, onde o helicóptero pousou, e depois receberam os atendimentos necessários.
“Naquele dia [do salvamento da mulher com deficiência], fomos orientados a não tentar cruzar o rio Taquari, pois estava muito perigoso. Mas não tínhamos outra opção e decidimos arriscar nossas vidas, pois tínhamos que ir até lá .”
RODRIGO CARNELOSSO
Soldado