Enquanto os venezuelanos Ender e Yesenia de Chacon aperfeiçoam o português, através do convívio diário com os venâncio-airenses, o casal descobre novos hábitos culturais de quem vive na Capital Nacional do Chimarrão, inclusive nas datas comemorativas, como a Páscoa. Quando a família chegou da Venezuela, por meio de um programa para refugiados, em maio de 2019, a Páscoa já havia passado, e eles não ficaram sabendo quais as tradições brasileiras e os hábitos característicos da região na data.
“Na sexta-feira Santa costumamos ir à igreja com a família mas, ainda não tínhamos visto esta tradição do coelho, dos chocolates, da decoração e dos ovos de Páscoa”, destaca Ender, que ficou bem surpreso quando viu a decoração de Páscoa nas ruas e praças da cidade e a tradicional árvore de Páscoa. “Quando vimos as árvores com galhos secos, decorada com ovos pintados ficamos sem saber o que acontecia”, recorda.
Quando começaram a frequentar a Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, eles descobriram o significado da árvore e do coelho. “Os galhos secos representam a morte de Cristo e os ovos coloridos a esperança, vida e ressurreição comemorada no domingo. Já o coelho, é símbolo da prosperidade”, explica. Com as informações ‘na ponta da língua’, eles já transmitiram esta curiosidade aos familiares que ficaram na Venezuela. “Liguei para a minha cunhada, que tem quatro netos, e contei do coelho e chocolates que são distribuídos às crianças na Páscoa e ela também ficou surpresa com esta atividade”, conta Yesenia, que é professora de Educação Especial e, durante a pandemia, trabalha em home office.
Tradições de Páscoa na Venezuela
Segundo Ender Daniel Chacon, 38 anos, em algumas regiões da Venezuela, as pessoas fazem o tradicional dulce de lechosa (doce feito com mamão verde, açúcar e cravo de cheiro) e o dulce buñuelo de yuca (bolinho frito, feito com mandioca e mel), consumidos na semana que antecede a Páscoa. Na sexta-feira Santa, eles costumam ir à igreja em família e mantêm o hábito de consumir peixe e carne de capivara. No Domingo de Ramos, uma semana antes da Páscoa, os venezuelanos também colocam ramos na porta de casa para atrair prosperidade ao lar, tradição que também é comum no Brasil. “Nunca fizemos nenhuma comemoração ou atividade no domingo de Páscoa”, afirma o venezuelano, formado em Gastronomia.
Uma Páscoa com sabor de chocolate
Por um tempo, o casal acolheu uma outra família de venezuelanos, vindos para Venâncio Aires por meio do programa de refugiados. Com interesses em comum, as duas famílias começaram a frequentar a Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias. Nesta semana, Yesenia de Chacon fez a entrega de chocolates às crianças, inclusive aos irmãos venezuelanos Sarai Valentina, 10 anos e Carlos Alonso Vallentilla Veloz, 6 anos, que também desconheciam esta tradição. O menino é portador de Glicogenose, tipo 3, e não pode consumir açúcar. Mesmo assim, o grupo da igreja se mobilizou para comprar chocolates sem açúcar para presenteá-lo. “Foi a primeira vez que ele pode compartilhar os chocolates com nós. Quando isso acontecia, ela tinha que comer uma outra coisa, de preferência um prato salgado, para não ficar olhando os outros”, comenta o pai das crianças, Walter Jose Vallenilla Mancilla, 35 anos, que veio para Venâncio Aires com as crianças e a esposa, Yerlin Del Carmen Veloz Rondon, 35 anos, em dezembro de 2019. “Eu gostei muito de comer chocolates, é muito gostoso”, afirma Carlos.

Sarai também adorou a surpresa e as tradições da cidade. “Para mim foi muito legal porque eu não conhecia a Páscoa. Meus colegas me falaram que os ovos eram escondidos na praça e eu fiquei emocionada e muito feliz. Eu já sabia que em alguns lugares se comemorava a Páscoa com ovos de chocolate, porque teve uma vez, que meus avós me trouxeram um da Austrália”, destaca a estudante da escola Estadual de Ensino Médio Monte das Tabocas. Além da simbologia da data, Sarai também aprendeu, durante as aulas on-line, que a Páscoa no hemisfério Norte é comemorada após a primavera, que inicia entre os dias 20 e 21 de março, algo bastante curioso para ela, sendo que, no norte da Venezuela não há estações do ano. “Há períodos de sol e chuva, mas não há uma definição, assim como no Brasil”, destaca Walter.
Impressão do repórter
Durante a entrevista, comentei com eles sobre o costume dos venâncio-airenses de fazer os ovos recheados com ‘cri-cri’ (amendoim) para entregar às crianças e, eles ficaram muito curiosos para conhecer esta tradição. Na minha cidade natal, em Dom Pedrito, também não é comum preparar os ovos com ‘cri-cri’, na Páscoa. Eu conheci através da família de meu pai, quando minhas tias, que moram aqui na região, nos presenteavam quando crianças com os ovinhos artesanais. Na região da fronteira, o amendoim preparado com a açúcar ou chocolate é chamado de carapinha.