Projeto de lei quer proibir a realização de rodeios no RS

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Nas últimas semanas, o projeto de lei que busca dar fim aos rodeios em território gaúcho gerou discussão, principalmente, entre as entidades tradicionalistas. Os eventos campeiros, além de cultuarem a tradição e história do estado, geram também oportunidades de emprego e renda. Somente em Venâncio Aires, durante a realização dos rodeios, são gerados em torno de R$ 400 mil de serviços terceirizados por ano.

No dia 4 de maio, o deputado estadual Rodrigo Maroni (PSDB) protocolou, na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, o projeto de lei 97/2022, que tem por objetivo proibir a realização de rodeios ou eventos similares que envolvem maus-tratos e crueldade contra os animais.

No mesmo dia, em suas redes sociais, o deputado Sérgio Turra (Progressistas), reagiu contra o projeto protocolado por Maroni. Turra afirmou que as atividades tradicionalistas possuem impacto econômico e social, geram renda, empregos, além de estimularem o turismo do estado. “O bom gaúcho zela pelos bons tratos aos animais. Para além das questões culturais e esportivas, os rodeios movimentam a economia das cidades”, afirmou.

Os parlamentares Mateus Wesp (PSDB), Juvir Costela (MDB), Luiz Marenco (PDT), Gaúcho da Geral (PSD), Ernani Polo (Progressistas) e Carlos Búrigo (MDB), em oposição ao projeto que proíbe os rodeios no estado, se reuniram e compareceram pilchados na Assembleia, na terça-feira, 10 de maio. “Vim de bota e bombacha para defender nossa tradição. Não vamos permitir que as mentiras de quem desconhece nossas atividades prevaleçam”, disse, em publicação nas redes sociais, o deputado Sérgio Turra.

Contra o projeto pelo fim dos rodeios, deputados compareceram pilchados à Assembleia Legislativa (Crédito: Divulgação Gabinete)

Em entrevista à Folha do Mate, Maroni afirmou que a finalidade do projeto de lei é tirar os animais das carroças e dos rodeios. Quando questionado sobre a manifestação dos demais deputados, após a apresentação do projeto, Maroni alegou que muitos têm medo eleitoral e são financiados pelo agronegócio. “Mas sabem que é maus-tratos”, acusou o deputado.
Segundo o deputado, esta é a primeira vez que o projeto foi protocolado na Assembleia Legislativa. Já no Senado Federal, um projeto com o mesmo objetivo foi apresentado em 2011, mas ficou em tramitação e não chegou a ser aprovado.

Maroni enfatizou que não presenciou e nem quer participar de rodeios, mas que vai passar a ir para fiscalizar. “Quero pegar de surpresa e gravar os maus-tratos”, afirmou o deputado. De acordo com ele, foi convidado por narradores de rodeios e tradicionalistas a frequentar os rodeios. “Eles mesmos reconhecem como maus-tratos, o próprio movimento tradicionalista sabe que é”, alegou Maroni. Ele ainda revelou que recebe em torno de 50 denúncias por semestre de maus-tratos a animais em rodeios.

O deputado Maroni afirmou que o MTG não contatou ele e, caso tentem um diálogo, ele está aberto a qualquer ‘negociação’ que tire os animais do rodeio, o evento pode continuar. “Rodeio com animais não é coisa de gaúcho, é coisa de americano e paulista, não tem nada a ver com a cultura do Rio Grande do Sul”, alegou.

“O debate é o seguinte: mantém os animais por dinheiro ou retira os animais por amor aos mesmos. Não tem lógica, a não ser econômica. A questão da cultura e tradição é mentira”, afirmou. Segundo Maroni, os rodeios no estado começaram em 1950, com rodeio de Barretos, que hoje atualmente chamam de ‘laço comprido’. Ele afirma que não tem nenhuma vinculação cultural a não ser que seja institucionalizado na cultura do gaúcho os maus-tratos a animais. “Essa parte não está contada nos livros de História, pelo menos, eu como historiador, em nenhum momento li.”

O projeto apresentado pelo deputado Rodrigo Maroni segue em pauta na Assembleia Legislativa. Foi para análise na Comissão de Constituição e Justiça, depois passa por mais uma comissão e posterior vai para a votação no plenário. De acordo com o deputado, o prazo estipulado de toda tramitação é de, no máximo, três meses.

RS tem mais de dois mil eventos campeiros

O gado e o cavalo auxiliaram na construção da história do Rio Grande do Sul. No contexto histórico, o laço é um legado dos índios e hoje, nos eventos campeiros, refletem o dia a dia do homem do campo. Há 70 anos, os rodeios tiveram origem na cidade de Esmeralda, no nordeste do estado e a partir de então se espalharam para todo o Rio Grande do Sul. Atualmente, os rodeios simbolizam não só o culto a tradição, mas também possuem grande significado social e econômico.

O vice-presidente campeiro do Movimento Tradicionalista Gaúcho (MTG), José Nicanor Castilhos de Oliveira, afirma que são realizados mais de dois mil eventos campeiros no Rio Grande do Sul. Ele ainda estima, modestamente, que os serviços terceirizados para a realização de rodeios movimentam mais de R$ 1.346.732 por ano – dados de 2012 da instituição.

