Um dos segmentos agrícolas que mais cresceu na última década em Venâncio Aires, viveu um 2022 de curva para baixo. A suinocultura no município fechou o ano passado com a entrega de 7,6 mil animais a menos para abate do que em 2021 e viu o Valor Bruto da Produção Agrícola (VBPA) também recuar entre os períodos – R$ 55,8 milhões para R$ 50,3 milhões.
De acordo com dados da Associação de Criadores de Suínos do Rio Grande do Sul (ACSURS), a Capital do Chimarrão entregou para abate 40.625 suínos em 2022, enquanto em 2021 foram 48.301. Essa diminuição passa pela redução no número de animais alojados nas propriedades rurais, prática apontada como estratégica por empresas integradoras para estabilizar setor, frente à mudança de cenário na produção e no consumo da carne no mercado internacional.
Em Venâncio Aires, conforme a Emater, são 85 famílias com produção particular e 29 integradas. Destas, 18 são associadas da Dália e a cooperativa foi uma das que decidiu reduzir o alojamento e, consequentemente, o abate. Integrante do Conselho de Administração da Dália e agricultor de Venâncio Aires, Marcelo Müller, lembra que o setor, no Brasil, teve seu auge em 2019, época em que a China enfrentou surtos de peste suína africana, o que devastou a produção de carne naquele país. “Houve abertura de mercados, grande exportação e valorização do produto. As empresas pensaram em ocupar esse espaço, mas como os chineses são muitos eficientes, logo recuperaram sua produção e aqui houve esse excesso de produto e também queda de preço e de remuneração ao produtor. Trouxe dificuldades para o produtor e para a indústria.”
Com isso, Müller explica que, no início de 2021, já percebendo que viriam dificuldades, houve a decisão pela diminuição gradativa de alojamento. “Isso começou a ter efeitos em 2021 e maiores em 2022. A realidade dessa redução vai acontecer em 2023, onde vai se chegar ao nível máximo de redução que, no caso da Dália, será em torno de 33% totais.”
O conselheiro comentou ainda da dificuldade de logística no Rio Grande do Sul. “A alimentação é basicamente por concentrado e as fontes principais são milho e soja. O estado não é autossuficiente em produção de milho, o que leva ao alto custo. Outra dificuldade é que estamos longe dos centros de consumo, como Rio de Janeiro e São Paulo, além das questões tributárias que oneram o setor e causam dificuldade de competitividade, se comparado com Santa Catarina, Paraná e Centro-Oeste.”
Decisão fundamental
O presidente executivo da Dália, Carlos Alberto de Figueiredo Freitas, também falou das dificuldades com o alto custo de produção. Segundo ele, o impacto é extremamente forte, pois os grãos representam até 65% do custo de produção da suinocultura e do frango, os quais, nos últimos dois anos, tiveram acréscimo de 100% no preço.
“Os demais custos de produção da proteína animal também subiram entre 60% e 80% e a taxa Selic, de juros reais, subiu 400%, passando de 2,75% para 13,75%. Atualmente, o Brasil é o país com a maior taxa de juros real do mundo”, destacou.
Ainda, conforme o executivo, a decisão pela diminuição de animais alojados foi importante para buscar o equilíbrio. “A decisão foi fundamental, pois as empresas, em nível internacional, promoveram a redução da produção de proteína animal, seja carnes ou seus derivados, com o objetivo de buscar o necessário equilíbrio entre a oferta e a demanda de carnes.”
Sobre o futuro do setor, Freitas mencionou o atual cenário chinês, que novamente identificou focos de peste suína africana e deve voltar a importar carne suína brasileira. Mas, ele acrescenta que “o cenário de crescimento dependerá do retorno do equilíbrio entre a oferta de grãos e insumos para produção com custo compatível ao poder de compra do consumidor.”
Produtores estão preocupados com investimentos e instalações ociosas
Embora cientes da necessidade de diminuir o número de animais alojados, existe certa preocupação de produtores em Venâncio Aires. “A suinocultura no Brasil sempre teve seus altos e baixos, assim como as demais atividades agrícolas. Mas nunca foi tão crítica como está”, afirma Roberto Schwendler, produtor integrado e delegado da Dália em Venâncio Aires.
O agricultor tem 34 anos e a família trabalha com suínos há mais de 80 anos, sendo que a propriedade, em Linha Harmonia da Costa, é uma das mais antigas em terminação no município. Junto com a esposa, Danusa Osterreich, ele mantém três galpões com capacidade total de 540 porcos, os quais saem diretamente para o abate, em Encantado. “Em dezembro recebemos 509 animais e na última semana 474. Mas temos que entender o lado financeiro da cooperativa também, porque ela vai ressarcir essa parte que não será alojada, conforme o resultado do lote.”
