Conheça a trajetória da artesã Laídes Ribeiro do Nascimento, 58 anos, moradora do bairro Morsch, em Venâncio Aires.
Quando senta para tricotar ou crochetar, a artesã Laídes Ribeiro do Nascimento, 58 anos, se encanta com as peças tomando forma, ponto a ponto. “Não gosto de marcar horário para parar. É como ler um livro e não querer parar para saber o fim da história. Vou me envolvendo tanto que não tenho vontade de parar. Sou apaixonada por artesanato”, define a moradora do bairro Morsch.
As mãos habilidosas dão formas às mais diversas peças: tapetes, trilhos de mesa, roupinhas para bebê, bolsas, blusas, vestidos, biquínis e saídas de praia, para citar alguns exemplos. “Tricô e crochê não têm limite. Dá para criar peças até onde a imaginação for”, considera a profissional, que é uma espécie de ‘designer de moda do tricô’ e desenvolve peças exclusivas para as clientes.
Trabalhar com artesanato é um sonho antigo de Neca, como é conhecida. A história dela com o tricô começou quando tinha apenas 16 anos, tendo como ‘professora’ Nair Nazário – para Neca, a maior referência no assunto. “Ela era fera. Não existe, nem na internet, alguém que faça tão bem quanto dona Nair”, afirma.
O que hoje é paixão e profissão começou de forma despretensiosa. Por 27 anos, Neca trabalhou como doméstica na casa do médico cardiologista Jorge Nazário, filho de Nair. Enquanto ela acompanhava as netas em visita à casa dos avós, Nair decidiu ensiná-la a tricotar.
“Eu tinha um mínimo conhecimento da época da escola, quando aprendi com as professoras, e a dona Nair se propôs a me ensinar. Ela era uma mulher que dava muitos conselhos, então não quis desapontá-la e decidi aprender. Sempre levava um dever de casa e fazia à noite. Na próxima visita ela conferia o trabalho. Às vezes tinha um ponto errado bem no início e ela abria toda a peça por causa daquele ponto”, relembra, entre risos. “Hoje sou tão exigente no artesanato devido o que aprendi com ela. Busco sempre a perfeição”, garante.
Casada há 33 anos com Luís César do Nascimento, 59 anos, e mãe de Jean do Nascimento, 32 anos, Neca já vendia as peças de artesanato há bastante tempo, como um complemento de renda. Depois de morar de aluguel, por um período, a família conseguiu construir a casa própria na rua Pedro Grünhauser, no bairro Morsch.
Desde o fim do ano passado, ela se dedica integralmente à confecção das peças, o que já era meta há bastante tempo, enquanto ainda atuava como doméstica. “Sonhava em trabalhar só com artesanato, e não sou de deixar sonhos pra trás”, resume. Hoje, a moradora do bairro Morsch tem clientes de vários cantos de Venâncio Aires, além de Santa Cruz e Porto Alegre.
Engana-se quem pensa que as metas de Neca foram todas alcançadas. “Ainda tenho muitos sonhos”. Um dos principais desejos é ter uma sala própria onde possa tirar do papel o Armazém do Artesanato – um espaço para comercializar não apenas os produtos dela mas também o artesanato de outras mulheres. “As mulheres necessitam muito este movimento de dar as mãos.”

Do incentivo das professoras à experiência em casas de família
Laídes Ribeiro do Nascimento é filha única de Cecília e Emanoel Ribeiro, já falecidos. Ela nasceu em Centro Linha Brasil e, aos 8 anos, mudou-se para a cidade, com a mãe. “Quando ainda morava no interior, sentava no morro e enxergava a cidade de lá. Sonhava em ser uma moça da cidade. Até hoje vou lá para recordar.”
Para Neca, cada pessoa se forma a partir de várias outras, que são páginas e capítulos na sua vida. Entre esses capítulos importantes da vida, ela cita as professoras da Escola Estadual de Ensino Fundamental Zilda de Brito Pereira, no bairro Gressler, onde estudou quando se mudou para a cidade. Enquanto a mãe trabalhava, muitas vezes as educadoras a levavam para casa delas no turno da tarde, para que ficasse em segurança. “Aprendi muita coisa com as professoras Dyamantina, Luzia e Lurdinha. Um dos maiores aprendizados da Dyamantina foi que eu deveria expôr minha opinião, que usando a educação, poderia chegar em qualquer pessoa e falar algo que não tinha gostado”, relembra, com carinho.
Quando tinha quase 15 anos, Neca iniciou a carreira como empregada doméstica, profissão da qual se orgulha. “Muita gente acredita que é simples cozinhar, lavar e passar, mas é preciso conhecimento. A cada tecido muda a forma de lavar, por exemplo. É necessário estar sempre se atualizando”, comenta.
Para ela, os 27 anos em que atuou na casa de Jorge e Lieda Nazário são um capítulo muito feliz e de grande aprendizado. “Sempre foi me dada muita confiança e acreditaram na minha capacidade. Sou muito grata por isso, no quanto contribuiu na minha formação, na minha vida”, ressalta ela, que também mantém um carinho especial pelas filhas do casal, Roberta, Raffaela e Bruna, para quem foi a ‘tata’, durante a infância e segue com uma relação próxima.
Quando encerrou o trabalho junto à família Nazário, a ideia já era se dedicar mais ao artesanato e com faxinas pontuais. No entanto, por convite da médica Sandra Silberschlag, ela iniciou o trabalho na casa da família, onde permaneceu por 16 anos, até o fim de 2024. No período, acompanhou o crescimento de Teodoro e a chegada das gêmeas Maria Rita e Maria Laura. “Foi uma ótima experiência, é uma família que gosto muito.”
Para Neca, a maior alegria da vida é ter perto dela cada ‘página’ da sua vida, sejam amigos, familiares ou membros das famílias com quem trabalhou por vários anos. “Ter essas pessoas perto de mim me faz pensar que procurei sempre ser um bom ser humano, com respeito e fé. Família não é só de sangue.” Nesse sentido, ela faz questão de mencionar, também, um grupo de amigas de longa data: As Baobás. “São amigas de uma vida toda, temos nosso momento de chimarrão, viagens. Estamos sempre juntas.”

Expectativa por ações no bairro
Desde que a família Nascimento se mudou para o bairro Morsch, em janeiro de 2002, muita coisa mudou. A estrada de chão foi pavimentada com paralelepípedo, mais residências e empresas foram construídas próximo ao local e houve diversas melhorias. O principal problema, segundo Laídes, está relacionado à enchente. No ano passado, pela primeira vez, a água invadiu a residência, chegando a 1,1 metro de altura. “É muito triste perder as coisas. Esperamos que realmente o Poder Público faça o que promete para evitar uma situação assim novamente.”