Há cinco anos, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarava pandemia de Covid-19. Um momento crítico da humanidade e que será lembrado nos livros de História. Foram
777 milhões de infecções e mais de 7 milhões de mortes, sendo 20,9 mil casos e 159 mortes em Venâncio Aires. Cinco anos depois, a Folha do Mate lembra desse tempo que, para alguns, já parece longínquo, mas que causou consequências e trouxe novos hábitos. O que o coronavírus levou, o que ele ensinou e como ainda impacta na rotina.
A infectologista Sandra Knudsen, importante nome de Venâncio Aires na linha de frente contra a Covid-19, foi a maior referência médica no município durante a pandemia. Ao voltar cinco anos no tempo, a profissional entende que a ‘virada de chave’ foi o momento em que a população começou a ter anticorpos contra o vírus e, por isso, as vacinas foram fundamentais. “Quando se fala numa doença com potencial de gravidade tão grande como o coronavírus, é muito arriscado esperar que todos desenvolvam imunidade ativa [ter a doença]. Então as vacinas foram fundamentais. Elas nos deram essa imunidade para desenvolver anticorpos sem passar pelo risco da doença.”
Sandra revela que, mesmo com a experiência de mais de 20 anos como infectologista, não esperava vivenciar uma pandemia dessa gravidade em pleno 2020. “Hoje, com o conhecimento que se tem, é fácil olhar para trás e criticar. Mas no início não se sabia como esse vírus agia e como combatê-lo. O que a gente sabia é que era um vírus de transmissão respiratória, então se fez o que se podia num momento sem vacina e tratamento: medidas de prevenção de contato, para tentar diminuir o número de contaminações. Então foi muito importante o uso de máscaras, álcool em gel e distanciamento. A gente sabe que não era uma medida 100%, mas era o que se tinha no momento inicial.”
A médica teve Covid ainda antes das vacinas estarem disponíveis (a primeira dose foi aplicada em Venâncio em 19 de janeiro de 2021), felizmente sem gravidade. Ao falar do trabalho dos profissionais de saúde na linha frente, Sandra se disse orgulhosa.
“Acompanhei de perto o serviço em Venâncio e tenho muito orgulho do que se fez aqui. Tivemos um dos menores índices de mortalidade por número de habitantes do estado. Sei que as pessoas hoje podem criticar, mas opinar hoje, em relação àquela época, não é justo. Os profissionais de saúde também tiveram medo, mas se dispuseram a atender, enfrentar desconhecido e colocaram a própria saúde em risco.”
Ensinamentos para a vida
Em maio de 2023, a Organização Mundial da Saúde (OMS) anunciou a alteração no status da Covid, que deixou de ser classificada como emergência de saúde pública de interesse internacional. Embora o fim da pandemia não tenha sido declarado oficialmente, a transição já foi suficiente para repercutir positivamente. O vírus continua circulando, claro, mas hoje o número de casos é quase irrisório se comparado aos primeiros anos (veja box) e também não leva mais a situações tão graves ou internações. Em 2025, são sete casos até quinta, 13, em Venâncio, sendo o último notificado dia 4 de março. A última morte por complicações do coronavírus no município foi em agosto de 2024.
“Temos que lembrar que os vírus não vão desaparecer e novos vão surgir. Muitos têm essa forma de transmissão, que é o contato pelas mãos e vias respiratórias. Então alguns ensinamentos, como a higiene das mãos e o uso de máscaras, quando necessário, deveriam ficar o resto da nossa vida”, opina Sandra Knudsen. A médica também alerta que o Covid tem a capacidade de causar doenças e complicações em vários órgãos. “Está comprovado. Tem a chamada Covid longa, pessoas com sintomas por meses. E tem pessoas que percebem sequelas. Ele é muito além da parte respiratória.”
Médico e prefeito
O prefeito Jarbas da Rosa, que é médico, assumiu o primeiro mandato justamente no pior momento da pandemia, no início de 2021, quando os casos e as mortes dispararam em Venâncio Aires. Em muitas oportunidades, ele também foi para a linha de frente como profissional da saúde.
Jarbas lembra que foram muitas as dificuldades no início, porque pouco se sabia sobre ações e tratamentos. Mas, com o advento da vacina, ela foi o diferencial para diminuir os casos. “Foi uma nova realidade, tivemos que viver um ‘novo normal’, mas hoje é uma doença que se somou às demais e não tem mais aquela preocupação com se teve. Hoje a preocupação é com novas cepas, de outros vírus, que podem, no futuro, causar novas pandemias com potencial grande como foi o Covid.”
União de esforços no hospital durante a pandemia
O epicentro do tratamento e da recuperação da Covid-19 em Venâncio Aires foi o Hospital São Sebastião Mártir (HSSM). A casa de saúde ampliou a Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) para receber pacientes e os profissionais precisaram se dedicar exclusivamente. O administrador, Luís Fernando Siqueira, destaca as modificações estruturais nos períodos de pico da doença. Os leitos de UTI adulto (10), durante a pandemia passaram de 30, com as salas do Pronto Atendimento e de recuperação do bloco cirúrgico reformuladas para receber casos graves.
Onde hoje é a ala A, se manteve um espaço especial de isolamento para pacientes Covid. Atualmente, o HSSM mantém quatro leitos especiais de isolamento, mas, havendo a necessidade, leitos semiprivativos (com dois lugares) têm um deles bloqueado para uso isolado também. Em termos gerais de estrutura, basicamente se voltou ao que era antes da pandemia.
Uma das heranças positivas, segundo Siqueira, é a união de esforços. “Despertou o espírito de união para a cidade ficar mais forte, e isso foi visto novamente na grande enchente”, afirma. Ele cita o recebimento de torpedos de oxigênio por siderúrgicas, o empréstimo de carros da Prefeitura para busca de oxigênio em Porto Alegre, além do intercâmbio de medicamentos e materiais entre hospitais. Além disso, os profissionais de saúde receberam maior valorização depois do enfrentamento à pandemia. Siqueira destaca o envolvimento da sociedade médica, além dos funcionários da casa de saúde. “Não tinha dia e hora, essa é uma lembrança que emociona.”
Um movimento que marcou o administrador foi envolvimento de um grupo de empresários que, em quatro dias, reuniram R$ 600 mil, usados para adquirir respiradores. “Salvaram muitas vidas. Não é fácil encontrar isso em outros lugares, é importante saber que se precisar, podemos contar com as pessoas.” A empresa Alliance One doou dois respiradores por intermédio de lideranças políticas, e a Associação Médica de Venâncio Aires (Amva) doou um respirador de alto fluxo. “As pessoas que costuravam, traziam sacolas de máscaras até o hospital”, comenta.

Matéria assinada por Débora Kist e Luana Schweikart
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