O produtor também mencionou o cenário de oferta e demanda nos últimos anos. “O Brasil precisou diminuir a produção, mas Europa e Canadá também diminuíram. E aí precisamos considerar o custo de produção, que ficou muito alto. Não só no campo, a pandemia foi um grande problema para a indústria, já que faltou embalagem, faltou produto de limpeza. São vários fatores. Um comedouro, por exemplo, custava R$ 600 antes da pandemia e hoje custa R$ 1,5 mil.”
Sobre perspectivas, Schwendler acredita em melhora. “No início dos anos 2000, vivemos uma situação muito complicada também, então o cenário sempre oscila. Acredito que vai acontecer uma melhora sim, mas precisamos nos readequar à realidade para reequilibrar as coisas.”
500 a menos
Com a abertura de mercado em 2019, muitos produtores de suínos investiram na construção de mais chiqueirões. Mas, com a decisão de diminuição no número de animais alojados, existe agora a preocupação que parte dessa estrutura vai ficar ‘ociosa’. É o caso de Lauri Schwendler, morador de Linha Arroio Grande, que está no sistema integrado desde 2007. “A empresa [Dália] também tinha intenção de aumentar o frigorífico e precisava aumentar o número de vagas de suínos no campo. Nos escolheram e, como meus filhos vão ficar na propriedade, decidimos por fazer o investimento em 2021. Mas, agora, com essa redução, está bem complicado”, comentou o agricultor.
Segundo ele, seriam mais de 3,6 mil porcos que passariam pela propriedade por ano, mas, em 2022, já foram 500 animais a menos. “No meu caso está dando 50% a menos que recebo por suíno. Então acredito que o preço também influenciou nessa queda da comercialização”, mencionou, se referindo ao VBPA do ano passado.
Sobre isso, o presidente executivo da Dália, Carlos Alberto de Figueiredo Freitas, confirmou um auxílio aos produtores. “Espontaneamente, a Dália decidiu auxiliar financeiramente os associados, para compensar a ociosidade causada pela redução do alojamento, pelo período que for possível e necessário”, garantiu Freitas.

Apesar de queda, Venâncio é líder em produção no Vale do Rio Pardo
Embora tenha caído em relação a si próprio e dentro do ranking estadual quanto ao número de animais que foram para abate, Venâncio Aires ainda é o líder de produção de suínos no Vale do Rio Pardo. Segundo a Associação de Criadores de Suínos do Rio Grande do Sul (ACSURS), Venâncio ocupa a posição 96 no estado e entregou para abate 40.625 animais em 2022. O número corresponde a quase 60% do total de abates do Vale do Rio Pardo, que somou 68.307 animais.
Na região, destaque ainda para Mato Leitão, que aparece em segundo lugar, com 16.391 animais, e posição 162 no estado. Em terceiro ficou Boqueirão do Leão, com 7.701 abates e ocupando a 203ª posição no ranking gaúcho.
Ao analisar o cenário estadual, o presidente da ACSURS, Valdecir Folador, falou em estabilidade. “Acredito que 2023 entra num sistema de produção menos intensa do que vinha acontecendo, pelo ajuste que precisa passar pela demanda de mercado. Temos um parque industrial hoje no Rio Grande do Sul que está completo, com a produção que atende 100% da sua necessidade e ela não consegue crescer se não tiver capacidade de frigorífico para absorver essa produção.”
Folador destacou ainda que haverá ajustes, especialmente de melhoria interna das granjas, de produtividade e de busca de eficiência. “É o dinamismo e a necessidade dessa evolução constante na eficiência pelos custos também são muito altos. Você só consegue buscar baratear alguma questão desses custos de alimentação ou custos fixos, buscando melhorar a eficiência da produção da porteira para dentro. Porque da porteira para fora o mercado é quem dita as regras.”

Estado
Conforme dados da Associação de Criadores de Suínos do Rio Grande do Sul (ACSURS), na soma de todos os municípios gaúchos, foram produzidos 11.150.849 animais para abate em 2022, o que representa aumento de 5,64% em comparação a 2021.
As informações são da Secretaria da Agricultura, Pecuária e Desenvolvimento Rural, através da Seção de Epidemiologia e Estatística. Na relação, constam 315 municípios produtores e Rodeio Bonito segue na primeira colocação, pelo sexto ano consecutivo, com 254.054 suínos.
Do Vale do Taquari, entre os 20 primeiros colocados, estão os municípios de Capitão (138.612 abates e 14º lugar); Teutônia (136.938 animais e 15º lugar) e Arroio do Meio (129.446 abates e 18º lugar). O Vale do Taquari também é a maior região produtora, com 1.976.048 animais, representando 17,72% da produção do Rio Grande do Sul.
VBPA da suinocultura em Venâncio
• 2018 – R$ 25,7 milhões
• 2019 – R$ 28,3 milhões
• 2020 – R$ 42 milhões
• 2021 – R$ 55,8 milhões
• 2022 – R$ 50,3 milhões