Castilhos argumenta que o MTG possui um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) assinado com o Ministério Público sobre os cuidados aos animais, além disso, a entidade tem embasamento na Lei Estadual n° 12.567 de 13 de julho de 2006, que é complementar a Lei Federal n°10.519 de 17 de julho de 2002, a qual trata das normas de sanidade animal nos eventos campeiros. O MTG criou ainda o departamento de Bem Estar Animal, que está desenvolvendo uma cartilha relacionada ao assunto. Além do mais, todos os rodeios precisam ter médico veterinário responsável no local.

Diferente do que afirma Maroni, nos rodeios realizados no Rio Grande do Sul os animais não são derrubados. Aliás, o regulamento campeiro do MTG prevê punição ao laçador que maltratar o cavalo ou a rês. Na opinião do vice-presidente, o deputado não conhece a cultura gaúcha e a história do tiro de laço. “A maioria dos deputados são gaúchos e defendem os rodeios, portanto, imagino que não será aprovado o projeto de lei”, afirmou Castilhos.

Em Venâncio, rodeios geram mais de R$ 394 mil em emprego e renda

Das dez entidades tradicionalistas que possuem atividades campeiras em Venâncio Aires, oito realizaram rodeios ou festas campeiras neste último ano. A reportagem da Folha do Mate fez um levantamento dos serviços terceirizados nos rodeios realizados na Capital do Chimarrão, totalizando mais de R$ 394 mil de geração de emprego e renda, por ano.

O patrão do CTG Lenço Branco, Jonas Heinen, lamenta que o deputado Rodrigo Maroni não conheça o próprio estado que vive e “tenta enfraquecer um grande grupo provedor de empregos e renda”.

Já a patroa do CTG Chaleira Preta, Cátia Carvalho, afirmou que ficou surpresa ao ver a afirmação de Maroni que os bezerros são derrubados nos rodeios do Rio Grande do Sul. “Acho que o deputado em questão talvez desconheça nossos rodeios, pois no Sul não temos essas práticas”, destacou. Ela ainda assegurou que para a realização de um evento campeiro, a entidade deve cumprir muitas exigências, como local para água e trato do gado, número adequado de bovinos, conforme o tamanho aproximado do evento e veterinário responsável. “Penso ainda, que não reflete nossa realidade, onde nossa cultura é sobretudo de respeito, inclusive aos nossos animais”, afirmou a patroa.

Saiba mais:

Em dezembro de 2019, o presidente Jair Bolsonaro sancionou a lei 13.922, que estabelece o dia 4 de outubro como o Dia Nacional do Rodeio. A lei é oriunda do PLC108/2018, aprovado no Senado no início de outubro do mesmo ano. A data foi escolhida por ser mundialmente conhecida como o dia de São Francisco de Assis, padroeiro dos animais. Por essa razão, em 4 de outubro também se comemora o Dia dos Animais. (Fonte: Agência Senado)

Relembre:

  • Recentemente, em um rodeio de Venâncio Aires, ocorreu um caso de denúncia de maus-tratos a animais. A queixa foi feita pela ONG Amigo Bicho, que procurou a Secretaria de Meio Ambiente (Semma) de Venâncio Aires depois de receber fotos que supostamente mostram bovinos sendo maltratados durante um rodeio realizado em Linha Cerro dos Bois, em abril. O caso chegou, inclusive ao Conselho Municipal de Proteção Animal (Compa).
  • A ONG Amigo Bicho recebeu fotos e vídeos de uma pessoa que estava no local e divulgou, em suas redes sociais, as imagens com alguns animais caídos.
  • A entidade realizadora do rodeio, CTG Lenço Branco, emitiu uma nota esclarecendo que não compactua com as atitudes tomadas no manejo do gado durante o evento. “O aluguel do gado, bem como os serviços de mangueira (manejo do gado) são terceirizados, portanto, não se responsabiliza pelos vídeos que circulam nas redes sociais, uma vez que a comissão organizadora, juntamente com o veterinário responsável, avisou o proprietário do gado para que parasse de usar choques durante o manejo do gado assim que ficaram sabendo do uso”, afirma a publicação do CTG.
  • A ONG Amigo Bicho compartilhou a nota do CTG Lenço Branco, afirmando que ambas as entidades zelam pelo bem-estar animal e sempre estarão ao lado daqueles que não têm voz.
  • Em reunião do Compa, a qual participaram ainda fiscais do Município e o patrão do CTG, Jonas Heinen, o conselho decidiu pedir a responsabilização do proprietário do gado e do veterinário que acompanhava o manejo de animais – ambos contratados pela entidade.
  • O desfecho foi o envio de ofícios ao Conselho Regional de Medicina Veterinária, solicitando que apure a conduta do profissional durante as atividades, e ao Ministério Público (MP) e à Patrulha Ambiental (Patram) para que analisem as sanções em relação ao proprietário do gado. “No âmbito do conselho e órgãos municipais, entendemos que as medidas necessárias foram observadas. A análise das informações a respeito deste caso nos mostrou que foi um fato isolado, pois isso não acontece com frequência nos rodeios”, disse a presidente do Conselho, Kátia Diedrich.

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