Imagine um palácio luxuoso com mais de 25 aposentos decorados de maneira singular e opulenta e onde jovens diletantes setecentistas, filhos de aristocratas britânicos, se encontravam para debater fervorosamente assuntos políticos; além de divertir-se contando histórias das grandes viagens culturais da época. A mansão da família Dashwood é assim, plena de história e imaculada. Situado no meio de um parque gigantesco de muito verde no condado de Buckinghamshire a 40 km de Londres e adornado por jardins espetaculares, esta gema da arquitetura palladiana é um dos mais refinados e idiossincráticos palácios rurais da Inglaterra. Durante os anos de 1700 e 1800 a nobreza britânica vivia o auge do grande império e aventuras a outros territórios em busca de inspiração artística e filosófica eram comuns entre os jovens aristocratas. Nesta época foram construídos muitos palácios rurais requintados onde as famílias podiam receber amigos e convidados e assim ostentar a riqueza adquirida durante tais viagens como objetos de arte, porcelanas, quadros, estátuas, tapeçarias e móveis. Justamente entre 1740 e 1800 a mansão atual do parque de West Wycombe foi edificada no vilarejo de mesmo nome, esboçando distinta fachada colorida e com pórticos laterais inspirados em palacetes clássicos italianos.
O imponente palácio pode ser contemplado à distância, em cada canto do parque, devido à sua posição privilegiada bem no alto da colina e é considerado uma das construções mais teatrais e italianizadas da Inglaterra do século XVIII. A vista da parte frontal é um espetáculo natural formado por um carpete verde pontilhado de plantas trazidas de rincões distantes e árvores centenárias. A paisagem idílica remete a filmes de época, um verdadeiro apelo aos sentidos, com jardins recortados pelo lago em forma de cisne lembrando o estilo rococó. Pequenas pontes de pedra ligam os vastos gramados dando acesso a monumentos escondidos entre arbustos. A arquitetura clássica é muito bem retratada nos pequenos templos grego-romanos, alguns deles refletindo na água cintilante do lago.
Ao caminhar em torno do palácio rural, subindo e descendo morro, é impossível não se encantar pela natureza abundante , cheia de surpresas, com cenários divergentes que se revezam entre melancolia nas áreas sombreadas cobertas de vegetação silvestre, romantismo nas trilhas coloridas de florzinhas do campo e exuberância de cores na sacada de colunas duplas com vista para campos de plantação e iluminada pelo sol brilhante. O passeio desta semana foi em companhia dos meus pais, Asuir e Milita, que estão aqui conosco de férias curtindo os netos. Percorremos o parque sem ver o tempo passar alentados pelo resplendor da tradição britânica. Artefatos, estátuas, pontes, templos e monumentos espalhados campo afora são respingos históricos da nobreza britânica. O mais incrível de tudo é pensar que a mansão passou de geração à geração nos últimos séculos e continua até hoje sendo habitada pela família Dashwood embora a manutenção seja feita pela Fundação Nacional de Patrimônio Público (National Trust). Desde 1943 a propriedade foi doada à fundação para restauração e conservação. E assim a família mantem o direito de usufruir do patrimônio mas em contrapartida o parque fica aberto ao público durante alguns meses do ano e em julho e agosto são organizadas visitas guiadas no andar térreo do palácio.
Requinte e sofisticação no interior do palácio
O interior do palácio de West Wycombe é um dos mais refinados da Inglaterra.Durante nosso passeio desta semana fomos privilegiados com uma visita guiada de um dos historiadores da Fundação Nacional de Patrimônio Público contando a história da edificação e da família Dashwood. A mansão continua sendo usada como residência da nobre família e por isso a visitação é restrita ao andar térreo (dois salões e cinco aposentos) em dias específicos durante os meses de verão aqui.
Logo na chegada percebe-se a riqueza de detalhes no vasto hall de entrada do majestoso palácio permeado por elegantes colunas de mármore também presente na decoração das paredes. A impressão é de estar entrando num atrium romano, com teto alto e decorado por uma pintura copiada das Ruínas de Palmira na Síria, de Robert Wood e adornado por pequenas esculturas. A história da mansão segue uma narrativa de amor inspirada em afrescos italianos e estátuas da mitologia greco-romana. Em todos os cômodos a figura de Vênus, a deusa do amor e da beleza na mitologia romana, é destacada seja através de grandes estátuas de mármore, nas pinturas, detalhes nas lareiras, tapetes ou nos espelhos. Cada aposento relata cenas clássicas da mitologia grego-romana com reproduções de afrescos italianos e tapeçaria de seda belga como no “Banquete dos Deuses” e “O Triunfo de Baco e Ariadne”. A mobília requintada remete ao século XVIII exalando sofisticação e nobreza. Retratos antigos dos membros da família emolduram as paredes das salas de estar e jantar evocando o passado glorioso.
A mansão transpira originalidade e já serviu de cenários para vários filmes e seriados como Cranford, A Importância de Ser Ernesto, Downton Abbey entre tantos outros. Impossível não viajar no tempo ao visitar este belíssimo palácio. Impossível não se apaixonar por tanta história e tradição! Eu adoro o interior da Inglaterra pelos seus vilarejos pitorescos, pela tranquilidade dos campos bucólicos de ovelhinhas pastando, pelo charme das construções de outros séculos, pela história grandiosa dos magníficos palácios rurais e tanto mais! O interior da Inglaterra é pura inspiração!
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