Muito além de discutir a respeito da exposição das pessoas na mídia e de momentos íntimos, das críticas, julgamentos e todo um arsenal de conceitos morais que são inerentes ao assunto, precisamos falar sobre crimes virtuais.
Não é de hoje que a internet diminuiu fronteiras e melhorou a comunicação entre pessoas. E, no ato de aproximar pessoas, surgiu o famoso ‘manda nudes’!
Ocorre que ao enviar uma foto ou vídeo de um momento íntimo e/ou sem roupa para um(a) pretendente, entende-se que o emitente confia na pessoa que receberá tal conteúdo. Na maioria de vezes, há a confiança de que aquele conteúdo será visto somente por quem recebe, bem como, muitas vezes, existe paixão/amor na relação, que aumenta a sensação de que os nudes continuarão sigilosos.
Assim, nessa áurea de confiança velada, os nudes tornaram-se populares também entre os adolescentes, fase essa que não se mede consequências, que se vive como se não houvesse amanhã, como se nada de ruim pudesse ocorrer.
Contudo, o ato de enviar uma foto ou vídeo em momento íntimo pode trazer consigo um risco muito grande dessas pessoas se tornarem vítimas de cibercrimes.
De tal maneira que o pior acontece, se quebra a confiança daquele que recebeu o material de cunho íntimo e repassa-se para demais pessoas (caiu na net) ou essa mesma pessoa é vítima de um hacker e tais fotos/vídeos vazam na internet.
Não há como mensurar a violação da dignidade de uma pessoa e o efeito danoso que isso pode acarretar na sua vida, posto que uma vez vazado o conteúdo íntimo na internet, torna-se muito difícil interromper sua propagação.
Por conseguinte, as vítimas são tomadas por sentimentos de culpa, com registros de transtornos físicos e psicológicos. Inclusive, com tentativas de suicídio. O foco acaba sendo a pessoa exposta e não quem divulgou o conteúdo.

Nota-se que os casos de sexting (divulgação de conteúdos eróticos com a ajuda da tecnologia de celulares e computadores) vitimiza, na maioria dos casos, mulheres. No entanto, não pode ser considerado um problema de gênero. Qualquer pessoa torna-se vulnerável.
Deste modo, ao se falar de crimes no meio digital, cabe alertar que as pessoas que compartilham fotos e vídeos de conteúdo íntimo/sexual, agora também podem ser vítimas de uma nova modalidade criminosa: a sextorsão, cujo termo é a união da palavra sexo com a palavra extorsão.
A sextorsão é uma forma de chantagem online, fazendo que uma pessoa se sinta constrangida à prática sexual ou pornográfica registrada em foto ou vídeo para envio, em troca da manutenção do sigilo de seus nudes, armazenados por aquele que faz a ameaça.
Por sua vez, embora o estupro virtual não esteja expressamente previsto no Código Penal, o caso poderia ser enquadrado no artigo 213 do CP, que prevê o crime de estupro. Os estudiosos que seguem essa tese entendem que a vítima foi constrangida a praticar ato libidinoso (em si mesma), mesmo sem contato físico entre vítima e agente, em autoria indireta, mediante coação moral irresistível.
Como é de praxe, tal entendimento possui defensores e opositores no âmbito jurídico. Contudo, o debate está lançado, haja vista que a sociedade apresenta problemas que até então leis não estavam preparadas para solucionar.
Sobre punição, incumbe registrar que o autor da divulgação indevida pode responder por difamação ou injúria, como descrevem os artigos 139 e 140, ambos do Código Penal. Além da possibilidade de suportar uma ação indenizatória, na esfera civil.
Ademais, se a vítima for criança ou adolescente, o artigo 241-A do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) define como crime grave a disponibilização, transmissão, distribuição, publicação ou divulgação de fotos, gravações ou imagens de crianças ou adolescentes em situação de sexo explícito ou pornográfica.
Agora, se o ofensor invadir dispositivo eletrônico (celular ou computador, por exemplo) de forma indevida, responderá pelos crimes dispostos na Lei nº 12.737/12, apelidada de ‘Carolina Dieckmann’, após essa atriz ter seu computador hackeado e suas fotos íntimas divulgadas.
Portanto, o que fica evidente é o perigo real de se enviar nudes, uma vez que a pessoa que está enviando material de cunho sexual ou íntimo poderá além de ser vítima de ofensa moral, sextorsão e estupro virtual.
Caso haja qualquer ameaça de vazamento de foto/vídeo íntimo, extorsão ou constrangimento a realizar ato sexual em razão de conteúdo já compartilhado, denuncie esse fato na Delegacia de Polícia ou mediante canais disponíveis na internet.
Cabe compartilhar também que o site Safernet auxilia vítimas de crimes digitais que tenham suas fotos vazadas. A chamada ‘helpline’ funciona como uma rede de auxílio que pode ser acessada via e-mail ou chat no site oficial.
Esse canal conta com especialistas que auxiliam vítimas que estejam passando por situações como humilhações, chantagem, tentativa de violência sexual ou exposição forçada em fotos ou filmes sensuais.
Fique atento, caso haja qualquer afronta já citada, mesmo que iminente, avise o ofensor que possui conhecimento da situação e que denunciará às autoridades policiais competentes. Não se esqueça de fazer um ‘print’ da conversa, o que servirá de prova.
Lembre-se, tudo o que é feito na web deixa rastros e não há como se esconder na impunidade e covardia do anonimato.
Em tempo, se você entende que o ‘nude é um direito de afirmação do corpo e resistência ao conservadorismo, tenha consciência da escolha de publicar e de como terá controle do seu direito à privacidade. Nenhuma forma de exposição será totalmente segura e sem algum risco.
Por fim, se você for vítima de qualquer ameaça, ofensa real ou conheça alguém em situação de perigo, denuncie, não se cale. A internet não é terra de ninguém, logo, a dignidade e o direito de privacidade devem ser preservados e o ofensor, punido.