Feminicídio: por que os homens agridem e matam as mulheres?

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“Ela disse que ia sair e eu disse que ‘eu’ era o marido e que não era assim que se resolvia um casamento. Ela estava com um barbante porque estava costurando um vestido aí eu peguei o mesmo barbante, dei uma braçada e passei no pescoço dela e disse ‘veja se isso é bom’. O relato é parte do depoimento de Joaquim Pereira da Silva, 47 anos, suspeito de acabar o casamento de 25 anos ao matar a mulher, em janeiro de 2018, em São Paulo. A vítima é Susan Alan Mendonça, 43 anos.

Um ano antes, em Biguaçu, Santa Catarina, o entregador de lanches Isac da Costa, 32 anos, confessa que matou por ciúmes, pois disse que passou a ter uma convivência conturbada depois que a mulher começou a frequentar a academia. Em 2015, a suposta traição vista no celular da policial militar Larissa Santos Velasco, 21 anos, teria sido o motivo confesso para Gleizer Nunes Velasco, 27 anos, ter matado a esposa em São Paulo.

Em Venâncio Aires, em 2018, o único feminicídio do ano foi de Iris Louveir Fortes de Campos, morta pelo marido Ruy Jorge de Borba, que se suicidou, em seguida. Testemunhas contaram que o casal estava separado, mas que havia a intenção de Borba em reatar a união.

Nos primeiros dias do ano novo, o rompimento de um relacionamento entre um casal foi a motivação de um homicídio. Por ciúmes, Lucas Anael Soares Camargo, 24 anos, matou o atual namorado de sua ex-companheira Michele Cardoso Ebrussi. Wagner Henrique Pereira, 25 anos, foi morto a facadas.

As motivações nos depoimentos citados pelos homens suspeitos ou condenados por prática de homicídio, estão vinculadas a sentimentos de posse, ciúmes, sexualidade e machismo. Os dados elevam o Brasil ao status de 5º país no mundo em mortes violentas de mulheres. São 13 por dia.

Foto: Jaqueline Caríssimi / Folha do MateAs mãos que agridem são as mesmas que acariciam
As mãos que agridem são as mesmas que acariciam

POR QUE AGRIDEM E MATAM?“Possessão seria a palavra. Pelo sentimento de posse que transgride o relacionamento sadio e de respeito”, responde a psicóloga Márcia Preuss, que há 18 anos atua no Posto Policial de Atendimento à Mulher (PPAM), junto à Delegacia de Polícia de Venâncio Aires.

De acordo com ela, o relacionamento homem e mulher está, ainda, alicerçado na cultura patriarcal segunda a qual o homem é dono e tem posse sobre a mulher. Márcia aponta os motivos de agressão como um somatório de cultura e comportamento. “Assim como mata no relacionamento, esta mesma pessoa é passível de matar no trânsito ou em qualquer outra situação, pois não vai saber tolerar qualquer tipo de frustração”, explica. Segundo a psicóloga, se a pessoa tem predisposição de transtorno de personalidade para a violência, em qualquer intolerância ou frustração, a tendência é transgredir para o crime.

“É uma questão transgeracional se observada pelo aspecto cultural, junto com uma associação de fatores e um deles, além da possessividade é o egocentrismo”, diz a também psicóloga da PPAM, Aneline Schneider Decker. Segundo ela, qualquer coisa que não gire em torno do homem agressor o desequilibra, torna-se uma ameaça e ele parte para agressão moral e física.

COMO IDENTIFICAR UM AGRESSORA partir das ações e experiências no Posto de Atendimento, as psicólogas traçam características comuns dos homens envolvidos em violência doméstica e que têm um perfil diferenciado. São pessoas que não têm tolerância à frustração; que têm predisposição por diversos fatores como, por exemplo, não saber lidar com problemas, com frustrações, com negações, com perdas e outra questões de forma saudável, sem agredir ao outro.

“Ninguém comete um crime no relacionamento se não tem estrutura de personalidade pré existente que vá mover este comportamento”, explica Márcia. Na característica comum do agressor, quase sempre as questões de desigualdade estão presentes: homem pode e ela (mulher) não. A dependência química é um facilitador da violência, mas não é a causa, explicam as profissionais. O álcool ou a droga facilita colocar em prática o que é da própria personalidade do agressor, o que já está pronto em sua estrutura de comportamento. Em relação ao homem vítima, dados dão conta que são casos isolados e raros, porém, a psicóloga Aneline ressalta que o que se caracteriza como o perfil do homem agressor se assemelha ao perfil da mulher agressora.

O PERFIL DAS AGREDIDASAssim como o homem agressor, a mulher vítima da agressão também tem um perfil definido: o mais forte deles é o da submissão. Márcia explica que, possivelmente, esta mulher foi testemunha de um relacionamento familiar de um pai violento e uma mãe submissa, ou modelos que a fizessem crescer de forma submissa ao negar a sua própria vontade em relação as suas opções. “É comum as mulheres terem autoestima fracassada e nem elas acreditam que possam ser sujeitos de direitos”, destaca a psicóloga.

Neste sentido, explica Márcia o papel da DDPPA busca que a mulher agredida consiga se reestruturar, sentindo-se capaz de ‘tocar’ a vida, contar com as pessoas próximas para que não precise viver neste ciclo de violência. “Pois esta naturalização de ser violentada, seja da forma como for com palavras, desmerecimento ou agressões não é normal, a mulher não precisa de violência”.

“O estopim da violência é uma associação de fatores culturais, transgeracionais e individual da personalidade. Podemos estar daqui 300 anos, se eu não ensinar para o meu filho como lidar com frustrações ele pode vir a ser um potencial agressor. São os pais que passam modelo para os filhos” MÁRCIA PREUSSPsicóloga da PPAM

ALERTA! SINAIS DE AGRESSOR • Falta de respeito de qualquer ordem e situação • Machismo • Eu (homem) posso e tu (mulher) não pode • Egocentrismo • Direitos diferenciados • Desconsideração do outro • Proibições • Possessividade • Forma violenta de resolver problemas

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