Pesquisa em cemitérios lança um olhar sobre a história de Venâncio

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Dos 57 cemitérios existentes em Venâncio Aires, 93% estão localizados no interior do município. O dado, apresentado no mês passado, em um estudo encomendado pela Prefeitura de Venâncio Aires e realizado pela Geothec Consultoria Ambiental Geologia e Topografia, sinaliza a importância dos cemitérios na área rural do município. A maior parte deles é administrada pela própria comunidade, que se mobiliza para garantir a preservação da história dos antepassados.

Com sepulturas centenárias, os cemitérios são considerados um patrimônio histórico e ajudam a conhecer mais sobre a colonização em Venâncio Aires. Em 2017, 20 cemitérios do interior foram objeto de estudo para o trabalho de conclusão de curso em História do professor Denis Puhl.

Em busca de patrimônios e fontes históricas materializadas, ele decidiu fazer uma releitura histórica de Venâncio Aires, por meio da exploração de epitáfios – frases escritas em túmulos, com a finalidade de homenagear a pessoa sepultada no local. “Os epitáfios eram uma constante entre os germânicos. Eles escolhiam frases que eram características de cada pessoa. Na maioria das vezes, eram textos sensíveis e tristes. Já os portugueses, colocavam no máximo um ‘Rogai por nós’”, observa.

A partir do projeto ‘Em busca de epitáfios: um roteiro pelos cemitérios do interior do município de Venâncio Aires’, Puhl fez um resgate das memórias da colonização na Capital Nacional do Chimarrão por meio de uma pesquisa de campo.

Segundo ele, mais de cem epitáfios foram encontrados durante a pesquisa e em torno de 35 foram traduzidos do alemão. “Muitos estavam deteriorados devido à erosão e ao descaso na manutenção dos túmulos, já que, em algumas localidades, não havia mais descendentes das pessoas que foram sepultadas no local”, relata. De acordo com Puhl, as lápides mais antigas contempladas no estudo – que continham epitáfios legíveis – foram encontradas no Cemitério Bohn, em Linha Bohn.

Em meio às sepulturas encontradas, Puhl pôde observar os diferentes locais de origem dos imigrantes que colonizaram o município. Para facilitar a tradução, realizada na maior parte pelo professor Altair Luís Bender, ele indicava o nome e sobrenome do falecido. “Os epitáfios continham vários dialetos, que variavam de acordo com cada região”, observa.
Segundo Puhl, os epitáfios mais antigos encontrados foram escritos em alemão gótico. Isso mudou após a Segunda Guerra Mundial, com o projeto de nacionalização. “Até 1942, as frases eram em alemão e, a partir de 1945, os epitáfios encontrados foram escritos em português”, destaca o professor, que, na maioria das vezes, pintava de giz as lápides para poder ler aquilo que estava escrito. Ele afirma que o maior número de epitáfios foi encontrado em Vila Terezinha.

Única lápide encontrada no Cemitério do Umbu, conhecido como Cemitério dos Pobres, em Linha Herval. (Foto:Denis Puhl/Divulgação)
Única lápide encontrada no Cemitério do Umbu, conhecido como Cemitério dos Pobres, em Linha Herval. (Foto:Denis Puhl/Divulgação)

Epitáfios

“Na vida foi amor, deixou a vida na infância. Lá no céu será um anjo, é o que nós temos esperança. Para seus pais e irmãos deixou saudades e lembranças.”
Cemitério Católico de Linha Herval

“Maior voo é aquele percorrido nos caminhos eterno do amor.”
Cemitério Católico Linha Herval

“Da infância foste um exemplo
Dos irmãos, um modelo,
Dos pais, uma glória,
Tua ausência é uma saudade
Mas o céu tens para a eternidade”
Cemitério Católico de Linha Herval

“Dormindo no Senhor!
Ó santa e calma paz!
O gozo do divino amor
Tua alma satisfaz.
Dorme em paz!”
Cemitério de Linha Maria Madalena

“Oração e trabalho foi na vida.
Descanse agora,
Coração amado
Até seres por Jesus chamado”
Cemitério Misto de Linha Santa Emília

Sobre a pesquisa

Em 2017, o professor de História Denis Puhl lecionava no Colégio Professor José de Oliveira Castilhos (Coopeva) e deixou a docência para realizar o trabalho. Acompanhado do pai (falecido há três anos), ele desenvolveu quatro roteiros para fazer a pesquisa de campo, em 20 cemitérios do interior de Venâncio.
Puhl, que também é publicitário, teve a ideia de unir as áreas de Publicidade e Propaganda e História, ao apresentar o projeto e disponibilizar um banco de dados, com fotos, entrevistas e conteúdo de pesquisa. Na plataforma digital epitafios.com.br é possível conferir 55 epitáfios que integraram a monografia. Atualmente, ele é professor do Colégio Gaspar Silveira Martins.

Curiosidades

  • Além da diversidade de epitáfios, vários aspectos chamaram a atenção do professor, entre eles, a segregação racial, étnica e social, o deterioramento físico, o abandono/descaso, a separação das sepulturas de crianças e recém-nascidos e a segregação religiosa – divisão de espaço entre católicos e evangélicos.
  • No cemitério Umbu, conhecido como Cemitério dos Pobres, em Linha Herval, Puhl teve que abrir a vegetação para descobrir onde estavam as sepulturas. “No Cemitério Umbu só havia uma lápide. As demais sepulturas foram identificadas com cruzes de madeira e metal, em meio ao inço”, conta.
  • No Cemitério de Guajuvira, em Vila Palanque, as crianças que morreram antes do batismo foram sepultadas separadas dos demais, pois não podiam ser enterradas em campo santo.
  • O professor de História também observa que a estrutura dos túmulos mudou muito nos últimos tempos. “Antigamente, os corpos eram colocados dentro de um caixão de madeira que era enterrado diretamente no chão e coberto com terra. Nos dias de hoje, o caixão é colocado dentro de uma estrutura de pedra”, conta.
  • Outra característica dos cemitérios mais antigos observada por Puhl são os locais destinados ao sepultamentos de crianças. “Em Linha Madalena, por exemplo, os túmulos dos adultos ficam separados dos túmulos das crianças, por questão de aproveitamento de espaço”, destaca. Já no Cemitério dos Morenos, em Linha Brasil, os indigentes foram sepultados fora do cemitério.
  • A separação de católicos e evangélicos também está presente em algumas localidades. Em Vila Terezinha, os túmulos dos católicos foram construídos de costas para os evangélicos. Segundo o professor de História, no centro, há uma cruz que faz a separação das duas áreas. Da mesma forma, no Cemitério São José, de Linha Estância Nova, também há esta separação, assim como em Santa Emília, onde um muro de pedras separa os túmulos de acordo com as duas religiões.
Os epitáfios mais antigos foram encontrados em uma sepultura, em Linha Bohn, com data de 1859. (Foto: Denis Puhl)
Os epitáfios mais antigos foram encontrados em uma sepultura, em Linha Bohn (Foto: Denis Puhl)
Em Linha Herval, crianças que faleceram antes de ser batizadas eram sepultadas separadas dos demais. (Foto: Denis Puhl/Divulgação)
Em Linha Herval, crianças que faleceram antes de ser batizadas eram sepultadas separadas dos demais. (Foto: Denis Puhl/Divulgação)

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