A representação da produção primária em Venâncio Aires para a economia do município está estabelecida há mais de século, quando por estas terras, que ainda nem eram emancipadas, já se cultivava tabaco. O ‘fumo’, como ainda se diz popularmente, sempre teve um peso grande na agricultura local e chegou, há cerca de 20 anos, a representar mais de 80% do Valor Bruto da Produção Agrícola (VBPA). Nas últimas duas décadas, esse percentual diminuiu, mas isso aconteceu porque outras culturas rentáveis cresceram na balança, como suínos, aves e grãos. Se trata, portanto, de um crescimento em paralelo ao tabaco, cenário bastante comum em boa parte das propriedades rurais do município.
De acordo com dados da Emater, Venâncio Aires contabiliza 4,3 mil propriedades produtivas – o segundo município no estado (veja box) – e cerca de 80% são consideradas pequenas, ou seja, têm entre 5 e 20 hectares. Também são nestes minifúndios que se encontra uma gama de atividades e um exemplo está na propriedade de Ângelo Heinen e Adriana de Freitas, ambos com 32 anos, moradores de Estância São José. Quando eles começaram a vida como casal, há 11 anos, tinham menos de cinco hectares, ainda pertencentes à mãe de Adriana. De lá para cá, trabalhando e arriscando, compraram mais terras no entorno e hoje mantêm 21 hectares.

O jovem casal tem o tabaco como carro-chefe da propriedade e cultivou 180 mil pés na safra 2023/24. Na resteva, é o milho que ocupa mais de 10 hectares, sendo para grão e silagem. Ângelo e Adriana também mantêm mais de 30 cabeças de gado de corte. Na propriedade, a vista ainda alcança lavouras de aipim, batata, frutas e hortaliças em geral. Nos açudes, abertos durante nos últimos anos de estiagem, cogitam a criação de peixes. “Pensar sempre estamos pensando. Quanto mais diversificar, melhor”, afirmou Ângelo, que é filho de agricultores, assim como Adriana.
Segurança para investir
Na propriedade do casal, nos últimos anos, a opção foi por aumentar gradativamente o plantio de tabaco, caminho contrário de muitas famílias. Embora reconheça que há agricultores que têm ‘fugido’ da atividade, Ângelo destaca que foi justamente a fumicultura que deu segurança para investir. “Foi ‘peitando’ com o fumo que as coisas foram acontecendo. Construímos mais uma estufa e reformamos duas. Compramos um trator. Abrimos açude e construímos um silo secador para o milho. O tabaco ainda é rentável e conseguimos manter outras atividades junto com ele. Pensamos em outras coisas, como piscicultura e até uma estufa de moranguinho. Tudo é investimento, mas quem sabe no futuro.”
Ao encontro do produtor, está a opinião de Vicente Fin, chefe do escritório local da Emater. “O tabaco também foi responsável pela permanência das famílias, porque trouxe renda comercial enquanto o pessoal desenvolvia outras atividades. Com o tabaco alavancando como renda principal, veio a possibilidade de investir e diversificar.”

“O principal desafio é o clima”
Enquanto investiu em estrutura, insumos e melhorias do solo, por outro lado o jovem casal da Estância São José também precisa lidar com um dos principais problemas da agricultura: a irregularidade climática. Por lá, um exemplo recente ainda está à mostra, com parte da lavoura de milho, já pronta para a colheita, derrubada após um temporal em março. Cerca de 30% da área foi afetada. “O principal desafio é sempre o clima. A gente tenta de tudo, mas o clima precisa ajudar.”
No caso da última safra de tabaco, mesmo que tenha plantado 35 mil pés a mais que no ano passado, a quantidade de arrobas colhidas foi a mesma. “Deu 1,95 mil arrobas. Mas se não tivesse excesso de chuva e granizo, poderia ter chegado a 2,4 mil arrobas”, contabiliza Ângelo.

Segundo no estado
• Conforme a Emater local, Venâncio Aires é o segundo município no Rio Grande do Sul em propriedades rurais – 4.367 estabelecimentos. A Capital do Chimarrão fica atrás apenas de Canguçu que, conforme a Emater daquele município no Sul do estado, tem 14 mil propriedades. Por esse motivo, Canguçu é considerado o município com o maior número de minifúndios do Brasil e é reconhecido como a Capital Nacional da Agricultura Familiar.
• Embora a diferença seja grande entre os dois municípios gaúchos com o maior número de propriedades rurais, vale ressaltar que o território de Canguçu tem uma área total de 3,5 mil quilômetros quadrados, enquanto Venâncio tem ‘apenas’ 772 quilômetros quadrados.
• Os dois municípios também seguem em destaque na produção de tabaco no Sul do Brasil. De acordo com dados da Afubra, de 2022/23, Canguçu é o líder no ranking (21.063 toneladas), enquanto Venâncio aparece em terceiro (17.779 toneladas).
10 hectares – é a média das propriedades rurais em Venâncio.

Economia
Para Vicente Fin, chefe do escritório local da Emater, alguns fatores contribuem para Venâncio Aires ainda manter muitas propriedades. “Tem uma população rural considerável, próximo a 7,3 mil famílias, cerca de 24 mil pessoas que ocupam essas áreas. Embora tenha ocorrido êxodo de jovens, por causa do relevo e afastamento do centro, ainda assim existe o desenvolvimento de mais de 60 atividades produtivas comerciais.”
Fin relata que a diversificação no município começou na década de 1960, com trabalho voltado para melhoria do solo e pensando em escala comercial a produção de suínos e aves. “A Emater de Venâncio é destacada, não tem nenhuma no estado que trabalhou tanto diversificação quanto a Emater de Venâncio. Isso associado à políticas públicas em parceria com a Prefeitura.”
O chefe da Emater menciona ainda o foco em motivar as famílias a diversificarem as atividades geradoras de renda, modificando a matriz produtiva municipal. “Depois do tabaco, o maior destaque é a proteína animal, com aves, suínos, bovinos de corte e leite e peixes. Somadas, elas contribuíram com 34,71% do VBPA na safra 2022/23.”
No caso do gado de corte, uma das atividades de Ângelo e Adriana, tem ocorrido um crescimento nos últimos anos em vendas. De 2020 a 2021, a atividade passou de R$ 13,8 milhões para R$ 16,4 milhões dentro do VBPA – aumento de 18%. Já em 2022, foram R$ 21,2 milhões, aumento de 29% em relação ao período anterior. Aqui, a explicação do preço passa pela qualidade, com melhoramento genético e cuidado com a alimentação.