Quase 20% dos venâncio-airenses estão com o ‘nome sujo’

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A crise política evidenciada nos últimos cinco anos e que, desde então, reflete diretamente na economia brasileira, trouxe preocupação para muitos setores, entre eles o comércio e os serviços. Esse cenário de incertezas e de apreensão segue em 2019, ainda mais em meio à recente troca de governo e cujo tempo de atuação ainda é considerado curto para alguma mudança mais palpável.

Apesar das dificuldades, as pessoas precisam se alimentar, se vestir e ter um lazer. Na prática, continuam comprando, consumindo e, dentro das expectativas, pagando suas contas. Mas, nem todas têm conseguido e integram o rótulo de um novo recorde no Brasil: 63 milhões estão com dívidas atrasadas e, consequentemente, com o que chamam de ‘nome sujo na praça’.

Em percentuais, nada menos que 40% dos brasileiros adultos têm uma dívida que não conseguem pagar. Em Venâncio Aires, a inadimplência não chega à metade da média nacional e está em 19%. No entanto, aumentou nos últimos anos e traz alguns indicativos de que a economia local, ainda que proporcionalmente, também sofre.

O ‘termômetro’ desse percentual é balizado pela quantidade de consultas ao Serviço Central de Proteção ao Crédito (SCPS). Com os dados, a Câmara do Comércio, Indústria e Serviços de Venâncio Aires (Caciva) pode analisar os números de compra e venda, por exemplo. Conforme a entidade, que hoje tem 436 empresas associadas, de janeiro a maio de 2019 foram 42.829 consultas ao SCPC, enquanto que no mesmo período de 2018 foram 40.723.

“Analisando as informações do mesmo período, entre 2018 e 2019, as consultas tiveram um acréscimo de 2%, mas o índice de inadimplência se manteve. Oscila em alguns meses, mas a média geral permanece a mesma”, considera a gerente administrativa da Caciva, Lisete Stertz.

Se esse número é muito ou pouco para Venâncio Aires, Lisete não arrisca quantificar, mas confirma que houve aumento nos percentuais desde 2016. “Nunca foi tão alto. Antes chegava a 14%. Mas precisamos considerar que tudo está num contexto maior e vivemos um momento instável, de um novo governo e ainda há insegurança.”

PASSOS

O ‘momento instável’ referenciado por Lisete Stertz também é apontado por economistas que reconhecem em alguns fatores a pedra no sapato da economia. Segundo o economista e professor da Univates, Eloni José Salvi, o desemprego, a redução da renda e a falta de educação financeira têm contribuído para o aumento da inadimplência.

Para Salvi, paralela à sensação de insegurança, toda troca de governo vem carregada de expectativa positiva. “O brasileiro se influencia facilmente e dá o ‘passo maior que a perna’. Em todo governo novo, ficamos mais esperançosos, então é comum nos empolgarmos. Mas é preciso cuidar para que essa empolgação não acarrete em despesa.”

Ao mesmo tempo, o economista pondera que dar passos curtos talvez não seja o suficiente. “A economia não está alavancando, não vem gerando empregos. Às vezes você está organizado e, no meio da dívida, a renda diminui porque mais alguém perdeu o emprego na família.”

Se houver dúvida sobre comprar ou se a dívida for inevitável, a sugestão do economista é controlar. “Não adianta parcelar mais vezes se houver muita compra. O valor da parcela pode ser baixo, mas se tiver várias ao mesmo tempo, no fim do mês será um susto de qualquer forma. Isso tem valido, principalmente, para o cartão. Tem gente que nem sabe quando chegará a fatura.”

Recorde

Segundo a Serasa Experian, o número de brasileiros inadimplentes é de 63,2 milhões, novo recorde histórico e o equivalente a 40,4% da população adulta. Em abril, a inadimplência do consumidor foi puxada pelas dívidas com água, luz e gás, seguido da telefonia. Varejo e serviços caíram, o que, segundo o Serasa, indica que a oferta de crédito nestes segmentos pode estar encolhendo. A maioria das dívidas foram feitas no cartão de crédito e com os bancos.

Empresários consideram percentual elevado

“Até quem sempre pagou em dia, está atrasando também.” A afirmação do empresário Heitor Lopes descreve bem uma preocupação no comércio de Venâncio Aires: as pessoas estão com dificuldades para manter as contas em dia.

Lopes, que têm uma loja de calçados e acessórios, diz que muitos ficam inadimplentes após um determinado número de parcelas. “Geralmente damos até três meses para clientes antigos, mas com outros mais novos, fica difícil. Esses 19% é um percentual alto para Venâncio, o pessoal está sem dinheiro e não tem como assumir dívidas mais longas.”

Para ter alguma segurança na venda, Lopes conta que a maior parte é feita pelo cartão, seja crédito ou débito. Na loja dele, isso já corresponde a 60% do negócio. Outros 30% são de venda à vista e apenas 10% no crediário, com o tradicional carnê. “Ainda temos essa opção, claro. Mas o cartão dá alguma segurança para o lojista.”

Quem também percebeu um crescimento na inadimplência foi a empresária Roberta Fischer. Como consequência, ela conta que aumentaram também as situações de renegociação da dívida. “Naquela compra com prazo maior, de 10 vezes por exemplo, é comum a partir da quinta parcela o pessoal começar a ‘remar’. Muitos nos procuram para dizer que vão atrasar ou que precisarão reparcelar.”

Roberta disse ainda que, na maioria das vezes, mesmo com alguns meses de atraso, ‘segura’ as inclusões no SCPC. “Nas grandes redes isso é difícil de acontecer. Mas em Venâncio se conhece muita gente, sabemos que na maioria dos casos não é por má índole, mas sim porque está tendo alguma dificuldade. Então podemos segurar e renegociar.”
Na loja da Roberta, que vende móveis, eletrônicos e eletrodomésticos, o crediário tradicional ainda é a principal saída e corresponde a 40% das vendas.

TEMPO

Em muitas situações, as pessoas se tornam inadimplentes três meses após a compra. Segundo a Caciva, isso é uma característica de cidades do interior, que sempre dão um tempo a mais para o cliente pagar a conta.

“No interior, onde muitos se conhecem, o cliente acaba tendo possibilidade de pagar depois ou renegociar. Mas, quanto mais se espera para informar do atraso, mais oportunidade se dá ao cliente para ele se endividar”, considera Lisete Stertz.

A gerente administrativa da Caciva explica que, pela legislação, o atraso de um dia já possibilita uma notificação ao cliente. A partir daí, são 13 dias para pagar a conta. Depois, se não houve o pagamento, pode ser feita a inclusão no SCPC.

Se considerarmos o percentual dentro da população (70 mil), 13,3 mil venâncio-airenses têm dívidas atrasadas. Mas esses 19% correspondem ao número de consultas ao SCPC, ou seja, é possível que um mesmo nome tenha motivado mais acessos.



Débora Kist

Débora Kist

Formada em Comunicação Social - Jornalismo pela Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc) em 2013. Trabalhou como produtora executiva e jornalista na Rádio Terra FM entre 2008 e 2017. Jornalista no jornal Folha do Mate desde 2018 e atualmente também integra a equipe do programa jornalístico Terra em Uma Hora, veiculado de segunda a sexta, das 12h às 13h, na Terra FM.

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